Entre a lista de independentes que se aliaram à candidatura de Garcia Pereira, pelo MRPP, estão muitos apartidários, amigos, colegas e a filha.
Coisas de esquerda, não sou muito virado para aí” – declara firme João Soeiro, ex-oficial piloto aviador da Força Aérea que, mais tarde, porque ganharia mais dinheiro, passou a comandar aviões da TAP. Era o número dois da lista de candidatos encabeçada por Garcia Pereira. O prestigiado advogado que decidiu correr na volta eleitoral para comandar a maior autarquia do País, tendo o símbolo do PCTP/MRPP no boletim de voto, entre o seu nome e as cruzes dos eleitores que esperava arrecadar. Logo após o advogado e o comandante, a lista tinha mais 29 candidatos – muitos amigos, colegas, a filha. Só algumas destas pessoas se identificam com os ideais do partido de extrema-esquerda – ao qual, inevitavelmente, se associaram: o marxismo-leninismo-maoísmo. “Juntei-me por amizade ao dr. Garcia Pereira. Somos amigos há muitos anos. Vá ele para onde for, eu também vou”, remata João Soeiro.
Conheceram-se na luta sindical: Soeiro presidia nessa altura, há sete anos, o Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil e uma luta laboral entre os pilotos e a TAP levou à contratação de António Garcia Pereira na defesa dos interesses destes trabalhadores. Os dois ficaram amigos, embora o comandante afirme que nunca por ligação ao MRPP.
Por altura do 25 de Novembro de 75, Soeiro era um piloto aviador da Força Aérea – e Comandante da Polícia Aérea da Esquadra de Sintra – “descontente com os caminhos da revolução”. Envolveu-se então em confrontos com o PCP: “foi gente com quem nunca me dei bem, já desde essa altura.” Conta que muitas pessoas o julgavam de extrema-direita. Agora, não se incomoda que pensem o inverso. “Já não é aquele MRPP do pinta paredes, tipos de barba rija. São gente boa, alguns formados outros sem formação, mas gente calma, serena.” Mas não se revê nos mesmos ideais.
“Nunca pertenci à alta burguesia, mas fui sempre recompensado pelo meu trabalho”, atesta. E foi por melhor salário – “três vezes mais” – que passou de oficial da Força Aérea a comandante da TAP, em 1980. “Depois, dá-se um certo deslumbramento. E, como o ser humano é um animal de hábitos, se ganhar cem gasto cem; se for mil, gasto mil.”
FILOMENA CASANOVA ALVES
A candidata que surge em oitavo lugar na lista do MRPP é Filomena Casanova Alves, com 46 anos. Esta advogada enquadra-se na verdade numa classe social e laboral muito diferente do esperado – como a própria descreve – pelo “eleitorado que associa [os candidatos de extrema-esquerda] aos operários, de-sempregados e àqueles que pegam na foice e martelo.” E não é nada disso. “Em bom rigor, não posso dizer que me identifique com o MRPP. Existe uma ligação ao prof. Garcia Pereira.”
Entre os oito advogados da lista de 31 candidatos – 14 deles independentes –, encontra-se Rita Batalha Dias Garcia Pereira, com 28 anos. A filha do candidato a presidente da autarquia lisboeta. Tal como na corrida às Presidenciais de 2006, Rita ficou encarregue dos assuntos digitais. Quando, no domingo último, o seu pai lia o comunicado sobre os resultados eleitorais frente para uma câmara de televisão – com uma apoiante à sua direita, Sandra Vinagre, técnica de Recursos Humanos, e, à esquerda, o comandante Soeiro –, a filha estava fechada no gabinete que recebia informações sobre as votações.
Filomena Flores, com 35 anos, advogada que trabalha no escritório da sociedade de advogados Garcia Pereira e Associados, figura entre os candidatos. É a 16.ª – também independente. “Conheço o dr. Garcia Pereira, mas não me ligava a uma candidatura por simpatia. Também não sou do MRPP.” Justifica, então, que foi o “programa apresentado pela candidatura” que a fez aliar-se ao que a própria considera “bom para Lisboa e que vai de encontro aos princípios e desejos do MRPP”.
