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Advogado burlou clientes

O advogado Romeu Francês, detido anteontem em Lisboa por burla qualificada, terá enganado cerca de dez clientes. Segundo apurou o CM, o causídico procurava familiares de reclusos e prometia que, em troca de dinheiro, os colocaria em liberdade.

25 de maio de 2007 às 00:00

Foi o que terá acontecido a Dora Paula Dias quando, há dois anos, foi abordada pelo advogado. “O meu marido foi preso e ele disse-me que, se lhe entregasse 9000 contos [45 000 euros], o colocaria em liberdade no prazo de três meses”, disse.

Dora, que prefere não mencionar qual a pena que o marido está a cumprir, não hesitou em vender a casa para obter o dinheiro. “Entreguei-lhe 9500 contos e fiquei na rua com quatro filhos”.

Três meses depois, segundo Dora, o marido continuava preso. Ela começou a estranhar a situação e tentou contactar com o advogado. Foi preciso “fazer-lhe uma espera” no escritório para que conseguisse ser atendida.

“Disse-lhe que não saia dali sem que ele me desse o dinheiro”, adiantou Dora. A 28 de Abril de 2005, Romeu Francês assinou duas letras, uma de 20 mil euros e outra de 25 mil e entregou-as a Dora. Nem assim o pesadelo terminou.

“Não tinham cobertura”, disse ao CM. Mais tarde, a mulher regressou ao escritório do causídico, na Avenida de Berna, e ameaçou mais uma vez o advogado de que não arredava pé sem que ele lhe pagasse.

Romeu Francês prometeu pagar parte do dinheiro com uma viatura de marca Mercedes, modelo E270. Nos documentos a que o CM teve acesso, Romeu Francês assina o seguro contra todos os riscos e a declaração para registo de propriedade.

“Fiquei sem casa e com um carro topo de gama”, ironizou Dora. Quando recebeu o carro, Dora devolveu uma das letras. A outra permanece na sua posse.

No ano passado, a viatura que Romeu Francês lhe deu foi confiscada pela polícia por constar para apreender – tinha sido dada como roubada. “Nunca a coloquei em meu nome porque era apenas uma garantia para reaver o dinheiro. Mesmo assim, ele foi buscar o dinheiro do carro, porque tinha seguro contra todos os riscos”, acusou Dora.

Daqui a alguns meses o marido de Dora será colocado em liberdade. Ela continua sem o dinheiro e “sem casa”. Tem quatro filhos para sustentar. Soube da detenção de Romeu Francês pela televisão e ainda não foi notificada no âmbito deste processo. “O meu advogado está a tratar de tudo”, garantiu.

Romeu Francês, de 57 anos, passou ontem o dia no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, mas o primeiro interrogatório judicial para aplicação de medida de coacção foi adiado para hoje de manhã. Ficou detido na cadeia anexa à PJ.

Romeu Francês, de 57 anos, casado, ficou conhecido por alguns casos que representou. Defendeu Otelo Saraiva de Carvalho, no caso FP-25, o ex-vice--reitor da Universidade Moderna, Esmeraldo Azevedo, e ainda o sub-chefe da PSP – que integrou a equipa de segurança pessoal de Jorge Sampaio - condenado por tráfico de heroína.

COM OS BENS PENHORADOS

Os casos em tribunal contra o advogado Romeu Francês começaram há alguns anos. Em Março de 2002, o Tribunal Judicial de Setúbal já tinha obrigado Romeu Francês e a mulher a pagar 14 465,14 euros a um casal residente em Palmela.

Segundo a decisão, a que o CM teve acesso, F.S. solicitou os serviços de Romeu Francês quando ficou em prisão preventiva na cadeia de Setúbal. Sob a promessa de o devolver à liberdade, o advogado solicitou à mulher do recluso um total de

17 500 euros (na altura em escudos), entre Dezembro de 1996 e Janeiro de 1997. O arguido, segundo o documento, sentiu-se “privado de qualquer assistência jurídica” e contratou outro advogado.

O tribunal fez as contas e deu razão aos clientes de Romeu Francês. Quando os clientes foram receber a sua parte, os bens de Romeu Francês e da mulher estavam já penhorados. Antes deles havia uma hipoteca a favor da Segurança Social para pagamento de contribuições e juros de mora num total de 223 708 euros e uma penhora provisória da Caixa Geral de Depósitos no valor de 2178 euros.

ARROBAS DEFENSOR POR ACASO

Fernando Arrobas da Silva soube da detenção de Romeu Francês anteontem à noite pela rádio, quando se dirigia para casa. Segundo disse à Comunicação Social, deslocou-se ao Comando da PSP de Lisboa “como amigo”. Como Romeu Francês não tinha representante legal, Arrobas decidiu ser seu defensor.

O advogado deixou claro que “deve existir entre os colegas alguma solidariedade” e, por isso, não vai cobrar honorários. Arrobas da Silva disse ontem desconhecer qual a acusação que pendia sob o cliente mas confirmou os indícios “do crime de burla qualificada”. A diligência chegou a estar marcada para ontem mas teve de ser adiada para hoje, às 09h30, porque, segundo o advogado, “faltava reunir alguns elementos”.

ORDEM

Romeu Francês responde em quatro processos disciplinares instaurados pela Ordem dos Advogados, em 2006. Um deles teve por base uma participação do DIAP e os restantes resultam de queixas de antigos clientes.

PONTA DELGADA

O advogado tem ainda outro processo instaurado por um juiz do Tribunal de Ponta Delgada, num caso que remonta a 2005.

DÍVIDA EM 1995

Dois carros foram penhorados, por um tribunal de Lisboa, em 2000, por falta de pagamento de uma dívida que remontava a 1995.

FÓRUM PRISÕES

Paralelamente ao exercício de advocacia, Romeu Francês presidiu à direcção do Fórum Prisões, uma associação de apoio a reclusos.

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