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Gostaria de entrar numa novela portuguesa

Adepto da filosofia budista e fascinado por Química, aos 40 anos, o galã das telenovelas brasileiras mudou-se de armas e bagagens para Cascais e dedicou-se de corpo e alma à música. Há poucos dias, ‘Meu Segundo Disco' foi lançado em Portugal. Contudo, apesar da música ser prioritária, o actor e compositor - que não receia a Al-Qaeda - confessa que está disponível para integrar o elenco de uma produção portuguesa.

17 de abril de 2004 às 00:00

Como é que uma pessoa formada em Filosofia ‘acaba' nos palcos, nas telenovelas e na música?

Penso que é tudo a mesma coisa, isto é, se olharmos para os grandes pensadores como Kant ou Nietzsche compreendemos que a filosofia abrange tudo o que é a vida e todas as facetas do ser humano.

Para nós, portugueses, o seu trabalho como músico é a faceta menos conhecida da sua carreira...

(risos) No Brasil também é, apesar deste ‘Meu Segundo Disco' ser o meu sétimo trabalho (ver caixa). Comecei a dedicar-me à música aos 14 anos. Há pessoas que escrevem um diário e eu desabafava através da música. Na altura, não tinha a pretensão de cantar as minhas letras, apenas transpunha para o papel aquilo que sentia.

Há quantos anos é que se dedica profissionalmente à música?

Quer mesmo saber? Há onze anos!

Deve ter sido complicado passar da imagem de ‘galã das telenovelas' para a de compositor...

O meu percurso como actor começou no teatro e só depois veio a televisão. No teatro não se aprende a ser galã! Mesmo quando gravava telenovelas, trabalhava em paralelo na música. Acredito que quando se faz um trabalho sério como compositor, acabamos por alcançar um objectivo maravilhoso. O que acontecia é que cada vez que eu abraçava um projecto musical tinha que interromper porque era chamado para fazer uma telenovela. Vivia entre a música, que também é uma paixão, e as novelas.

A última telenovela que fez foi ‘Agora É Que São Elas', que terminou em Portugal no passado mês de Março.

As gravações terminaram em Agosto passado. E em Setembro comecei a trabalhar neste disco. Decidi que, em 2004, a minha carreira musical ia ser prioritária. Foram mais de 20 novelas, muitos trabalhos na televisão, no teatro e no cinema. Acredito muito na minha faceta de compositor e para alcançar voos maiores, tenho que me dedicar intensamente à música.

Mas, se calhar vai ter saudades do seu lado de actor?

Não! Vou estar cantando, fazendo espectáculos e ao mesmo tempo aparecendo em alguns programas de televisão. Penso que o facto de apostar na música é positivo, porque posso mostrar quem é o Maurício Mattar como ser humano, o que pensa e o que sente. Um actor fica sempre escondido atrás de uma personagem. A minha música transmite a minha espiritualidade e a pessoa que, realmente, sou.

Essa exposição não o assusta?

Não, porque eu não escancalho nem devasso a minha vida pessoal. Eu devasso a minha poesia e faço com que as pessoas pensem. Quando as pessoas pensam, elas reflectem, quando reflectem, elas se emocionam. Essa emoção faz parte do Maurício Mattar.

E é essa emoção que é transmitida?

Quero exclusivamente com a minha música mexer na emoção das pessoas, para que elas reflictam sobre aquilo que sentem mas não sabem expressar. É esse o papel do artista, do escritor e do poeta.

SEM MEDO DA AL-QAEDA

Porque razão fixou residência em Cascais e escolheu Portugal para lançar o seu disco?

A editora ouviu o meu trabalho anterior e, ficou surpreendida, e soube que eu estava a preparar este disco. Fui convidado a vir a Portugal para conversar com eles e negociar a hipótese de aqui ficar. Ao mesmo tempo, e como eu tinha projectos de sair do meu pequeno aquário (o Brasil), de abraçar novas culturas e de fazer uma digressão pela Europa, senti que se tinha juntado o útil ao agradável.

A popularidade que alcançou na televisão junto do público português pode ajudá-lo a vender o CD.

No Brasil, não foi esse o caminho porque já tinha trabalhos anteriores e, tal como disse, há 11 anos que me dedico à música. Aqui, não sei como vai ser. Sinto apenas que adoptei a Europa, onde quero permanecer todo o ano de 2004, e quero respirar música.

Sente-se apreensivo em relação à ameaça terrorista que paira sob a Europa?

Acredito que os cérebros da Al-Qaeda são muito mais inteligentes do que possamos pensar e não creio que Portugal seja um alvo. Por mais que tenha ficado envolvido na guerra do Iraque, não é um País que os possa promover.

Vamos ter o ‘Rock in Rio', o Euro 2004...

Sim, mas mesmo que exista um ataque em Portugal, não será agora. Na altura desses eventos e quando as atenções estiverem voltadas para Portugal, a Al-Qaeda, se tiver que atacar, ataca um país que não esteja minimamente à espera.

Tem amigos brasileiros em Portugal? Há cada vez mais actores e personalidades a fixarem residência no nosso país.

Tenho muito poucos e não me relaciono com outros actores que residem cá. Estou muito concentrado no meu trabalho como compositor.

MAIS FOFOCAS

Como é que lida com a imprensa portuguesa?

Depende da imprensa. Por exemplo, há 20 anos, existiam menos revistas de fofocas e as que existiam eram mais ligeiras. Hoje em dia, e em todo o mundo, existe uma linguagem menos séria, mais ardilosa e até venenosa. Criam-se mentiras e situações absurdas sobre as pessoas.

