As autarquias gostam de dar música aos munícipes. Por isso, fomos ver quanto é que os campeões dos concertos cobram.
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Pode amar pelos dois e cobrar por seis. Foi mote para a abertura de noticiários, preencheu as gordas dos jornais diários e foi objeto de notícia em larga escala. Diante de 182 milhões de espectadores, venceu o Festival Eurovisão da Canção em 2017 e viu o seu nome de batismo – de que às vezes abdica para cantar – ser badalado como nunca. Salvador Sobral, 28 anos, até então conhecido de um nicho de produção jazz restrito e para uma elite intelectual, vê-se transformado num artista popular, valorizado vertiginosamente, e produto de massas. A euforia em torno do tema ‘Amar Pelos Dois’ fez multiplicar as solicitações de promotores por datas, amplificou a procura por bilhetes e as plateias circunscritas a poucas centenas de lugares expandiram- –se para números de outra grandeza. A notoriedade alcançada no palco europeu fez capitalizar o artista no mercado interno: um mês depois, pagava-se seis vezes mais por um concerto de Sobral.
As contas são afinal simples de traçar: aplica-se a lei da oferta e da procura. As autarquias, um dos principais motores da indústria, alinham pelo mesmo diapasão e operam a máquina bem oleada que serve aos munícipes o que estes querem ouvir. Aconteceu em Ovar e apanhou o município da Costa de Prata na curva. Contratualizado antes da vitória em Kiev, o concerto de Salvador Sobral marcado para 27 de maio do ano passado, no centro de arte local, estava orçamentado em 3900 euros, a assumir por aquele município pela "realização do espetáculo ‘Excuse Me com Salvador Sobral’" diante da ‘Fado in a Box’, empresa responsável pelo agenciamento do músico – assim consta ipsis verbis no Portal Base do Governo, onde se encontram acessíveis os contratos estabelecidos por instituições públicas.
A prestação europeia a 13 de maio de 2017 fez o valor do contrato ser revisto em alta. O novo documento, firmado com novo promotor, fez ascender a maquia a 24 500 mil euros, seis vezes mais do contratualizado um mês antes.
A extensão do contrato alarga-se e passam a estar previstos os custos com movimentos logísticos, consequência da transferência do espetáculo para nova sala. Por entre as exigências, conta-se um piano Steinway B, a colocação de mil novas cadeiras e a limpeza da arena antes e pós-espetáculo. Do centro de arte, o concerto é deslocado para a Arena Dolce Vita e a capacidade de 376 lugares vê-se alargada para dois mil sentados no novo local. O preço do ingresso fixou-se nos 10 euros e da sala cheia resultariam – em teoria – 20 mil euros em receita de bilheteira e presumimos um saldo negativo para o município.
Prevista para 2 de setembro do ano passado, no Parque das Termas da Curia, em Anadia, a apresentação do mesmo espetáculo – homónimo do álbum jazz de Salvador Sobral, ‘Excuse Me’ – acaba por não se efetivar por "indicação médica" que obriga ao cancelamento dos seus compromissos profissionais e dita o início de um intervalo de meses na carreira do cantor. Mais tarde, a 9 de dezembro acabaria submetido a um transplante de coração. O contrato assinado previa a aquisição do espetáculo de Salvador Sobral por seis mil euros. Concretizou-se já este ano, sob novo documento firmado com o município de Anadia, para concerto com entrada gratuita – a 8 de junho – a propósito do ciclo ‘Às Sextas na Praça’, na praça da Juventude daquele concelho do distrito de Aveiro. Fez-se pagar pelo valor previsto um ano antes, na única entrada do artista em nome próprio na lista de contratos celebrados este ano. Por um montante na mesma ordem (6500 euros) já a irmã, Luísa Sobral, tinha por lá atuado um ano antes em espetáculo inserido na mesma iniciativa.
Numa altura em que se encontrava na reta final da gestação - entretanto foi mãe de Rosa –, Luísa Sobral anuncia o cancelamento do espetáculo agendado para maio deste ano, na ‘Semana da Ascensão’, Chamusca, "por motivos de força maior relacionados com a gravidez": estava orçado em 10 mil euros, valor na ordem do qual - em média - deverá custar a presença de qualquer um dos irmãos Sobral.
Como Alexander Search, heterónimo que Salvador Sobral partilha com Fernando Pessoa no projeto com o pianista Júlio Resende, atuou no mês passado em Ílhavo por 7500 euros; em Castelo Branco cobrou mais duzentos euros.
Clã Carreia
Os paralelos sãodifíceis de estabelecer: um só artista desmultiplica-se em atuações a solo, com banda, com ou sem som próprio, em projetos para massas ou mais acústicos e intimistas. Essas como outras questões logísticas refletem-se em acordos à medida de cada aparição, consumada em valores distintos.
4 de julho de 2018, 22 horas. Era quarta-feira – dia atípico de espetáculo – e Tony Carreira, 54 anos, subia ao palco principal da Expobairrada 2018, em Vila Verde, Oliveira do Bairro. O espetáculo musical, que ao munícipe custou cinco euros, pesou 39 mil euros à autarquia, segundo informação disponível no Portal Base do Governo. Tony Carreira é dos artistas nacionais mais bem pagos: ali dividia cartaz com Raquel Tavares (10 mil euros), Pedro Abrunhosa (28 mil euros) e José Cid, que por um euro não viu o valor do seu contrato atingir os 20 mil euros. Exceção feita ao dia de Tony, a entrada fazia-se por 1,5 euros. Pela mesma bitola, mas com ingresso gratuito, o areal do Rio Lima, receberá no próximo dia 11 o cantor natural de Pampilhosa da Serra num acordo fechado por 39 mil euros com a autarquia de Ponte de Lima. Vive um autêntico sonho de menino. Um dia antes, o filho mais velho do cantor romântico, Mickael Carreira, de 32 anos, sobe ao palco principal da Festa do Emigrante 2018, na vila ribatejana de Ferreira do Zêzere, numa presença acordada em 18 900 euros. Em maio, uma apresentação semelhante custou uns redondos 20 mil ao município de Vendas Novas, no Alentejo. O irmão mais novo, David Carreira, de 26 anos, não apresenta entradas a solo na listagem deste ano, mas uma análise dos dados do ano passado permite atestar uma variação considerável de valores.
A 18 de junho, um concerto inserido no Festame 2017, na Mealhada, custou à autarquia 14 mil euros, por adjudicação à Regi-Concerto, a empresa da família de agenciamento e produção de espetáculos. Menos de um mês depois – a 9 de julho – um concerto de David custou ao município de Lagos, a propósito do InLagos Street Food Fest daquele ano, um montante na ordem dos 27 mil euros - quase o dobro.
Fenómenos fora, nomes consolidados como o de Mariza – que atua quarta, em Sernancelhe a troco de 35 mil euros – ou o de Quim Barreiros – que manobra o fole da gaita hoje, no Sobrado é Festa, em Valongo por oito mil euros – continuam a destacar-se, por número de concertos ou valor auferido, num querido mês de agosto de frenesim cultural que renova a cada ano a vitalidade de um mercado restrito.
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