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Vítimas de Pedrógão Grande recordam “verdadeiro holocausto”

Para as vítimas “é preciso união de vontade e uma força motriz inabalável”.

18 de junho de 2019 às 11:06

A presidente da Associação de Vítimas do Incêndio de Pedrógão Grande (AVIPG), Nádia Piazza, comparou ontem os incêndios de 2017 a um "verdadeiro holocausto", manifestando apreensão "em relação ao que já foi feito e ao que falta fazer". "Não haverá mais holocaustos, todos assim o desejamos. Mas desejar já não basta neste caso. É preciso união de vontade e uma força motriz inabalável. E isso está longe de acontecer", afirmou.

No dia em que se cumpriram dois anos do incêndio de Pedrógão Grande, que causou 66 mortos e 254 feridos, foi assinado um protocolo de entendimento entre a AVIPG e a Infraestruturas de Portugal, tendo em vista a construção de um memorial em homenagem às vítimas dos incêndios florestais em Portugal em 2017.

Da autoria do arquiteto Eduardo Souto Moura, que ofereceu o projeto, o memorial vai ser construído junto ao quilómetro 7,7 da EN236, onde morreram 47 pessoas e muitas outras ficaram feridas. O custo e o prazo não foram revelados.

O autor contou que pretendeu fazer um "desenho simples, que não seja pretensioso", de uma balsa alimentada por uma fonte. "A água como purificação é um elemento transversal em todas as culturas e religiões."

Ora, a balsa de água desenhada tem "duplas funções de evocar o Renascimento, que pensamos que vai acontecer e, se houver outro incêndio, os bombeiros têm onde ir buscar água", explicou o arquiteto.

"A morte humilha-nos. É uma ofensa à liberdade"

As vítimas do incêndio de Pedrógão Grande foram ontem recordadas numa missa em sua memória, que se realizou na Igreja Matriz de Castanheira de Pera e contou com a presença dos Presidente da República e da Assembleia da República, primeiro-ministro e vários ministros e secretários de Estado, entre outros.

Na homilia, o padre Pedro Miranda, vigário-geral da diocese de Coimbra, recordou conversas que manteve com paroquianos que disseram ter visto "a morte à frente" durante o incêndio.

"A morte é uma ofensa à nossa liberdade, humilha-nos", disse o sacerdote, frisando que "o sentido da morte é o sentido que dermos à vida", quer se trate de uma morte considerada natural e expectável, como uma morte trágica, como as que ocorreram em Pedrógão Grande, durante o incêndio de junho de 2017.

O padre Pedro Miranda disse que "não foi Deus que criou a humilhação da morte. Deus é mais forte do que a morte", salientando que "nós somos o único ser vivo que se confronta com a morte, encontramos naquele acontecimento a semente para dar sentido à vida".

Entre as pessoas que assistiam à missa estavam muitos que ainda estão a recuperar das lesões causadas pelas chamas. São disso exemplo os que sofreram queimaduras graves, que ainda necessitam de cuidados médicos quase diários.

"O que todos precisamos é de paz e de condições para fazermos o luto, porque estes dois anos foram muito controversos e ainda não alcançámos a paz que precisamos", disse ontem ao CM Dina Duarte, moradora em Nodeirinho, a aldeia onde se registaram mais vítimas mortais e onde alguns se salvaram num tanque de água.

Combate não resolve causas profundas

"As causas profundas" dos incêndios "nunca serão resolvidas a partir dos meios de combate", mas sim com a revitalização do território e com a conclusão da reforma da floresta, disse ontem o primeiro- -ministro, António Costa, em Castanheira de Pera, adiantando que este ano as medidas de prevenção representam 46% do custo total, enquanto que em 2017 chegavam aos 80%.

"Temos o dever de memória"

O primeiro-ministro disse que o ano de 2017 foi "particularmente trágico" e prometeu "nunca mais esquecer, para nunca mais voltar a acontecer". "Todos temos o dever de memória" e "ninguém nos perdoará alguma vez se não fizermos tudo aquilo que está ao nosso alcance".

PORMENORES

Avaliação rigorosa

O Centro de Estudos e Intervenção em Proteção Civil defendeu ontem "uma avaliação rigorosa, técnica e política" sobre as alterações introduzidas no combate e na prevenção dos incêndios, dois anos depois dos fogos de Pedrógão Grande.

Sem engenheiro florestal

O município de Castanheira de Pera não tem engenheiro florestal há cerca de dois anos, lamentou ontem a presidente da autarquia, após a reunião com António Costa.

Investimento de 2 milhões

O programa de atração de novas empresas de pequena dimensão para os concelhos afetados pelo incêndio deve criar entre 25 e 30 postos de trabalho. O programa atraiu quase 20 projetos que representam um investimento superior a dois milhões de euros.

Expandir o cadastro

O ministro do Planeamento, Nelson de Souza, defendeu ontem que "é urgente" a aprovação por parte da Assembleia da República do diploma que pretende expandir o projeto-piloto do cadastro simplificado ao resto do País. A operação-piloto "correu bem, tem boas conclusões e agora importa disseminá-la".

Dia de dor

Ontem assinalou-se "um dia de dor" de algo que "nunca se poderá repetir", disse ontem o líder do partido Aliança, Santana Lopes, defendendo que "o País precisa de acordar e não ignorar este dia, que ficará na história pelos piores motivos".

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