Já todas as Marchas Populares de Lisboa 2002 se mostraram ao público alfacinha. No sábado à noite, na alcatifa do Pavilhão Atlântico, exibiram-se as últimas seis e estão conhecidos os argumentos de cada uma, capazes ou não de cativar os lisboetas e demais fãs da tradição.
O Correio da Manhã ouviu uma mão cheia de opiniões e preferências e ficou a saber que a Mouraria foi uma agradável revelação e, os Olivais, Castelo, Marvila e Madragoa tiveram o condão de surpreender. Falta conhecer o veredicto do júri, o que acontecerá depois do desfile na Avenida da Liberdade, na noite de Santo António, quarta-feira. Nessa altura a festa das marchas ficará completa e o grande vencedor será como sempre: Lisboa. E nós lá estaremos para lhe contar tudo.
De roxo, azul, preto e branco vestidos surgiram com marcações tradicionais. Abriram com a velha marcha de Benfica, que pôs o público a cantar: "Olha a marcha de Benfica..." Os pares a passar por baixo dos arcos fizeram lembrar, o que de mais genuíno tem a festa lisboeta, trazendo à memória o "Pátio das Cantigas" e os imortais Vasco Santana e Beatriz Costa. Foram alargando as marcações a todo o espaço do pavilhão.
Os arcos mostravam as fachadas das velhas casas da cidade e os balões que o grupo apresentou, a seguir, divertiram a assistência, quase fazendo esquecer um compasso de espera que a marcha fez na sua actuação. Pequena mas entusiasta, a claque ainda viu com alegria os pares a dançar no arraial antes de deixarem o recinto.
O pavilhão viveu momentos de suspense antes da entrada desta marcha, a detentora do título de campeã. A claque, situada a um canto, fez-se ouvir, mas talvez com menos exuberância que em outras ocasiões. Tinham prometido contar uma história aos quadradinhos toda em azulejo. Os arcos demonstravam isso mesmo, a imitar vários ex-libris de Lisboa, sob a forma desses quadrados mágicos. O ensaiador Buechieri tinha exigido muito às raparigas do bairro, com marcações vivas, imaginativas e exigentes.
Elas responderam bem. Desmultiplicaram os arcos e continuaram a dançar sempre ao mesmo ritmo. Depois, rapazes e raparigas desfilaram com objectos diferentes na mão e cada um deles lembrava uma antiga profissão da cidade. Desfolharam um livro gigante com painéis em azulejo a que nem sequer Santo António escapou.
"Está boa! Está gira!", comentava no final um assistente.
A rainha das marchas tinha prometido surpreender e assim aconteceu. Desta vez os pescadores e varinas não se apresentaram descalços. Apareceram vestidos com o seu fato domingueiro, apesar de ser gente pobre e humilde. Foi isso que o ensaiador Mário Valejo quis provar. Resta saber se o júri entende!
Os homens seguravam arcos em forma de barcos, enquanto as mulheres desfilaram com bolas de sete cores que representavam os valores do bairro: o amarelo do Sol; o branco da pureza; o preto da cerimónia e do dó; o rosa do amor; o azul do céu; o verde do mar e o laranja da comida.
Mostraram os arraiais da gente do mar e, sempre com a claque a apoiar, confirmaram que as voltas do vira só eles as sabem dar. Divertiram-se e marcharam de uma forma solene, deliciando a assistência, que ficou deveras surpreendida, como confirma a expressão de Natália Antunes: "Isto é que eu não esperava. Estamos sempre a aprender!"
A claque do bairro anunciou a entrada da marcha daquele bairro, aos gritos: "Móraria! Móraria!" Eufóricos e de balões verdes na mão fizeram a festa ao acompanhar a música com palmas ritmadas. Arcos (manjericos e guitarras) mais bonitos não tinham sido vistos até então. Aquilo é genuinamente popular. Manjericos gigantes só rivalizavam com as saias das raparigas. Incansáveis, os marchantes surgiram depois a dançar com raça, só ao alcance dos predestinados, daqueles que sentem as cores do bairro que defendem.
A marcha teve o mérito de saber ocupar o recinto, como nenhuma outra, e sempre debaixo de aplausos terminaram a cantar e a dançar com vigor a marcha de Lisboa. O ensaiador, Reinaldo Ventura, conseguiu provar que na Mouraria não há só fado! "Isto são os Santos Populares!", exclamava satisfeito Artur Moreira, que confessou nem sequer ser do bairro.
Reluziu à custa de dourados e prateados dos arcos e guarda-roupa. A luz acabou por iluminar a actuação do grupo. Um minuto de silêncio foi, depois, prestado pelos marchantes como homenagem a Maria Teresa, uma mulher que muito deu às marchas da capital, falecida recentemente. Prosseguiram a actuação com a alegria e jovialidade próprias de quem está comprometido com os ideais da cidade.
Gingaram as raparigas do bairro como há muito não se via. A lua foi enchendo na noite mágica de Junho com a claque sempre a apoiar com entusiasmo. Dos arcos saiu fogo-de-artifício que acabou por dar luz a um pequeno trecho de ilusionismo, que haveria de descobrir o casal mais bonito lá do bairro.
Um grupo digno do respeito de todos. Do princípio ao fim deram as voltinhas que uma marcha deve dar. Com os arcos a condizer com o guarda-roupa, onde o azul predominava (foi a cor da moda este ano) marcaram a actuação com um ritmo certo. As raparigas tentaram sempre algo mais, mas terá faltado ousadia para dar o passo em frente. A marcha mostrou que sabe fazer da religião uma festa do espírito.
Sempre a dançar com fulgor q.b. divertiram-se, alegraram os seus apaniguados e os lisboetas mais atentos à tradição da cidade. Do recinto saiu um grito de "Avé Maria" sentido, que na bancada não evitou uma exclamação da Clarisse de mãos postas ao alto: "Meu Deus, isto é tão surpreendente!"
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