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Artigo exclusivo

Família de violadores responde por 331 crimes

Pais e filhos abusaram sexualmente das mulheres da família durante décadas, em Tomar.

11 de fevereiro de 2021 às 01:30

Denunciado o caso à Polícia Judiciária, este homem soube então que também dentro de portas o ciclo de violência se perpetuara. As filhas também eram abusadas pelo mesmo tio e por outro seu irmão que também mantinha contactos próximos com as crianças. Havia ainda o seu próprio pai, avô das meninas, que embora cego devido à diabetes, há pelo menos dez anos, ainda atacava as crianças. Obrigava a que se sentassem no seu colo, acariciava-as sexualmente, obrigava-as a fazerem-lhe o mesmo. Depois mandava-as calar e metia-lhes medo. Dizia que ninguém acreditaria nelas.

Quando a Judiciária chegou à casa e ouviu outros membros da família percebeu que havia ainda mais segredos enterrados. As filhas do violador mais velho - o patriarca da família - também tinham sido violadas. Eram três, fugiram de casa muito cedo, emigraram quando a vida lhes permitiu. Têm hoje mais de 50 anos e nunca apresentaram queixa.

A última vítima terá sido a cunhada deste homem. A irmã da mulher tinha apenas 16 anos quando foi atacada. Fugiu de casa, também há mais de meio século, já morreu, o crime prescreveu.

A acusação dá ainda conta de que há pelo menos duas vítimas de violência doméstica. A matriarca da família e a ex-mulher de um dos filhos violadores. O MP extrai certidão para investigação autónoma e alega que os prazos apertados para a dedução da acusação não permitem a recolha de indícios desse crime.

No mesmo despacho dá-se conta de que a contagem dos crimes foi feita por baixo. Ninguém sabe muito bem quantas vezes as meninas foram abusadas. Apenas que o foram durante anos e quase diariamente.

Matriarca perdoa marido e dois filhos

Numa casa carregada de imagens de Nossa Senhora, a matriarca da família falou ao CM sobre perdão. “Só Deus pode castigar”, garantiu, desabafos soltos sobre o castigo divino que chegou ainda em vida. “Ficou cego há dez anos por causa dos diabetes. Já teve um castigo, não merece mais.”

A mulher é uma das testemunhas arroladas pelo Ministério Público, mas ao CM já garantiu que se recusa a acusar o marido e os filhos em julgamento. “Eu sei lá se eles as violavam. Eu não vi”, continua a mulher, que na mesma entrevista reconhece ter-se apercebido dos ataques. “Uma vez tirei-lhe a mão de cima da mais nova. Mas não sei o que ele lhe ia fazer.”

A entrevista a esta vítima foi feita pouco depois da detenção dos agressores. Numa casa humilde, onde todos sabiam e todos calaram, a matriarca era uma mulher sozinha. As netas nunca mais apareceram, o filho que denunciou o pai e os irmãos afastou-se. Ela não sabia como continuar. “Ele agora até era bom para mim. Desde que ficou cego, nunca mais me bateu.”

Judiciária chocada com ‘normalização’ da violência sexual

A Polícia Judiciária de Leiria ficou chocada com a violência. A ‘normalização’ dos abusos, que permitiu que se perpetuassem durante décadas, surpreendeu até os investigadores, que nunca se tinham deparado com um caso destas dimensões. Designadamente porque os comportamentos abusivos passaram de pai para filhos e todos calaram as violações que ocorriam na casa.

PORMENORES

Meninas já ouvidas

As vítimas mais velhas foram já ouvidas para memória futura. A mais pequena, por ter apenas quatro anos, não será inquirida em tribunal. A prova será feita pelo depoimento dos outros familiares.

Quatro testemunhas

Poderá ser um julgamento feito em tempo recorde. O Ministério Público arrolou apenas quatro testemunhas. São todos familiares e além da matriarca será chamado o irmão que denunciou os abusos.

Comunidade sabia

O CM esteve na pequena aldeia, onde todos sabiam do ciclo de violência naquela casa. As agressões eram aliás frequentes e durante anos viram a matriarca fugir para a rua e pedir ajuda. Nunca foi apresentada queixa.

Meninas vivem perto

As menores que foram abusadas continuam a morar na mesma aldeia, muito perto da casa onde se encontra a avó. Após a detenção dos suspeitos não houve qualquer acompanhamento psicológico para ajudar estas crianças a superar o trauma e a lidar com o facto de a comunidade saber o que durante anos lhes aconteceu.

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