Crianças treinam para a guerra em escola-bunker na Ucrânia
Aprendem a mexer em armas, identificar explosivos, pilotar drones e a aplicar técnicas de primeiros socorros numa escola perto de Zaporíjia.
A poucos quilómetros da linha da frente, milhares de crianças ucranianas estudam em escolas subterrâneas e aprendem competências de sobrevivência para uma guerra que se aproxima, como relata uma reportagem do jornal espanhol El Mundo. Em Zaporíjia, onde as tropas russas se encontram a cerca de 15 quilómetros, a escola deixou de ser apenas um espaço de aprendizagem para se tornar num refúgio e num local de preparação militar.
A nova escola subterrânea de Balabyne foi construída a sete metros de profundidade, com entradas rodeadas de redes anti-drone e completamente isolada do exterior. Esta escola-bunker recebe 645 crianças e adolescentes, e conta com 50 professores.
O complexo de 1500 metros quadrados construído debaixo de terra tem vários corredores que se assemelham a um labirinto, salas de aula, áreas de atividades, espaços para jogos e até uma cafetaria. A escola serve ainda de abrigo para as crianças de Malokaterinivka, uma aldeia praticamente vazia devido aos bombardeamentos russos constantes.
Mas se o ambiente parece proteger fisicamente, o contexto da aprendizagem revela uma transformação mais profunda e perturbadora da infância. Entre matemática, literatura e ciências, há agora uma disciplina que antes não existia: defesa da Ucrânia.
Nestas aulas, alunos do ensino básico e do secundário aprendem a manusear armas AK-47, ainda que em simuladores; a identificar e compreender explosivos; a pilotar drones de uso militar; a aplicar técnicas de primeiros socorros em situações de combate, incluindo parar hemorragias com sangue sintético; e a reconhecer ferimentos típicos de guerra.
O objetivo declarado pelos professores é fazer com que os jovens “não tenham medo do sangue” e estejam preparados para sobreviver. Ao mesmo tempo, outras disciplinas integram conteúdos adaptados ao tempo de guerra – nas aulas de tecnologia, por exemplo, aprendem a construir pequenos robôs que imitam aqueles utilizados pelas forças armadas.
Nas conversas de corredor, os assuntos que se ouvem são igualmente militares, desde ataques de drones às aldeias vizinhas a bombas de grande potência e à evolução da linha da frente.
Professores e pais sabem que esta não é uma infância normal, mas sabem também que, sem estas medidas, muitas destas crianças não estariam preparadas para a realidade que enfrentam. Nadia Bribova, uma das professoras, resume a situação ao El Mundo: “Vivemos numa prisão de redes anti-drone. Não é normal, mas é o quotidiano."
A construção destas escolas subterrâneas é apenas uma das estratégias das autoridades locais para manter a população na região. Ao criar espaços seguros e ao insistir na continuidade da educação, procuram transmitir uma mensagem de resistência.
No entanto, a presença constante do conflito transforma inevitavelmente aquilo que significa aprender a crescer. Em vez de planear futuros tranquilos, estas crianças aprendem a sobreviver à guerra e a proteger as suas famílias. À medida que a guerra se aproxima da cidade, a fronteira entre escola e campo de treino torna-se cada vez mais ténue.
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