Polícia cabo-verdiano suspenso por 100 dias pela "mediática fuga" de condenado

Fuga do condenado por homicídio Arlindo Teixeira foi concretizada em 27 de junho, auxiliado pelo advogado de defesa e deputado Amadeu Oliveira.

20 de outubro de 2021 às 10:08
Polícia Cabo Verde Foto: Getty Images
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A Polícia Nacional (PN) cabo-verdiana anunciou esta quarta-feira a suspensão por 100 dias de um subchefe principal, responsabilizado pela "mediática fuga" do país de um homem condenado por homicídio, auxiliado pelo advogado de defesa e deputado Amadeu Oliveira.

Em comunicado, a direção nacional da PN recorda que a fuga de Arlindo Teixeira foi concretizada em 27 de junho passado, através do posto de fronteira do Aeroporto Internacional Cesária Évora, ilha de São Vicente, e que procedeu então à "abertura de um processo, visando o apuramento de responsabilidades por eventuais falhas ocorridas".

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"No decurso das averiguações foi instaurado um processo disciplinar contra o subchefe principal da PN, supervisor de turno na altura, o qual foi acusado de ter infringido os deveres gerais de zelo, obediência hierárquica e lealdade, previstos no Regulamento Disciplinar do Pessoal Policial", refere o comunicado.

Acrescenta que no uso das competências legais, ao referido efetivo foi aplicada a pena disciplinar de 100 dias de suspensão, "acumulada com a sanção acessória de transferência para outro serviço distinto do Serviço de Fronteiras", punição que "já foi confirmada em sede de recurso hierárquico".

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Em 27 de junho, Arlindo Teixeira, condenado inicialmente a 11 anos de prisão por homicídio -- pena depois revista para nove anos -, saiu do país a partir de São Vicente num voo da TAP com destino a Lisboa, tendo depois seguido para França, onde está há vários anos emigrado.

Arlindo Teixeira é constituinte do advogado e deputado Amadeu Oliveira, forte contestatário do sistema de Justiça cabo-verdiano, num processo que este considerou ser "fraudulento", "manipulado" e com "falsificação de provas".

Desde final de junho que este caso está a suscitar várias reações em Cabo Verde, como a do Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, que considerou o caso de "muita gravidade" e pediu investigação célere e sanções aos responsáveis.

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O procurador-geral da República, José Luís Landim, afirmou anteriormente que este caso é um "ataque grave" à justiça e à democracia cabo-verdiana.

Amadeu Oliveira assumiu publicamente em julho, no parlamento, que planeou e concretizou aquela fuga, admitindo então que estava "estupefacto" por ainda não ter sido preso.

"Eu já ofereci a minha cabeça para ser preso. Até estou estupefacto porque é que ainda não fui preso. Porque confesso: Eu, Amadeu Oliveira, como defensor oficioso nomeado pelo Estado, concebi, estudei, matutei, planei e executei o plano de saída de Arlindo Teixeira", afirmou o deputado e ativista, no parlamento.

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O Tribunal da Relação de Barlavento, ilha de São Vicente, aplicou em 20 de julho a prisão preventiva a Amadeu Oliveira, enquanto assumido autor daquela fuga.

O deputado tinha sido detido dois dias antes à chegada à ilha de São Vicente, uma semana depois de autorizada pelo parlamento cabo-verdiano, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), fora de flagrante delito, imputando-lhe a prática de um crime de ofensa a pessoa coletiva e dois de atentado contra o Estado de Direito.

Eleito em abril nas listas da União Caboverdiana Independente e Democrática (UCID), Amadeu Oliveira foi visado em julho por esta atuação no arranque dos trabalhos parlamentares, com o Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, oposição) a considerar o caso como "vexatório" e a pedir responsabilidades ao Governo e à Polícia Nacional, tendo em conta que o arguido em causa, emigrante em França, tinha sido colocado em prisão domiciliária, na ilha de São Vicente, de onde conseguiu fugir.

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"Eu tomei essa decisão [de planear a fuga] em 18 de junho. Em menos de dez dias já estava executado", afirmou Amadeu Oliveira, que acompanhou o arguido na fuga de Cabo Verde, insistindo nas críticas ao sistema de Justiça no arquipélago e pedindo a sua reforma.

Em comunicado anterior, a PGR explicou que em causa está o envolvimento do também advogado de defesa na saída do país de um arguido, condenado a nove anos de prisão, pela prática de um crime de homicídio simples, e que aguardava os demais tramites processuais sob a medida de coação de obrigação de permanência na habitação, determinada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

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