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A vida desconhecida das militares da Coreia do Norte

Antiga soldado relata abusos sexuais e falta de condições de higiene para mulheres do exército norte-coreano.

21 de novembro de 2017 às 18:59

Uma antiga soldado norte-coreana denunciou a vida desconhecida das militares do exército do seu país. Os relatos falam em abusos sexuais e ausência de menstruação, devido à má alimentação e ao esforço físico exagerado.

Leo So Yeon esteve ao serviço do exército da Coreia do Norte durante dez anos. Nesse espaço de tempo, a ex-militar dormiu em cima de um colchão, no chão de um quarto que dividia com outras vinte mulheres. Ao lado do colchão, a mulher e as colegas tinham gavetas onde guardavam os uniformes e, por cima delas, duas fotografias emolduradas. Kim II-sung, primeiro líder da Coreia do Norte, e Kim Jong-il, antecessor do atual líder do país, eram os protagonistas dos retratos.

Agora, mais de 15 anos depois de ter abandonado o exército, Lee So Yeon relembra ao pormenor os tempos de militar, numa entrevista à BBC. A antiga soldado contou que dormia num colchão feito de casca de arroz, onde se entranhavam "todos os odores corporais".

Leo So Yeon falou das más condições sanitárias, lamentando que o exército não tenha conseguido dar resposta às necessidades íntimas das mulheres, que muitas vezes se viram obrigadas a reutilizar pensos higiénicos. "Como mulher, uma das coisas mais difíceis era a falta de condições para tomar banho como deve ser. Não havia água quente. Ligavam uma mangueira a uma nascente e a água saía por lá", contou. "Às vezes, além de água, saíam sapos e cobras", acrescentou.

A norte-coreana foi a primeira mulher da família a representar o exército do seu país, em 1990, quando tinha apenas 17 anos. Nessa altura, a fome devastou o país, e a ex-militar, motivada pela ideia de que teria, pelo menos, uma refeição por dia garantida, decidiu servir o exército da Coreia do Norte.

As soldados treinavam muito, todos os dias, e alimentavam-se poucas vezes, o que fazia com que o corpo das mulheres começasse a ressentir-se. "Depois de seis meses ou um ano de serviço, já não nos menstruávamos, por causa da má nutrição e do ambiente stressante", afirmou.

Juliette Morillot, autora do livro "Coreia do Norte em 100 perguntas", visitou há pouco tempo um campo de treinos na Coreia do Norte. "Uma das jovens com quem falei, que tinha 20 anos, disse-me que treinava tanto, que já não tinha menstruação há dois anos", contou. Outras raparigas disseram-lhe que, devido à falta de casas de banho privadas, era comum terem de fazer as necessidades à frente dos homens.

Tanto Morillot como Yeon relatam que a cultura machista e patriarcal ainda está muito presente na Coreia do Norte, e a antiga soldado afirma que, durante o tempo em que esteve ao serviço do exército, entre 1992 e 2001, muitas colegas dela foram violadas por vários militares mais velhos.

Na lei do país, está prevista a punição de até sete anos de prisão para crimes de violação, mas, como na maior parte das vezes ninguém está disponível para testemunhar, "os homens saem sem punição", afirmou a escritora francesa.

Lee So Yeon saiu do exército norte-coreano aos 28 anos. A ex-militar esteve presa por tentativa de fuga, mas conseguiu escapar, no ano seguinte, para o sul da península.

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