“A obrigação do Homem é deixar o Mundo melhor”: Francisco Pinto Balsemão foi o último imperador dos media
Fundador do PSD e antigo primeiro-ministro, pai do 'Expresso' e da SIC, defendia uma imprensa livre e independente de todos os poderes.
“A informação necessita de ser livre, funcionando ao lado, mas independentemente, dos governos, das igrejas, dos partidos políticos, dos grupos de pressão”. Em 1971, Francisco Pinto Balsemão mostrou à ditadura o que era o jornalismo em liberdade, publicando um livro. ‘Informar ou depender?’ saiu em resposta ao chumbo do projeto sobre a lei da impressa, que apresentou com Sá Carneiro. Partilhavam os ideais e a expectativa de que, como deputados da Ala Liberal e com Marcello Caetano (de quem tinha sido aluno), conseguiriam mudar o regime por dentro.
“Enganei-me e, como eu, enganaram-se outros companheiros meus. A partir daí entrei na política em part-time”, disse. A experiência foi um divisor de águas. A família desfez-se do ‘Diário Popular’ de que Balsemão tinha 16,6% por herança do pai. “Fiquei com 30 e tal mil contos. Aí podia ter deixado de trabalhar, de facto. Ou ficar com a advocacia sem ‘afición’. Fiz o Expresso [em 1973]”, afirmou. Entre os acionistas com menores participações estavam António Guterres e Marcelo Rebelo de Sousa. Regressou à política com a revolução e os primeiros passos para fundar o PPD foram dados logo a 26 de abril. Com a tragédia de Camarate, chegou a presidente do partido e a primeiro-ministro. "As teses, completamente estapafúrdias, de que eu, através de Kissinger e da CIA, sabia o que ia acontecer são falsas e insultuosas", referiu.
Esteve à frente do Governo entre 1981 e 1983, período em que promoveu uma revisão constitucional, a adesão de Portugal à CEE e em que sentiu que "o jornal andava a matar o pai, no sentido mais freudiano da palavra”.
O atual presidente da República (ver reações ao lado) dirigia então o Expresso e escreveu que o patrão era "lé-lé da cuca". Sobre essa altura, de resto, lamentou que a política o tenha obrigado "a ver o mundo e o País e as pessoas e os traidores de outra maneira". Em 1990, criou a Impresa e, em 1992, lançou o primeiro canal privado português, a SIC. "Vi Armstrong pisar a lua e a sonda Curiosity deslizar em Marte. Fui amplamente contemplado pela revolução digital. Beneficiei do 25 de Abril e contribui, na política, no jornalismo, no associativismo e, mais tarde, no ensino para que Portugal fosse uma democracia de padrão ocidental", reconheceu. Entusiasta da inovação, aceitou transformar o livro de memórias com recurso a inteligência artificial e descrevia-se ultimamente como 'podcaster'. Viveu 88 anos, até à última terça-feira, com um objetivo: "Hoje e sempre, a única obrigação moral que poderá ser exigida ao Homem, para que seja 'mais do que matéria físico-química', é que procure deixar o mundo onde nasceu, seja esta a Terra ou algo mais vasto, melhor do que o encontrou".
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