Juiz concluiu que não existiam provas que sustentem a acusação do MP e a responsabilidade dos arguidos no incêndio.
O Tribunal de Portimão decidiu não levar a julgamento a EDP Distribuição e um funcionário da empresa acusados pelo Ministério Público (MP) no caso do incêndio florestal ocorrido em agosto de 2018 em Monchique, no Algarve.
Na decisão instrutória proferida na sexta-feira, a que a Lusa teve esta terça-feira acesso, o juiz de instrução criminal Fábio Gulpilhares decidiu pela não pronúncia dos arguidos, por entender que "não se mostram suficientemente indiciados" os factos que os responsabilizem pela ignição do fogo.
Tendo por base os depoimentos das testemunhas e os relatórios de polícia, o juiz concluiu pela inexistência de provas que sustentem a acusação do MP e a responsabilidade dos arguidos no incêndio, que estavam acusados da prática "em autoria imediata e na forma consumada, de um crime de incêndio florestal agravado, na forma negligente".
Segundo a acusação, proferida em novembro de 2020, a ignição do fogo terá tido origem devido ao contacto repetido de uma linha elétrica de média tensão com um ramo ou tronco de eucalipto na zona da Perna Seca, em Monchique, onde se iniciou o fogo que lavrou durante sete dias.
A abertura da instrução foi requerida pelos acusados por entenderem que adotaram "de forma correta todos os procedimentos em vigor", refutando que o fogo tivesse tido origem sob as linhas elétricas de média tensão.
Em declarações à Lusa, o advogado Paulo Martins, que representa mais de uma centena de lesados pelo fogo, assistentes no processo, classificou a investigação "como uma vergonha", admitindo que a decisão do juiz de instrução "se baseou nos factos que lhe chegaram às mãos".
"Uma vergonha, é assim que classifico a investigação da PJ e do MP, que é quem titula o processo, num caso onde, infelizmente, as pessoas não são ressarcidas pelos danos", lamentou o causídico, admitindo apresentar recurso para os tribunais superiores.
Para o juiz de instrução criminal que proferiu a decisão, a acusação que se sustenta no relatório da Polícia Judiciária (PJ) padece de "demasiadas incongruências e fragilidades", com contradições nas próprias conclusões, apontando reservas provocadas pela prova (ou ausência dela) constante nos autos.
Na decisão instrutória, o magistrado manifesta "estranheza e perplexidade" que as autoridades que primeiramente se deslocaram ao local no dia 03 de agosto de 2018 -- Núcleo de Proteção Ambiental (EPNA) da GNR e, posteriormente, a PJ -, "não tenham identificado qualquer proximidade de material vegetal ao cabo condutor de eletricidade", surgindo posteriormente "a aparição" de um eucalipto com ramos a tocar no referido cabo, "o qual veio a ser eleito como causa do devastador incêndio".
Para o juiz de instrução criminal, a ficha elaborada pelo EPNA para a determinação das causas do incêndio "assume clara preponderância", ao referir que "da inspeção ao local não foi encontrado/identificado qualquer meio de ignição que pudesse relacionar com a causa do fogo a título negligente".
A decisão instrutória aponta ainda a contradição "de forma inusitada e incompreensível" do inspetor da PJ que, em sede de instrução, contrariou o próprio relatório que elaborou aquando da sua deslocação ao local no dia em que teve início o incêndio.
O magistrado notou que o inspetor da PJ, "num depoimento nitidamente comprometido", começou por referir que não havia muitas condições de visibilidade quando se deslocou ao local, aludiu à existência de uma árvore situada muito próxima, "mas sem tocar" nos fios elétricos, justificando a omissão de tal referência no relatório porque achou "não ter importância".
Para o juiz, o depoimento do inspetor, com uma carreira de 36 anos, feito de "forma comprometida, incoerente e desconexa", não revestiu qualquer credibilidade no sentido de "convencer o tribunal" acerca da existência de um eucalipto cujos ramos estariam em contacto com o cabo elétrico, dando origem ao incêndio de forma criminosa e dolosa.
O fogo que deflagrou na serra de Monchique devastou uma área superior a 27 mil hectares de floresta e de terrenos agrícolas, destruindo 74 casas, 30 das quais de primeira habitação.
As chamas provocaram também danos significativos nos concelhos vizinhos de Silves e de Portimão (distrito de Faro) e de Odemira, no distrito de Beja, naquele que foi o maior incêndio registado em 2018 na Europa.
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