Corpos dos pequenos Kfir e Ariel foram entregues esta quinta-feira a Israel. Yarden Bibas foi libertado pelo Hamas a 1 de fevereiro.
Corpos dos pequenos Kfir e Ariel foram entregues esta quinta-feira a Israel. Yarden Bibas foi libertado pelo Hamas a 1 de fevereiro.
Naquela manhã de 7 de outubro de 2023, que prometia nascer tranquila, é provável que os pequenos Kfir e Ariel ainda dormissem um sono descansado quando o sol rompeu. Tal como os pais, Yarden e Shiri Bibas. Mas aquele amanhecer, que prometia ser como tantos outros, haveria de se tornar o mais sangrento desde que há memória na relação conturbada entre palestinianos e israelitas. Na maior incursão militar por terra, mar e ar, os guerrilheiros do Hamas ousaram romper, de surpresa e com resistência mínima, a robusta cerca metálica e os muros que separam a Faixa de Gaza dos povoados israelitas no deserto do Negueve, a sul de Israel.
Quis o macabro destino que a casa do pequeno Kfir, então com 9 meses, de Ariel, de 4 anos, e dos pais Yarden e Shiri, no pacato ‘kibutz’ Nir Oz, a uns perigosos mil metros de Gaza, fossem dos primeiros a serem atacados naquela manhã de infâmia. Foram os quatro raptados, com outros vizinhos. Muitos foram mortos à queima-roupa.
A família Bibas tornou-se, assim, uma espécie de símbolo de uma Israel ferida de morte e no orgulho, personificando a maldade do ataque de 2023, mas também a esperança de todas as famílias dos reféns – e da maioria dos israelitas – na libertação dos que se encontram nas masmorras do Hamas. Até que se conheceu o mais triste dos desfechos. Os cadáveres de Ariel e Kfir foram entregues esta quinta-feira às Forças de Defesa de Israel. A esperança de milhares de israelitas morreu com a entrega.
Acreditava-se que o Hamas tinha entregado o corpo de Shiri juntamente com as crianças mas ao final do dia, após os primeiros testes forenses, Israel negou tratar-se da mulher.
A família Bibas foi raptada em casa, no ‘kibutz’ Nir Oz, localizado junto da linha fronteiriça de Gaza, a cerca de 40 quilómetros da cidade de Bersebá. Kfir e Ariel foram considerados os mais jovens reféns feitos pelo Hamas a 7 de outubro. Quando foi levado pelos combatentes do movimento armado radical palestiniano, Kfir tinha 9 meses. Se fosse vivo teria hoje mais de 2 anos. Até ser revelado quando morreu, não saberemos se passou mais tempo da sua vida em cativeiro do que em liberdade. Ariel, que partilha com o irmão um iconográfico cabelo ruivo, tinha 4 anos quando foi levado para o enclave palestiniano.
Da bicicleta à bola de futebol de Portugal: a casa de onde a família Bibas foi raptada pelo Hamas
Quem ficou com quem?
Desde o início da guerra em Gaza, pelo menos 47 mil mortos palestinianos, 70% dos quais mulheres e crianças, foram mortos e o pequeno território encravado em Israel foi transformado num imenso mar de escombros, em que ninguém sabe ao certo quem ficou com os cerca de 250 israelitas feitos reféns. A ofensiva de 7 de outubro matou mil e duzentas pessoas em território israelita, os reféns foram distribuídos por vários grupos armados satélites do Hamas, o que complicou ainda mais as operações de localização e resgate. Ninguém sabe ao certo quem ficou com quem e isso também ajuda a explicar a ineficácia de Israel na recuperação não negociada dos raptados até ao último cessar-fogo.
O exército israelita tem por certo que Yarden foi separado da mulher e dos filhos logo após o rapto. Vídeos apreendidos pelos israelitas após a tomada de alguns túneis, onde o Hamas se refugia em Gaza, permitiram concluir que Shiri e os filhos teriam sido levados para Khan Yunis no dia do assalto a Israel e, posteriormente, entregues a uma fação palestiniana conhecida como ‘Kataib Mujahidin’. As imagens mostravam Shiri em claro sofrimento com o filho bebé a ser seguida por Ariel enquanto improvisava com um pano velho um véu para cobrir a cabeça.
Já em abril de 2024, outro vídeo resgatado pelos militares mostrava Yarden ensanguentado. Nenhuma outra imagem foi vista. A única certeza até agora é que a família Bibas entrou em Gaza separada, mas viva. E que Yarden Bibas foi libertado pelo Hamas no passado dia 1 de fevereiro sem saber ainda o que tinha acontecido ao resto da família. O fim da história foi sempre incerto.
Família e amigos mantiveram a esperança
Dana Silberman-Sitton, irmã de Shiri Bibas, foi a primeira dizer que a que a família não regressaria com vida a Israel. Mas a trégua anunciada em meados de janeiro e a libertação do primeiro grupo de reféns voltou a criar uma enorme expectativa no país quanto à libertação dos Bibas, apesar da interrogação permanente: seria possível voltar a ver a jovem família toda junta? Hila Shlomo acreditava que “se conseguirmos libertar a família, custe o que custar, é uma vitória da vida”. Não aconteceu. Hila tem 23 anos, é música. Como tantos outros ativistas israelitas, passa muito tempo num largo da avenida Shaul HaMelech, junto ao Museu de Arte de Telavive, transformada desde o início da guerra em ‘praça dos reféns’. Esperam, pacientemente, mas com críticas vigorosas contra Benjamin Netanyahu, cujo Governo acusam de não ter feito tudo o que seria possível para trazer os reféns de volta a casa.
Valor simbólico
Embora os nomes de Kfir, Ariel e Shiri tenham estado sempre na lista de reféns a libertar mediante acordo entre Israel e o Hamas, ninguém soube ao certo se a família estaria viva. Em novembro de 2023, a cúpula do Hamas anunciou que o bebé Kfir, o irmão Ariel e a mãe Shiri teriam sido mortos durante um bombardeamento das Forças de Defesa de Israel em Gaza, mas a informação não foi confirmada nem pelo exército judaico, nem pelas secretas israelitas. O Hamas sempre soube o valor simbólico desta família na opinião pública de Israel e, por isso, a sua morte tenha sido ocultada até agora porque, como diz Hila Shlomo, “imaginar que eles voltam para casa com vida traz muita alegria a todos”. Essa alegria não acontecerá.
Versão atualizada do texto originalmente publicado na revista Domingo do CM em 26 de janeiro de 2025
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