Merz muda posição e apoia uso de bens congelados russos para financiar a guerra da Ucrânia
Segundo o chefe do governo alemão, poderá ser desbloqueado um empréstimo de 140 mil milhões de euros a Kiev e demonstrar "perseverança" contra a Rússia.
O chanceler alemão, Friedrich Merz, mudou de posição e apoia agora o uso dos bens congelados russos para financiar o esforço de guerra da Ucrânia, em relação ao qual se mostrara relutante.
Num artigo esta quinta-feira publicado no diário internacional em língua inglesa Financial Times, Merz argumentou que a medida poderá desbloquear um empréstimo de 140.000 milhões de euros a Kiev e demonstrar "perseverança" contra a agressão russa.
Segundo o chefe do Governo alemão, a União Europeia (UE) poderá disponibilizar à Ucrânia um empréstimo sem juros, "sem interferir nos direitos de propriedade" e que "só seria reembolsado depois de a Rússia ter compensado a Ucrânia pelos danos causados durante esta guerra", iniciada em fevereiro de 2022 com a invasão russa do país vizinho.
Numa acentuada rutura com o ceticismo anterior de Berlim em relação ao uso de ativos russos apreendidos, Merz afirmou que tal empréstimo deverá servir para financiar equipamento militar e não para cobrir o orçamento geral da Ucrânia.
"Um programa tão abrangente deve também ajudar a fortalecer e expandir a indústria europeia de defesa", escreveu.
Os Governos da UE decidiriam, na sua opinião, as aquisições em conjunto com Kiev.
E o empréstimo seria inicialmente garantido pelos Estados-membros, antes de ser patrocinado com dinheiro do próximo orçamento plurianual da UE.
Defendeu igualmente que tal mecanismo deveria ser aprovado por uma "larga maioria" dos Estados-membros da UE, numa velada alusão a um possível veto de países como a Hungria.
No seu artigo, o político conservador alemão considerou que o bloco comunitário europeu deve encontrar um mecanismo legal para utilizar os bens congelados russos, porque é necessário "aumentar de forma sistemática e maciça os custos da agressão russa" para o Kremlin.
Berlim já anteriormente havia expressado preocupação com as implicações que o uso dos ativos russos congelados - quase 200 mil milhões de euros na UE - poderia ter, do ponto de vista jurídico.
A reviravolta de Merz, que governa a maior economia europeia e o país europeu que mais apoio financeiro e militar prestou à Ucrânia, ocorre no momento em que a Comissão Europeia analisa opções para aproveitar os 194 mil milhões de euros em bens russos retidos na Euroclear, no banco estatal de depósitos da Bélgica.
A presidência dinamarquesa do Conselho da UE espera que a proposta detalhada da Comissão seja apresentada em outubro.
A UE já utiliza os juros gerados pelos bens congelados para financiar empréstimos à Ucrânia acordados no âmbito do G7 (grupo dos sete países mais industrializados do mundo, constituído por: Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido, embora a UE também esteja representada), num total de 45 mil milhões de euros, dos quais o bloco comunitário contribuirá com cerca de 18 mil milhões, graças a esses rendimentos (entre 2,5 e 3 mil milhões por ano), mas até agora não quis confiscar o dinheiro propriamente dito.
O contexto desta mudança na posição de Berlim prende-se também com o facto de o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ter reduzido o apoio norte-americano a Kiev e resistir em impor novas sanções a Moscovo.
"Agora, defendo a mobilização de recursos financeiros numa escala que garanta a resistência militar da Ucrânia durante vários anos", escreveu Merz no Financial Times.
Esta quinta-feira, numa conferência de imprensa na cidade de Weimar, no leste da Alemanha, o chanceler sublinhou também que os países aliados não permitirão que continuem a ocorrer violações do espaço aéreo com caças e drones (aeronaves não-tripuladas) russos, como as efetuadas nos últimos dias e semanas pela Rússia.
Merz classificou-os como "incidentes que devem ser levados muito a sério", referindo-se à entrada de um avião de combate russo no espaço aéreo da Estónia, na sexta-feira passada, e a outros acontecimentos semelhantes.
"Repetidamente, há violações do espaço aéreo, há sobrevoos, há voos de drones, há tentativas de vigilância", enumerou, acrescentando que, no fim de semana passado, pediu ao seu ministro da Defesa, Boris Pistorius, que se coordenasse com a NATO (Organização do Tratado do Atântico-Norte, bloco de defesa ocidental) e, sobretudo, com os homólogos da Polónia, França e Reino Unido sobre uma possível reação.
"Não permitiremos que estas intrusões continuem a ocorrer e tomaremos todas as medidas necessárias para ter uma dissuasão eficaz também contra estas violações do espaço aéreo, contra estas intrusões do Exército, para as impedir", afirmou o chefe do Governo alemão.
Esta semana, por duas vezes, vários aeroportos dinamarqueses tiveram de suspender o tráfego aéreo ao detetar a presença de drones, cuja ligação à Rússia as autoridades não afirmaram explicitamente, embora tenham dado a entender as suas suspeitas quanto a tal.
Na quarta-feira, Pistorius afirmou no Bundestag (câmara baixa do parlamento alemão) que um caça russo sobrevoou recentemente uma fragata alemã no mar Báltico, no que classificou como uma tentativa de provocação por parte de Moscovo.
O ministro da Defesa alemão indicou que, nas últimas semanas, a Europa experimentou "repetidamente como a guerra e a situação de ameaça são reais" para o continente, mas instou os Estados europeus a "não caírem" nas provocações que atribuiu ao Presidente russo, Vladimir Putin.
"Putin quer provocar os Estados-membros da NATO e quer identificar, expor e explorar os seus supostos pontos fracos", sustentou Pistorius, reiterando mais uma vez que a resposta dos aliados deve ser firme e unida, mas também contida.
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