Dizem terem sido abusadas sexualmente. Ele admite o uso de um sedativo.
O meu agente disse-me que tínhamos sido contactados por uma pessoa muito importante da indústria do entretenimento que estava interessada em ser mentora de um talento promissor. Descobri que era Bill Cosby. O que percebi foi que ia ter aulas privadas de atuação com ele. Era a oportunidade de uma vida. Um motorista foi buscar-me, o meu agente pagou-lhe. Tudo muito profissional. A porta abre-se e lá está Bill Cosby. De roupa de treino, muito informal, muito amistoso."
Este é o começo do relato de Heidi Thomas, uma das mulheres que aceitaram ser fotografadas e contar as suas histórias à ‘New York Magazine’, no mês passado. A revista fez capa com 35 – as que aceitaram o desafio. Mas há mais. Pelo menos 46 garantem ter sido drogadas e abusadas sexualmente pelo humorista.
A história de Heidi continua assim: "Eu levava um monólogo preparado. Ele pareceu não ficar impressionado. Disse: ‘Vamos tentar uma leitura a frio’, e puxou de um ‘script’. A cena passava-se num bar; a personagem estava embriagada. Ele encheu-me um copo de vinho branco. E disse: ‘Usa isto como adereço – isso significa que vais ter de ir bebendo, claro’."
Claro. Era assim que, de acordo com todos os relatos, fazia sempre: oferecia os comprimidos diretamente ou colocava-os de forma discreta nas bebidas.
Quando, em julho, o tribunal tornou acessível o depoimento que Cosby teve de prestar há dez anos no âmbito da investigação à primeira de todas as queixas – a de Andrea Constant – o ‘New York Times’ publicou trechos suficientemente elucidativos.
No inquérito, o ator assumiu que recorria ao Quaaludes, um potente sedativo que, quando tomado com álcool, aumentava o estado de embriaguez e sonolência – e podia levar à inconsciência. Este fármaco, também chamado "droga da violação" ou "boa noite Cinderela" foi proibido nos EUA em 1984.
Na inquirição, Bill Cosby admitiu ter pedido que um médico de Los Angeles lhe prescrevesse o medicamento sete vezes. E que o deu a mais do que uma mulher. E que o objetivo era ter sexo. Mas considerou sobre o recurso a estes comprimidos: "É o mesmo que dizer: ‘Bebe um copo’." E nunca, afirmou, violou ninguém. Era tudo consentido, garantiu. Como é que uma mulher inconsciente pode dar consentimento a que com ela tenham atos sexuais é mais difícil de explicar.
Ou não: para Cosby o simples facto de aceitarem estar ali com ele, tomar uma bebida e, eventualmente, o comprimido, servia de aval para tudo. Se estas mulheres acediam a encontrar-se com ele, sugeriu, ele tinha direito a elas. E, assim, 46 contam como acordavam grogues, muitas vezes incapazes de andar ou de se mover, despidas, com ele ao lado, ou ainda a fazer o que lhe apetecia.
A história de Heidi Thomas termina assim: "Não me lembro de muito mais, exceto de acordar no quarto dele. Ele estava nu, e estava a forçar-se na minha boca."
CASO ARQUIVADO
Meses depois do seu depoimento, Cosby chegou a acordo (financeiro e de confidencialidade) com Andrea Constant. A maioria das 12 mulheres que na altura se dispuseram a relatar experiências semelhantes em tribunal manteve-se no anonimato. "Ninguém vai acreditar em ti", diziam-lhes os mais próximos. Cosby já era uma megaestrela da televisão: comediante, ator, apresentador, produtor, escritor, músico, o homem que durante oito anos personificou o mítico pai de família Dr. Cliff Huxtable no ‘The Cosby Show’, um dos programas de maior sucesso dos anos 80 nos Estados Unidos.
E o caso acabou por cair no esquecimento. Até que em outubro passado num espetáculo de stand-up o humorista Hannibal Burress recuperou as antigas acusações e referiu-se a Cosby, sem rodeios, como um violador.
O vídeo tornou-se viral na internet. A seguir foi Barbara Bowman, que já tinha dado a cara aquando do caso Constant, que falou ao ‘Washington Post’ sobre a sua frustração por nunca ninguém ter acreditado nela. Três dias depois, Joan Tarshis apareceu publicamente: "Pensei: ‘É agora. Tenho de me levantar e dizer: ‘Sim, há alguém que acredita em ti. Também me aconteceu’." No fim de novembro de 2014 outras 16 mulheres tinham feito o mesmo. Em fevereiro já se somavam mais doze.
Cosby, agora com 78 anos, continua a negar qualquer comportamento incorreto. Os seus representantes defendem que o comediante apenas admitiu "ser uma das muitas pessoas que usava Quaaludes na sua vida sexual consentida nos anos 70."
Nos últimos dias, a imprensa recuperou um trecho de uma entrevista que o ator deu a Larry King em 1991. Por incrível que possa parecer, ele fala desta droga. Sorriso largo, gozo estampado na cara, uma total falta de qualquer tipo de pudor – ou mesmo de noção –, afirma sobre o ‘spanish fly’, outro nome dado a este medicamento: "Era a coisa que todos os rapazes, desde os 11 anos em diante… Até morrermos [ri entusiasticamente]… continuaremos a procurar ‘spanish fly’. A história era que bastava uma pequena gota, do tamanho de uma cabeça de alfinete, punha-se numa bebida, a rapariga bebia e… ‘Olá América!’" Fim de trecho. Estes segundos de conversa chegam.
Mas agora Bill Cosby vai ter de voltar a responder sobre isto e muito mais. Perdeu a última tentativa para impedir o avanço do processo cível interposto por Judy Huth, que diz ter sido violada em 1974 na mansão da Playboy em Los Angeles quando tinha apenas 15 anos.
Até ao final de setembro, o comediante terá de falar a sério outra vez.
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