Além destes nomes, entre os 14 independentes, consta Nuno Cardoso Silva, professor universitário, “conhecido pelas suas ideias monárquicas” – reconhece Garcia Pereira. Mais, por exemplo, o médico António Lurdes Martins, o engenheiro João Ferreira Peters, o juiz desembargador aposentado José Gonçalves Lopes.
“Foi este o conjunto de pessoas que se reviu no meu programa [eleitoral do PCTP/MRPP]”, explica Garcia Pereira. “Naturalmente que marxistas, leninistas e maoístas estão sempre disponíveis para fazer alianças políticas com candidaturas que defendem princípios correctos. Isso passa por nos entendermos com pessoas de outros sectores da sociedade.” O ex-candidato à Câmara de Lisboa justifica que só não concorreu como independente porque, “perante o aperto dos prazos”, não conseguiria, atempadamente, recolher as 4000 assinaturas necessárias.
João Soeiro, 60 anos, é filho de um oficial da Força Aérea. A sua mãe cuidava dos dois filhos, embora a irmã tivesse falecido com 21 anos. “É a mulher que mais falta me fez na vida”, confessa o comandante. Em 1965 entra para a Academia Militar e, em 69, é promovido a Alferes Piloto Aviador. Esteve na guerra do Ultramar e regressa ao País quando se dá o 25 de Abril de 1974. Participa no 25 de Novembro de 1975 e parte depois para os Açores. Regressa ao Continente pouco depois para voar nos C130. Já em 1980, por poder “ganhar três vezes mais” na vida civil, entra para a TAP, como piloto. Neste período, até se reformar a 24 de Dezembro de 2006, foi dirigente da Associação e do Sindicato dos Pilotos de Aviação Civil. Neste último cargo conheceu Garcia Pereira, que defendeu uma luta sindical. João Soeiro é pai de dois filhos do primeiro casamento e de um menino de um ano do último matrimónio. Tem também dois netos.
FORAM 3122 ELEITORES
Foram 3122 os eleitores que votaram em Garcia Pereira – candidato do Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses/Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado, PCTP/MRPP, com 1,59 por cento dos votos. O advogado, nascido em Lisboa em 1952, deverá candidatar-se a bastonário da Ordem, em 2008. Em 1972 adere à organização estudantil do MRPP. Dois anos depois, passa a militar
Filomena Flores, com 35 anos, era a 16.ª candidata – como independente – pela lista de Garcia Pereira à Câmara de Lisboa. A advogada do escritório onde o cabeça de lista do PCTP/MRPP (foto ao lado), afirma que não é deste partido de extrema-esquerda e que só se juntou a esta luta pela autarquia por considerar o programa de campanha “bom para Lisboa”. Outra advogada, Filomena Casanova Alves, com 46 anos, era a 8.ª da lista (foto em baixo) – também como independente. “Ligação ao partido não existe, mas sim ao professor Garcia Pereira”, diz.
"O PCTP/MRPP DEIXOU DE EXISTIR HÁ MAIS DE 30 ANOS"
Sobre a campanha de Garcia Pereira para as eleições intercalares de Lisboa, o fiscalista Saldanha Sanches dispara logo: “Isso não tem nada a ver com o MRPP, tem a ver com a angariação de clientes para o seu escritório de advogados.” Já o facto de que, da lista de 31 candidatos, 14 sejam independentes, Saldanha Sanches não fica espantado porque, no seu entender, “sabiam que nenhum seria eleito”. Quanto ao eleitorado, “nem fazem ideia de quem aparece na lista”. O fiscalista, que também militou no MRPP, recorda que o partido “sempre teve uma posição hipócrita porque dizia que falava em nome da classe operária, quando este era um dos bastiões do Partido Comunista”. Depois do 25 de Abril, os estudantes radicais – que na verdade eram quem militava, na sua maioria, este partido – seguiam a linha maoísta, inspirada nos ensinamentos de Mao TséTung, na China. “Seria a forma actual do marxismo e leninismo”, diz. Embora a posição chinesa fosse crítica a Estaline, em Portugal chegaram a ser empunhados cartazes com a sua figura, conta Saldanha Sanches. Mas, “o PCTP/MRPP deixou de ter linha política há mais de 30 anos”, acrescenta.
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