Dezenas de jovens candidataram-se a estudar na New York Film Academy, que veio pela primeira vez recrutar a Portugal
Qualquer coisa de magia e sonho do cinema anda pelo ar quando uma italiana diz "see you in Florence" ao despedir-se de uma portuguesa, à porta de uma sala num hotel da avenida da Liberdade, em Lisboa. Até porque a italiana é Diana Santi, diretora de Programas Internacionais da New York Film Academy (NYFA), e a portuguesa Teresa Alves, de 19 anos, uma das candidatas que mais a impressionaram nas audições que decorreram na passada terça-feira, ao ponto de deixar claro que no final do verão conta revê-la em Florença, onde se encontra a principal delegação europeia da escola de cinema norte-americana.
"Não estava à espera de que aparecesse tanta gente. Encontrei muito talento aqui em Portugal, sobretudo dois interessados em serem diretores de fotografia e dois na representação: um homem e uma mulher", diz Diana Santi à ‘Domingo’, minutos antes de dar por terminada a sessão de recrutamento em que avaliou trabalhos e personalidade de duas dezenas de candidatos, realçando a satisfação por receber pessoas vindas do Porto ou de Braga.
Para Teresa Alves, que convenceu a responsável da NYFA com dois monólogos dos filmes ‘Birdman’ e ‘Ana e suas Irmãs’, o caminho foi mais curto, pois deu os primeiros passos na representação na Escola Profissional de Teatro de Cascais, perto de sua casa, de onde passou para a Escola Superior de Teatro e Cinema. A experiência acumulada em peças de teatro como ‘Marat-Sade, ‘Romeu e Julieta’ e ‘Sonho de uma Noite de Verão’, trabalhando com os encenadores Carlos Avilez, Bruno Bravo e Cristina Carvalhal - integra agora o elenco da comédia ‘Agregado Nada Familiar’ -, terá contribuído para o desfecho de uma tarde em que chegou bem antes da hora em que fez aquilo que encarou como um ‘casting’ muito especial, e do qual saiu "superaliviada".
"As pessoas em Portugal dão mais valor a quem vai para fora", confessa a jovem atriz, ainda com o telemóvel na mão depois de dar as boas- -novas à mãe. Sorridente com os elogios que ouviu à forma como a sua formação lhe permitiu suportar os textos, Teresa apreciou por uns minutos o "reconhecimento do trabalho, talento e dedicação" que não está habituada a ouvir em Portugal antes de encarar o problema prático comum a todos os interessados em estudar na NYFA: arranjar dinheiro. O workshop de oito semanas a estudar representação para cinema em Florença fica por 5687 dólares (5232 euros), enquanto um ano inteiro em Nova Iorque implica uma propina de 32 mil dólares (29 400 euros), que pode ser reduzida para 22 mil dólares (20 200 euros) se obtiver bolsa de mérito. Valores a que acrescem gastos com habitação e alimentação, nos quais a Itália é menos custosa do que os EUA, visto que o custo de vida em Florença não se compara ao de Nova Iorque ou Los Angeles, onde muitos dos aspirantes a entrarem na escola querem chegar.
Prontas para levantar voo
É essa a expectativa de Luísa Pereira, também de 19 anos, uma das primeiras a chegar na tarde de terça- -feira. "O meu maior sonho é estudar em Nova Iorque, mas a verdade é que Florença é uma alternativa mais realista", explica a aluna do curso de cinema da escola profissional ETIC.
Interessada em dedicar-se à produção cinematográfica, e ainda indecisa entre um curso de poucas semanas durante as férias ou um ano a estudar em Nova Iorque, o que fica por 40 mil dólares (quase 37 mil euros), Luísa prepara-se para "trabalhar no verão para juntar dinheiro", embora saiba que pode contar com a ajuda dos pais, nos quais antecipa outro impacto se for estudar para o estrangeiro. "Nunca fui de sair muito, de estar fora de casa, e se estiver longe eles perdem esse controlo", reconhece, com um sorriso, confirmando que eles sabem o que ali foi fazer naquela tarde.
Não tanto quanto Inez Beja Fino, que fez questão de acompanhar a filha ao hotel. Entusiasmada, Verónica Simões crê que nada a pode afastar das experiências que conta viver em Nova Iorque, apesar de parecer muito nova, e de as aparências não enganarem, pois a adolescente interessada em estudar música e representação tem apenas 15 anos, compensados pela força da convicção de que tem à espera um lugar no show business. "Nunca deu hipóteses. Aos três anos já dizia que ia ser cantora", acrescenta a mãe.
Enquanto candidatos mais velhos eram incapazes de disfarçar o nervosismo, Verónica mostrou-se imperturbável ao aguardar pela sua vez. "Não tenho medo. Já cantei para imensas pessoas", refere quem desde o final do ano passado tem um agente - nada mais nada menos do que João Pedro Ruela, responsável pela gestão das carreiras de Aurea, Carminho ou Raquel Tavares - a orientar a formação de uma adolescente que se imagina a chegar muito longe. "Basta estar no sítio certo e no momento certo. E trabalhar muito, claro", garante. Minutos mais tarde, depois de a sua voz afinada transpor as paredes e a porta da sala onde Diana Santi a avalia, sai sorridente, com a mãe ao lado. "Em princípio vou no verão", anuncia.