Ou seja, isso costuma acontecer consigo?

(risos) Graças a Deus que já aconteceu várias vezes essa imprensa menos séria dizer coisas erradas a meu respeito. Há uma frase de Dalai-Lama que ilustra o que sinto: "A mente tem o poder de transformar tudo o que dizem." Portanto, toda a ‘bobagem' que a imprensa diz sobre mim não significa nada.

O Maurício simpatiza com a filosofia budista.

Mais que simpatizante sou um estudioso e praticante do budismo tibetano. Estive várias semanas enclausurado em mosteiros budistas na Índia e admito que a minha maneira de ser e de encarar a vida mudou completamente.

Qual foi a telenovela que mais o marcou?

As novelas são como os filhos, gostamos de todas por igual. Cada uma tem um sabor e uma cor diferente. No entanto, eu guardo uma recordação muito especial do ‘Roque Santeiro', porque foi um marco nacional e a primeira produção em que participei. No episódio em que a minha personagem (João Ligeiro) morria, tínhamos 99% de audiência e o público a insistir para que eu não morresse. Isto foi em 1984. Passaram 20 anos e as pessoas ainda se lembram do meu personagem. Isso marca.

É verdade que no Brasil o público não distingue a personagem do actor?

Depende dos casos, mas de uma forma geral, isso costuma acontecer. Quando um actor começa a interpretar papéis de vilão e não tem outros trabalhos de referência, isso pode confundir o público.

AS NOVELAS PORTUGUESAS

O que pensa deste surto de produções portuguesas que estão a ‘invadir' o Brasil?

Lamentavelmente não vi nenhuma novela portuguesa, nem cá, nem lá. No entanto, penso que é fantástico e que o trabalho dos actores portugueses enaltece o trabalho dos actores brasileiros. Vamos ter algumas co-produções Brasil/Portugal e sinto que esta parceria vai enriquecer ambos os países.

Que outras paixões tem, além da representação e da música?

Gosto muito de ler, em particular Filosofia, Sociologia e História. E sou fascinado por Química e por tudo o que diz respeito aos átomos, iões... (risos)

E se depois de ‘respirar música' o convidassem para integrar o elenco de uma telenovela portuguesa?

Faria com o maior prazer! Podia ser até durante os espectáculos. No Brasil eu tinha um método: gravava às terças, quartas e quintas. Às sextas, sábados e domingos dava espectáculos. E às segundas, descansava.

Isso significa que está disponível?

Significa que se conseguisse conciliar a música com uma novela portuguesa e se o papel me agradasse, não hesitaria.

Aos 40 anos, quem é, afinal, o Maurício Mattar?

Sou um poeta da vida.

Ou a vida é que é poética?

(risos) Ambos. Penso que se todos bebessem uma colher diária do ‘xarope da poesia', seriam muito mais felizes.

Aos 40 anos e pai de três filhos, Maurício Mattar não consegue fazer apagar a imagem de galã. Alimentou-a na sua vida pessoal e no pequeno ecrã na maior parte das 14 novelas em que participou. A última foi ‘Agora é que São Elas!', onde viveu a pele de Pedro. Mas na retina dos espectadores está ainda

o seu Leonardo Pontes, que viveu um amor proibido com Marina Batista (interpretada por Adriana Esteves), em ‘Pedra Sobre Pedra'. De nome completo Maurício Mattar Kirk de Souza, o actor nasceu no Rio de Janeiro. A cantora Elba Ramalho, a apresentadora Angélica e a actriz Deborah Secco foram as mais mediáticas das suas relações. Ainda recentemente, a imprensa atribuiu-lhe um romance com a portuguesa Marta Pereira.

O actor e compositor tem três filhos fruto de relações diferentes: Luan de 16 anos, Raira de 13 anos e Petra de 9 anos.

"Sou um pai muito presente e muito agarrado aos meus filhos", desabafa. O facto de ter mudado de continente não o aflige. "Nas férias eles vêm ficar comigo. A mais nova é quem mais precisa de mim porque os outros, como são adolescentes, estão na idade das descobertas, das festinhas, do namoro, dos amiguinhos... Tenho muito apego por eles mas, ao mesmo tempo, eles são como folhas... precisam de liberdade."

CAETANO VELOSO: O COMPADRE

‘Meu Segundo Disco' é composto por dez faixas e conta com a participação de Carlinhos Brown, Zeppa, Filipe Mukenga e Tozé Brito. Apesar de ser o primeiro trabalho a ser editado entre nós, este é o sétimo trabalho da carreira do actor e do compositor que gravou cinco álbuns em parceria com outros artistas brasileiros e um seu, ao qual intitulou de ‘Meu Primeiro Disco' (2001). "Foi um enorme prazer fazer esse primeiro trabalho que considerei meu de verdade, com as minhas composições e com a ajuda de grandes amigos como o Nilton Nascimento, os Melodia, o Toquinho e o Caetano Veloso", comenta. No Brasil, Maurício Mattar recebeu rasgados elogios de várias personalidades, entre as quais, Nana Caymmi, Djavan, Nelson Motta e do próprio Caetano. "O Caetano e eu somos como irmãos. Somos mais que isso. Somos compadres. Ele é padrinho do meu filho e um amigão", remata.

Agradecimentos:

FAROL DESIGN HOTEL - CASCAIS

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