Descoberta de grande laboratório de droga sírio revela segredos do comércio ilícito do governo de Bashar al-Assad

Captagon, conhecido como a “cocaína dos pobres”, disseminou-se em todo o Médio Oriente.

13 de dezembro de 2024 às 11:57
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O governo do presidente Bashar al-Assad, na Síria, foi acusado por Washington e outros governos de lucrar com a produção e venda de um estimulante viciante do tipo anfetamina, conhecido como captagon, que se disseminou em todo o Médio Oriente. A descoberta de um grande laboratório de droga, após Assad ter sido deposto, vem dar força às acusações.

De acordo com a Reuters, o laboratório de droga à escala industrial onde esta droga era produzida situava-se na colina de uma estrada principal no extremo ocidental de Damasco, a cidade que era a sede do poder da família Assad, que há muito negava quaisquer ligações ao comércio de droga.

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O comércio anual de captagon vale milhares de milhões de dólares por ano, segundo os especialistas, e os governos ocidentais associaram o comércio ilícito na Síria ao irmão de Assad, Maher al-Assad, e à Quarta Divisão do exército sírio que este comandava.

Segundo a agências de notícias, a queda de Bashar al-Assad, após uma ofensiva relâmpago dos rebeldes, permitiu que os jornalistas começassem, pela primeira vez, a procurar na Síria provas do império de captagon. Em armazéns escuros e escondidos abandonados na cidade de Douma, os combatentes que destituíram Assad disseram ter encontrado milhares de comprimidos refundidos em mobiliário, fruta, pedras decorativas e estabilizadores de tensão, que os repórteres da Reuters viram empilhados em paletes, com um reboque à espera no exterior.

Muitos dos comprimidos estavam marcados com o logótipo do duplo crescente ou com a palavra “Lexus”, que identifica os comprimidos de captagon.

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Caroline Rose, diretora do captagon Trade Project do New Lines Institute, que monitoriza a produção e distribuição desta droga, revelou à Reuters que o comércio global de captagon tem um valor estimado de 10 mil milhões de dólares (9 mil milhões de euros) e que o lucro anual do governo de Bashar al-Assad com esta droga era de cerca de 2,4 mil milhões de dólares (2,3 mil milhões de euros).

Rose, cuja organização acompanha todas as apreensões de captagon registadas publicamente e as rusgas a laboratórios, disse que o local visitado pela Reuters parece ser um dos maiores laboratórios de captagon que já foram encontrados. “É muito possível que seja o maior que existiu na Síria controlada pelo regime”.

Estimulante proibido

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No interior do laboratório, havia uma máquina de comprimidos e, no armazém por cima, dezenas de barris, caixas e garrafas de diferentes produtos químicos que incluíam clorofórmio, iodeto de potássio, solução de formaldeído, solução de amoníaco 0,91, ácido acético, ácido clorídrico, ciclohexanona e éter de petróleo a 40-60 graus Celsius.

De acordo com os rótulos, estes produtos químicos vinham de países como o Reino Unido, China, Índia, Omã, Arábia Saudita e Líbano. 

Captagon era a marca de um estimulante produzido pela primeira vez na Alemanha na década de 1960 para ajudar a tratar problemas de atenção e narcolepsia (doença neurológica caracterizada por episódios de hipersonolência diurna acompanhada de distúrbios do sono).

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Apesar de ter sido descontinuada, uma versão ilícita da droga, conhecida como “cocaína dos pobres”, continuou a ser produzida no Leste da Europa e, mais tarde, no mundo árabe, tornando-se proeminente no conflito que surgiu na Síria, na sequência de protestos antigovernamentais em 2011.

Esta droga ajuda à concentração e afasta o sono e a fome. Foi proibida em muitos países, incluindo os EUA, e pode ter efeitos secundários nocivos. A sua prevalência levou ao aumento do consumo de droga nos países do Golfo Árabe.

Da produção de batatas fritas ao captagon

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O empresário sírio Fares Al-Tout disse à Reuters que a sua família era proprietária da fábrica agora descoberta antes da guerra civil da Síria e que esta foi construída para produzir batatas fritas com a marca Captain Korn. Segundo Fares Al-Tout, a fábrica foi apreendida em 2018 pelo empresário Amer al-Khiti.

“Eles passaram da produção de alimentos para a produção de captagon", disse Tout à agência de notícias.

Os EUA impuseram sanções a Khiti em 2020 devido aos seus laços com as autoridades de Assad. O Reino Unido também impôs sanções em 2023, justificando que o mesmo “operava e controlava vários negócios na Síria que facilitam a produção e o contrabando de drogas, incluindo captagon”.

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Um repórter da Reuters que se encontrava no local encontrou no chão panfletos eleitorais para a assembleia popular da Síria, com Khiti listado como um dos candidatos, bem como cartões eleitorais separados apenas com o seu nome.

Nos dias que se seguiram à queda de Assad, os rebeldes dizem ter encontrado vários locais em todo o país onde a droga era produzida e preparada para exportação.

Caroline Rose referiu que a organização acompanhou todas as apreensões de captagon e rusgas a laboratórios registadas publicamente. “Até à queda do regime, não havia um único incidente de apreensão de um laboratório na base de dados em territórios controlados pelo regime”.

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