Ossufo Momade, presidente da Renamo, classificou-o como uma figura instrumentalizada à frente de um grupo de "desertores indisciplinados".
Mariano Nhongo, líder da autoproclamada Junta Militar da Renamo, foi abatido um dia antes de completar 28 meses desde que anunciou aquela dissidência armada do maior partido da oposição de Moçambique.
"Se ele não quer sair, nós vamos matar, vamos atacar Ossufo, [que] estragou o nosso partido", declarou a 12 de junho de 2019 perante jornalistas numa mata do centro de Moçambique, ladeado de vários ex-guerrilheiros.
Ossufo Momade tinha vencido as eleições de janeiro da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), que o legitimaram no lugar de presidente do partido, sucessor de Afonso Dhlakama.
Mas seis meses depois, Nhongo e os seus revoltosos acusaram-no de ter na mira outros membros da Renamo e de ter substituído delegados provinciais e distritais para "destruir o partido" a mando dos Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE).
"O homem está a ser usado, é do SISE", acusou Nhongo, que deixou o primeiro de muitos avisos: "Não nos provoquem. Estamos armados e temos forças".
A Renamo identificou-o como um coronel-general do braço armado que depois de "desertar" saiu da serra da Gorongosa, base do movimento.
Ossufo Momade classificou-o como "força diabólica", uma figura instrumentalizada à frente de um grupo de "desertores indisciplinados".
Sem nunca sair das matas, Mariano Nhongo recusou os rótulos. Tinha sido um dos estrategas da Renamo que dirigiu a resposta armada às emboscadas de que o antigo líder Afonso Dhlakama foi alvo, em Manica, antes do cessar-fogo em 2016.
Os tempos mudaram e em julho de 2019, a poucos dias de ser assinado o acordo de paz entre Governo e Renamo, era ele que deixava avisos como prenúncio de instabilidade: "Se o governo não souber resolver este problema, há guerra aqui em Moçambique".
Para ele, resolver o problema passava por rever o acordo e as condições de desarmamento que eram dadas aos ex-guerrilheiros, parte dos quais se diziam ostracizados pela nova direção de Ossufo Momade.
Poucos dias depois das ameaças, a 01 de agosto de 2019, disparos de desconhecidos contra um autocarro feriam duas pessoas em Nhamapadza, centro do país - seria o primeiro de inúmeros ataques que levariam à morte de cerca de 30 pessoas, entre civis e membros das Forças de Defesa e Segurança (FDS), naquela região.
Em contactos com jornalistas, a partir de locais incertos, por via telefónica, Mariano Nhongo negava a autoria dos ataques ao mesmo tempo que dava a entender que os tinha ordenado - um discurso contraditório, que rematava repetidamente com ameaças de violência caso não fossem atendidas as reivindicações do grupo.
Numa tentativa de descodificar Nhongo, o académico e membro da Renamo Alberto Ferreira disse à Lusa que o líder guerrilheiro estava a ser "instrumentalizado" para fragilizar o partido, por setores internos da própria força política e de fora.
Analistas moçambicanos ouvidos pela Lusa consideram-no como um resultado da crise interna na Renamo após a morte de Afonso Dhlakama - cultivada indiretamente pelo próprio, dado o seu estilo autocrático, concentrando em si o poder, sem deixar emergir sucessão à vista.
No novo contexto de paz, a Junta Militar reclama "um tratamento especial para as altas patentes da antiga guerrilha", tanto mais porque Ossufo Momade assumiu as regalias do Estatuto de Líder da Oposição, a que Dhlakama renunciara, considerou o Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), organização não-governamental (ONG) moçambicana.
A 24 de outubro de 2020, o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, anunciava uma trégua na perseguição à Junta e, dois dias depois, Nhongo anunciava que estar disposto "a negociar com o Governo".
Pediu a divulgação prévia de uma petição enviada um ano antes a Nyusi, uma alegada lista de condições, sem nunca deixa de exigir o afastamento de Ossufo Momade da liderança da Renamo.
O diálogo não avançou e a trégua durou pouco mais de uma semana: no início de novembro eram retomados os ataques armados a autocarros, com a Junta a queixar-se de perseguições.
O Presidente moçambicano reiterou por várias vezes o apelo para que Nhongo e os seus homens aderissem ao processo de desarmamento, desmobilização e reintegração (DDR) sem pré-condições.
Vários guerrilheiros da Junta fizeram-no, exceto o líder da Junta, com qual várias figuras quiseram encetar diálogo, mas cujas tentativas nunca tiveram sucesso, como hoje escreveu Mirko Manzoni, enviado pessoal do secretário-geral das Nações Unidos a Moçambique.
"Embora este seja um fim lamentável para a situação, reconhecemos os consideráveis esforços do Governo no sentido de recorrer a meios pacíficos para devolver a estabilidade à zona centro de Moçambique", lê-se num comunicado subscrito pelo diplomata suíço a propósito da morte de Nhongo.
Segundo o responsável, "foram repetidamente abertas oportunidades para utilizar o diálogo em vez da violência, no entanto, estas revelaram-se infrutíferas".
A polícia moçambicana anunciou que abateu Mariano Nhongo hoje pelas 07:00 (06:00 em Lisboa) numa mata de Cheringoma, província de Sofala, centro do país, depois de ele e outros terem disparado contra uma patrulha, desencadeando uma troca de tiros que lhe seria fatal.
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