Costa ocidental de África é entreposto privilegiado para receber droga produzida na América do Sul e com destino à Europa
O aspecto dos contentores travados na alfândega daquele país africano virado ao Atlântico pouco ou nada avisava do conteúdo escondido. Aos olhares incautos mostravam apenas mais um rol de roupa usada, ou várias placas de gesso, mas no interior, apenas detectáveis com scanners, estavam vários carregamentos de cocaína: a segunda droga mais traficada no Mundo (a seguir à canábis), num total de 732 toneladas por ano segundo dados do relatório de 2011 do UNODC - Gabinete das Nações Unidas contra Drogas e Crimes.
Desde a produção na América do Sul ao consumo na Europa - onde 14,5 milhões de pessoas admitem já ter experimentado pelo menos uma vez -, a maldita cocaína faz uma longa viagem que agora toca também a costa de África. O mar tornou-se mais apetecível aos traficantes que, de acordo com o mesmo relatório, lucram 680 milhões de euros anuais.
"Com efeito, desde há muitos anos que o crime organizado elegeu vários países da costa ocidental do continente africano como plataforma para fazer chegar a cocaína produzida na América do Sul aos países de destino, especialmente europeus e até aos Estados Unidos da América", explica Luís Baptista, ex-coordenador de investigação criminal da Polícia Judiciária.
"As normas rígidas de segurança colocadas nas fronteiras aéreas de todo o Mundo, incluindo nas dos países africanos", levaram a que "as organizações criminosas rapidamente passassem para o tráfico por via marítima, quer utilizando os contentores das rotas do imenso tráfego comercial mundial quer meios próprios", adianta.
Veleiros, meios navais "integrados em alegadas actividades piscatórias ou de transporte" e navios de última viagem, comprados a preços mais baixos por pouco servirem para outra actividade, são usados para o transporte, estando cada vez mais bem apetrechados com satélites e sistemas de navegação sofisticados.
E a escolha das rotas não é casual. Por um lado, assinala o antigo responsável por brigadas contra o tráfico marítimo, "a costa ocidental africana possui uma posição geográfica privilegiada em relação aos países da América do Sul, especialmente os que são mais usados para trânsito - Venezuela, Brasil, Suriname e certas ilhas das Caraíbas - da cocaína produzida na Colômbia, no Peru e na Bolívia". Por outro, "os traficantes exploram o relacionamento comercial dos países africanos onde desenvolvem as suas actividades com os países europeus com quem estes possuem laços históricos, culturais e sociais", diz.
Apesar de os últimos relatórios revelarem menos apreensões nos países da costa africana ocidental - 21 toneladas em 2009 contra 41 toneladas em 2007 -, tal não significa que o tráfico tenha diminuído. Significa sim que "as redes criminosas alteraram os seus métodos", advertiu Al-Hafedh, representante do UNODC para a África Ocidental e Central.
A verdade é que "as organizações criminosas referidas estabeleceram-se em certos países africanos de forma permanente desde a década de 1990, especialmente naqueles de maior fragilidade política, administrativa e organizativa em geral e de forte carência social", alerta Luís Baptista.
Os métodos são simples: "Adquirem empresas falidas ou economicamente débeis, especialmente de pesca ou com conexão a esta actividade, e tratam de constituir frotas, adquirindo velhos navios, alguns na Europa, adaptados e melhorados à actividade piscatória ou de transporte, sendo a primeira a mais comum".
O mais recente relatório OEDT- Europol sobre o tráfico de cocaína para a União Europeia assinala as rotas de tráfico que cruzam o Atlântico, destacando como principais as do Norte, a Central e a Oeste Africana. No entanto, detectar os traficantes na imensidão do mar não é tarefa fácil.
"Estes navios, enquadrados e equipados, deslocam-se à zona do mar das Caraíbas, às proximidades das costas dos países de trânsito ou simplesmente ao alto-mar, onde recebem os carregamentos de cocaína - de outras embarcações e até de meios aéreos - que depois transportam até aos países africanos de conexão, onde a droga é armazenada e, a partir dali, reenviada para os países de destino, por formas diversas", diz Luís Baptista.
Porque "o tecido económico desses países [da costa ocidental de África] é fortemente contaminado, sendo muitas vezes difícil, especialmente nos casos mais duradouros, separar o lícito do ilícito", o ex-PJ adverte para a necessidade de ter "forças policiais bem treinadas" e "legislação eficaz". E salienta, pela positiva, o trabalho de dois países africanos, "Cabo Verde e Angola têm dado sinais claros de combate ao fenómeno".
        
APREENSÕES E ÁGUA CONTAMINADA
    
Península Ibérica, Bélgica e Holanda são porta de entrada da cocaína para a Europa, onde se estima que oito milhões de jovens adultos (dos 15 aos 34 anos) consuma esta droga. A alfândega do Aeroporto de Lisboa registou, nos primeiros três meses do ano, 47 apreensões de cocaína transportada, num total de 168 213 quilogramas. Os passageiros eram oriundos maioritariamente do Brasil, República Dominicana, Venezuela e Guiné-Bissau.
Em Barcelona (Espanha), amostras colhidas em 37 poços de água subterrânea no ano de 2010 revelaram a presença de vários tipos de drogas em três áreas diferentes da cidade, revela um estudo do Instituto Catalão de Pesquisa da Água.
A cocaína predominava na secção central da rua Mallorca, com concentrações de 68 e 60 nanogramas por litro. O estudo sugere que em áreas ricas em vida nocturna e frequentadas por classes económicas superiores são detectadas concentrações mais elevadas desta droga.
NOTAS
TRUQUES
Malas de senhora, escovas de cabelo, peças de automóvel e roupa escondiam cocaína.
CONSUMO
Espanha e Reino Unido têm maior consumo na UE, com 3% de casos de morte súbita.
REDES
Pasta base de cocaína é incorporada em cera, plástico e tecidos e depois extraída em laboratórios na UE.
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