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Um cordão que salva vidas

Poder "guardar um pouco de si que mais tarde nos poderá salvar a vida parece algo retirado de um filme de ficção científica, mas não é. É o futuro, que está já aí." As palavras são de Rui Reis, presidente da Sociedade Portuguesa de Células Estaminais e Terapias Celulares e director do Grupo de Investigação 3B’s da Universidade do Minho.<br/><br/>

13 de abril de 2008 às 00:30

Isabel Araújo concorda com o especialista. E tem razões para isso. Foi graças a um transplante de células estaminais presentes no sangue do cordão umbilical do filho mais velho, criopreservadas num banco privado, que Frederico, hoje com dois anos e três meses, conseguiu trocar as voltas a uma imunodeficiência combinada severa. A batalha contra um problema que provoca deficiências no sistema imunitário prossegue, mas hoje com 'outras defesas e outra qualidade de vi-da', garante a mãe.

Criopreservar o sangue do cordão umbilical – o mesmo é dizer congelá-lo a vinte graus negativos – já não é uma prática estranha para os portugueses. No ano passado milhares pagaram cerca de mil euros para a recolha, logo após o parto, do sangue do cordão, assim como a preservação, por um prazo máximo de vinte anos, das células estaminais dele retiradas. Isto porque, justifica Sílvia Martins, da Bebé Vida, 'cada vez mais os pais estão elucidados acerca das potencialidades e aplicações terapêuticas com células estaminais. A prova dessas potencialidades são as dezenas de transplantes feitos no Mundo para combater muitas doenças graves, como as leucemias.

No entanto, mantém-se a discussão sobre se as aplicações actuais justificam ou não o armazenamento. Rui Reis confirma que são muitas as doenças que podem ser combatidas com estas células e o leque de aplicações futuras não pára de se alargar. 'Espera-se que um dia seja possível trataroutros tipos de doenças, como Parkinson, Alzheimer, diabetes crónicos, esclerose múltipla, enfartes do miocárdio ou outras que ainda não têm cura.'

À ESPERA DO PÚBLICO

Portugal não tem um banco público que armazene as células estaminais do cordão sem custos para os pais. Uma ideia defendida por todos – empresas privadas e especialistas. 'Nos Estados Unidos há mesmo parceiras público-privadas', refere Luís Gomes, da Crioestaminal, a primeira empresa em Portugal a oferecer o serviço de criopreservação. 'São dois conceitos diferentes mas quesecomplementam', acrescenta.

RuiReisdefendeas vantagensdeambos.'Num banco público temos de esperar que haja disponibilidade e que existam células compatíveis. Se tivermos as células num banco privado sabemos que são nossas e por isso há uma maior probabilidade de serem recebidas pelo organismo.' Mas, acrescenta, 'é necessário que essas terapias estejam disponíveis para toda a população e não só para alguns privilegiados'.

IPO DO PORTO QUER BANCO

Quatro anos depois do primeiro transplante com células estaminais do sangue do cordão umbilical começaram a surgir os bancos que armazenam estas células. Estados Unidos (Nova Iorque), França (Paris), Itália (Milão) e Alemanha (Dusseldorf) foram os países pioneiros. De início, a grande maioria do armazenamento era feita com dádivas para o uso de quem precisasse, mas o número de bancos privados tem vindo a crescer. Em Portugal, ainda não existe um banco público, mas vontade não falta ao IPO do Porto, que juntamente com o Centro de Histocompatibilidade formalizou um pedido para a criação do Lusocord.

PRIMEIRO TRANSPLANTE

Foi em 1988 que uma equipa de cientistas franceses e norte-americanos realizouo primeiro transplante de células estaminais com sangue do cordão umbilical.

DOENÇAS TRATÁVEIS

LEUCEMIA LINFÓIDE AGUDA

É a forma mais frequente de cancro nas crianças.

LEUCEMIA MIELÓIDE AGUDA

Representa 50% dos casos de leucemia em jovens e adultos jovens.

LINFOMAS

Tumores do sistema linfático, dois grupos: Hodgkin ou não Hodgkin.

SÍNDROMA DE HURLER

Doença genética que afecta uma em cada 400 mil pessoas.

TUMORES SÓLIDOS

Neuroblastoma (sistema nervoso simpático), retinoblastoma (ocular).

ANEMIA DAS CÉLULAS FALCIFORMES

Doença que envolve uma proteína essencial, a hemoglobina.

TALASSÉMIA

Problema de sangue, hereditário, um tipo de anemia.

ANEMIA APLÁSTICA ADQUIRIDA

Surge com a impossibilidade de a medula produzir células sanguíneas.

SÍNDROMA DE WISKOTT ALDRICH

Provocada pela pouca produção de imunoglobina M (IhM).

SÍNDROMA DE SHWACHMAN-DIAMOND

Desordem genética rara que afecta vários órgãos.

NOTAS

POUCAS CÉLULAS

As células estaminais do sangue do cordão umbilical são usadas para o tratamento de crianças pequenas porque, explica Rui Reis, da Sociedade Portuguesa de Células Estaminais e Terapias Celulares, 'são necessárias cerca de três milhões de células por cada quilo de peso. É óbvio que não se consegue reunir essa quantidade de células para tratar um adulto'.

ARMAZENAMENTO

Duas décadas é o prazo actual de armazenamento possível. No entanto, avança Rui Reis, 'ninguém garante que daqui a dez anos não se possa armazenar células durante mais tempo.Não há nenhuma indicaçãocientífica em contrário.'

 

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