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Revolta no Largo da Feira

Hugo Filipe, ainda no ventre da mãe e com nascimento previsto para o início deste mês, deverá passar os primeiros dias de vida “ao ar livre” junto aos Paços do Concelho de Olhão.

02 de janeiro de 2008 às 00:00

Quem o garante é a mãe, Sónia Chaves, uma de vários moradores no Largo da Feira, em Olhão, que não foi contemplada pelo plano de realojamento da edilidade, o qual deu casa nova a 153 moradores nas barracas deste bairro problemático da cidade, que agora vai ser completamente demolido.

“Habito uma barraca, com quatro divisões, com a minha mãe, o meu marido, quatro filhos, uma sobrinha e um irmão, e tinha a promessa da Câmara de que ia ser realojada numa casa nova”, explica Sónia Chaves, que ficou frustrada quando “só deram uma casa, com três quartos, à minha mãe, para as dez pessoas que vão passar a constituir a nossa família”.

Sónia afirma que não se vai mudar “para a casa nova” e garante que quando deitarem a barraca abaixo “vamos todos para a porta da Câmara, porque os serviços camarários dizem que até final do ano cortavam a água e a luz ao bairro”.

Queixas reiteradas por outros moradores como Ana Palma, que vive com os dois filhos, um deles deficiente, numa casa arrendada só com um quarto e cozinha. “Não me deram casa, e sei que houve casos menos dramáticos que o meu que foram contemplados”, acusa.

A jovem Márcia Correia, de 22 anos, vivia numa barraca com os pais, o marido e os dois filhos, de 6 e 5 anos, um deles deficiente. “Gastei as minhas economias a construir um anexo no quintal da barraca e agora vão demolir tudo e não me dão casa nova”,, afirma, revoltada por “não haver espaço na nova casa para o agregado familiar”.

Também a viúva Maria Jesus, de 43 anos, não se conforma por ter ficado excluída do realojamento. “Moro há 27 anos no bairro, numa barraca, com o pai, dois filhos, de 13 e 16 anos, irmão e quatro sobrinhos, e não me deram casa quando sabemos que foram realojadas pessoas que não viviam no bairro”, afirma.

PAI NATAL 'OFERECEU' CASAS NOVAS

A Câmara Municipal de Olhão entregou, antes do Natal, 168 casas de habitação a igual número de famílias carenciadas do concelho. Em Janeiro vão ser entregues 18 casas na Fuzeta e outras tantas em Moncarapacho, perfazendo um total de 204 habitações. A maior parte dessas habitações foram entregues aos 153 moradores do Largo da Feira, o que vai permitir a demolição do bairro. O presidente da Câmara de Olhão, na cerimónia de entrega das chaves, que decorreu no pavilhão municipal, salientou o “empenho pessoal do primeiro- -ministro, José Sócrates”, que permitiu o desbloqueamento do processo. “As casas já estavam prontas há meses mas o Instituto Nacional de Habitação, por dificuldades financeiras, estava a adiar as escrituras das casas”, afirmou Francisco Leal.

"TODA A GENTE FOI REALOJADA"

Francisco Leal, presidente da Câmara Municipal de Olhão, diz estar “orgulhoso e emocionado” pelo realojamento dos 153 agregados familiares do Largo da Feira e garante que “toda a gente foi realojada”. Respondendo às críticas de alguns moradores, o autarca explica que “não havia possibilidade de dar casas novas aos titulares das casas velhas e também aos seus descendentes”, mas garante que “houve o cuidado de, nos casos de agregados familiares grandes, disponibilizar casas novas com tipologias maiores”. O edil de Olhão não aceita as críticas e alerta para os casos em que “oportunistas foram viver para o Largo da Feira, muito recentemente, quando souberam que a edilidade iria realojar os moradores”, afirmando que “o executivo não poderia pactuar com essas situações, bem identificadas pelos serviços”.

Francisco Leal garante que as demolições das 153 barracas vão continuar, mas “vamos ter em conta casos específicos de pessoas que necessitam de algum tempo para arranjar casa, deixando-os para o final”. O autarca classifica esta intervenção como “o momento mais gratificante” da sua carreira política.

PROBLEMAS

O Largo da Feira foi, durante muitos anos, um bairro problemático de Olhão. Apesar de ter melhorado a imagem nos últimos tempos, foi durante muitos anos o local escolhido para a compra de estupefacientes e palco de vários actos de violência urbana.

LIMPEZA

A demolição das 153 barracas do Bairro, que deverá estar pronta até ao final de Janeiro, vai permitir a requalificação daquela zona da cidade. Para já o local vai ficar limpo, à espera de um plano de requalificação que está a ser estudado pela edilidade.

HOTEL

Junto ao Bairro está a ser erigido um hotel de luxo e um ‘resort’ de apartamentos. Com a ‘limpeza’ do Largo da Feira e esta construção hoteleira de grande dimensão, junto à nova marina, a zona norte de Olhão, actualmente degradada, passará a ser zona nobre da cidade.

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