A caminho de Nova Iorque conta estar Concha Silveira, de 20 anos, aluna do segundo ano do curso de Cinema na Universidade Lusófona, que foi alertada por uma prima de que poderia encontrar ensino mais prático e sonante numa área de especialização. "O meu objetivo é estudar cinematografia", revela a aspirante a diretora de fotografia, que descobriu o que queria fazer quando, ainda aluna do 12º ano, viu ‘Shining’ e em vez de apenas se assustar com a interpretação de Jack Nicholson, percorrendo os corredores de um hotel fechado com um machado na mão, deixou-se fascinar pela forma como John Alcott ajudou o realizador Stanley Kubrick a criar um memorável clássico da sétima arte.
"Conseguir transmitir ao máximo o sentimento de um filme" é aquilo que pretende aprender a fazer na NYFA, contando com a ajuda da família para concretizar um sonho que admite poder levá-la a trabalhar fora de Portugal.
Em busca de financiamento
A oferta dirigida a candidatos portugueses, como aos outros interessados em aprender nas instalações da NYFA em Florença, varia entre workshops de uma a oito semanas – também há campos de férias para adolescentes – e um semestre inteiro dedicado a fazer cinema ou a representar em filmes. Mas muitos têm o olhar apontado para o outro lado do Atlântico. Diana Santi recorre ao termo ‘hub’, habitualmente usado para aeroportos com voos de ligação entre continentes, para explicar um objetivo do centro que dirige: "Florença é uma placa giratória que permite detetar talentos entre os estudantes europeus que devem prosseguir os seus estudos em Nova Iorque ou Los Angeles".
Para quem for parar à escola-mãe ou à que está localizada não muito longe do letreiro de Hollywood aplicam-se as mesmas propinas, que podem ultrapassar os 72 mil dólares (66 mil euros) caso se faça os seis semestres do mestrado de Belas Artes em Realização de Filmes ou o mestrado de Artes em Produção de Filmes e Media. Mais comedidos são os 19 650 dólares por um semestre de realização de filmes, acrescidos de uma taxa de 2100 dólares pela utilização de equipamentos da NYFA na rodagem de trabalhos de curso. Mas ainda assim são 21 750 dólares, que em euros quase se arredondam para 20 mil. Sempre sem contar com o que os alunos terão de pagar pelo alojamento (ainda que a NYFA recomende soluções tão baratas quanto possível) e pela comida.
"Muitos dos candidatos são jovens e estão à procura de financiamento para poderem participar", admite Nicol Zacco, que acompanhou Diana Santi na visita a Portugal – depois de Lisboa foram para Madrid e Barcelona, onde tinham à espera mais interessados em rumarem à NYFA. A todos são apresentadas listas com entidades a que podem pedir bolsas que facilitem a ida para a escola que escolherem e em que forem aceites.
Já a escolha entre Itália e EUA depende de fatores que vão para lá do financeiro. Nicol realça que não só Florença fica muito mais perto de Portugal como é o tipo de cidade em que "para arranjar um cenário de filme histórico não é preciso construí-lo". Mas embora as aulas também sejam em inglês, não esconde que boa parte dos candidatos "tem fascínio pelos estúdios de Los Angeles e pela fábula de Hollywood", ao passo que outros querem a experiência de viver em Nova Iorque enquanto mudam a sua vida.
‘Long shots’ e certezas
Apesar de reconhecer que "o cinema é uma ‘long shot’", expressão que designa uma tentativa com reduzida hipótese de êxito, Filipe Sá, de 19 anos, quer ir para Los Angeles. Inspirado por filmes de Martin Scorsese e de Ang Lee, conta com o apoio da família para aprender realização ou produção cinematográfica, sem deixar de ter interesse por cinematografia ou edição de imagem.
Dedicado à ilustração, "apesar de ser daltónico", Dimitrije Djordjevic teve a sua audição prejudicada por motivos técnicos, mas nem isso desanimou o sérvio, de 23 anos, que quer "fazer um bocado de tudo". Ficou com o contacto da diretora de Programas Internacionais da NYFA e espera nova oportunidade.
Para Diogo Cunha, que aos 25 anos já terminou o curso de Som e Imagem na Universidade Católica, Nova Iorque ou Los Angeles são a próxima paragem. "Já tenho dinheiro amealhado e irei arranjar mais trabalhando enquanto estou a estudar fora", explica à ‘Domingo’, ainda que a ajuda da família e a candidatura a uma bolsa estejam no seu horizonte.
Admirador dos realizadores Steven Spielberg e George A. Romero - "sou muito ligado à fantasia e ao cinema de terror", diz -, e disposto a aproveitar oportunidades de singrar na sétima arte onde quer que as encontre, "mesmo no Camboja", é em Hollywood que espera ficar depois do curso, pois é nesse cinema que se revê. Importante, no entanto, é tentar: "Posso não dar em nada, mas se souber que corri atrás do meu sonho já posso morrer descansado".
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