PJ admite preocupação com drogas sintéticas e vai ter laboratório científico nos Açores
Responsável da PJ adiantou ainda que é nos Açores onde "está mais centrada essa problemática" das novas substâncias psicoativas.
A Polícia Judiciária (PJ) vai dispor no próximo ano de um laboratório científico nos Açores, anunciou esta sexta-feira o diretor nacional, que admitiu preocupação com o consumo e tráfico de novas drogas sintéticas no arquipélago.
As novas instalações da PJ em Ponta Delgada permitirão um reforço de profissionais, mas também criar uma extensão do laboratório de polícia científica "para podermos contribuir com os agentes de saúde e da investigação criminal e da ação Justiça, como o Ministério Público, com mais esta valência", adiantou Luís Neves.
O diretor nacional falava aos jornalistas em Ponta Delgada, no âmbito de uma conferência promovida pela PJ sobre as novas substâncias psicoativas (NSP), também conhecidas por drogas sintéticas, que têm registado um elevado nível de consumo na região, com parte do tráfico a ser feito de forma digital.
"As regiões autónomas não têm de ter cidadãos de segunda e, por isso, há um compromisso firme por parte da direção nacional e meu próprio que espero que corra tudo bem e quem durante o ano de 2026 possamos inaugurar" as novas instalações que trarão maior resposta na área científica, afirmou Luís Neves.
O responsável da PJ adiantou ainda que é nos Açores onde "está mais centrada essa problemática" das NSP, reconhecendo que as organizações criminosas que se dedicam ao tráfico de drogas "procuram encontrar sempre forma de fugir ao controlo das autoridades policiais", muitas vezes através de meios digitais.
"Essa é uma dificuldade, mas nós também queremos dizer a essas organizações que estamos a preparar-nos para, também nessa esfera e nesse `modus operandi´ de ação criminosa, podermos dar a nossa resposta", assegurou Luís Neves.
O diretor da PJ avançou que o combate ao tráfico dessas novas substâncias, que são também comercializadas na `dark web´, é efetuado através da cooperação policial internacional, muitas vezes com países longínquos e com sistemas legais diferentes.
O médico psiquiatra do Hospital de Ponta Delgada, João Mendes Coelho, adiantou que há uns anos um tipo de NSP entrou com uma "preponderância grande nos Açores" - as catinonas sintéticas -, que "estiveram em roda livre e a circular impunemente durante bastante tempo", até cerca de maio de 2023.
Desde agosto de 2024, uma nova substância - a NEP - passou a ser a ser "hegemónica nos consumos de droga", gerando comportamentos muito mais agressivos e violentos por parte dos consumidores, o que se traduz em criminalidade e disrupção social, alertou o especialista.
"Estamos a perder por muitos golos ainda", reconheceu João Mendes Coelho, para quem essa "tempestade perfeita" deve-se à conjugação de fatores como ser uma nova droga ainda não tipificada na lei e aos problemas sociais e económicos dos Açores.
Ao contrário do que se verifica com a heroína, cuja dependência pode ser tratada, as novas drogas sintéticas consumidas na região não podem ser tratadas, fazendo com que esse seja "problema tão dificil de resolver", adiantou.
O médico do maior hospital açoriano referiu ainda que, nas urgências e mesmo no internamento, verificam-se casos de episódios psicóticos, com alguns desses doentes a apresentarem doença mental difícil de tratar, com a necessidade de tratamentos mais invasivos e com doses maiores de medicação.
"Temos, sem dúvida, mais gente a pedir ajuda e a precisar dessa ajuda", alertou João Mendes Coelho.
Para o diretor da Casa de Saúde de São Miguel do Instituto São João de Deus, os Açores estão "numa situação muito grave ao nível das dependências", principalmente na ilha de São Miguel, tendo contribuído para isso a situação de pobreza e vulnerabilidade social e o acesso barato e fácil às drogas, mas também as recentes alterações legislativas.
"Tudo isso contribui para um cenário de uma tempestade que é muito complicada em que todas as instituições que trabalham na área estão a fazer o seu melhor, mas tem de haver uma coordenação maior entre todos", salientou Paulo da Silva Braga.
Referiu ainda que, ao nível da desabituação do consumo, em 2024 apenas 12% dos utentes se mantiveram abstinentes após a alta, devido às características das NSP, que têm efeitos graves e nefastos na saúde física e cognitiva, que se prolongam no tempo e que dificultam muito a intervenção.
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