O meu médico de Viana acha que eu abuso da sorte, o que, para um ouvido mais distraído, poderia significar que a sua fé na ciência não é de fiar. Engano puro. A partir dos oitenta anos, a sorte é um bem inestimável, tanto como os pára-raios instalados no pico das ermidas nas montanhas. O velho Doutor Homem, meu pai, dizia que a melhor forma de prezar a vida não era defendermo-nos da morte mas, sim, viver a vida com os cuidados que ela parece merecer, o que variaria bastante de pessoa para pessoa.
Quando me transferi (como se faz a uma cómoda de há dois séculos, herdada de uma tia que jejua às sextas-feiras) do Porto para Moledo, acreditando que os pinhais, as dunas, o iodo e a disciplina de Dona Elaine (a governanta deste eremitério) seriam uma espécie de recompensa para uma vida dedicada ao direito bancário e às leituras inúteis, apresentei-me no consultório do meu novo clínico para uma inspecção obrigatória. Levava comigo as guias necessárias: exames antigos, prescrições actuais e o medo de alguma revelação espontânea. Considerando que o sistema renal funcionava com afabilidade e que as coronárias estavam sob a vigilância de um radar permanente, só o reumatismo constituía um perigo, considerando o "clima agreste" de Moledo.
Ora, o "clima agreste" de Moledo, juntamente com a Água de Melgaço, um almoço semanal no restaurante Ancoradouro, os passeios pelas dunas e as visitas da família, foram o bálsamo que a minha velhice requeria. Sobre o iodo, é importante dizê-lo, já castiguei o leitor com indiscrições sobre a matéria: é o maior dos bens, sobretudo porque a sua existência é muito questionada.
O resto, aconteceu na minha vida com a suavidade que provavelmente não merecia: o café de cevada matinal de Dona Elaine, a leitura de Samuel Johnson, as visitas de D. Celina (a bibliotecária de Caminha), a correspondência com o Dr. Henrique Barreto Nunes (que, da Biblioteca Pública de Braga, alimentou muitas vezes quer a minha vaidade, quer a necessidade de páginas raras de monografias do Minho), a companhia da minha sobrinha Maria Luísa (que, a despeito de ser a eleitora esquerdista da família, vela pela saúde da cópia do retrato do senhor Dom Miguel que repousa no casarão de Ponte de Lima), os verões em que os meus sobrinhos transformam esta casa num acampamento de peregrinos do Levante, a sombra de Santa Tecla, a luz da foz do Minho, o ilhéu da Ínsua anunciando as tempestades ou a esplanada do café P’ra Lá Caminha. O resto, sim, é sorte. Isto é medicina pura.
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