Programas de talentos podem abrir portas a adultos e crianças mas também gerar estados de ansiedade e depressão, dizem especialistas.
David Gomes, o menino de 12 anos que sonha ser cantor profissional, foi o grande vencedor da finalíssima de ‘Uma Canção Para Ti’ (TVI) e prepara já os seus primeiros concertos. Os 25 mil euros de prémio do concurso de talentos deverão ser para investir na sua formação musical, assegurou a avó, Ana Maria Saraiva. E muito do público votante vai esperar para seguir o rasto deste talento de palmo e meio que Luís Jardim quer apadrinhar. O conhecido produtor madeirense e também um dos jurados do concurso ofereceu formação a David Gomes na sua futura escola de música. Mas até lá, e durante algumas semanas, a criança vai ter de enfrentar a popularidade e tudo o que a ela está associado. “O David está muito feliz por ter ganho o concurso mas é muito acanhado e fica nervoso por ser o centro das atenções. Nestas alturas só lhe apetece fugir. Na escola, sabendo disto, os colegas protegem-no muito”, diz à Correio TV a avó do grande finalista. Ana Maria Saraiva admite, inclusive, que a vida do neto vai ter uma grande mudança mas promete “minimizar” o impacto dessas alterações. “Vou tentar ajudar o David. Vou fazer com que as mudanças interfiram o menos possível na vida dele”, assegura.
Os concursos de talentos podem abrir portas a crianças e adultos mas também levar a estados de ansiedade ou depressão. Os psicólogos defendem o acompanhamento dos concorrentes por uma equipa de especialistas. “Qualquer pessoa, adulto ou criança, que vai ser exposta a uma situação para a qual não está preparada vai ficar deprimida”, explica à Correio TV o psicólogo social Luís Coural, que contesta a participação de crianças neste tipo de programas. “Penso que os pais não são bons para os filhos ao permitirem que eles desempenhem um papel para o qual não foram preparados”, sublinha. Já João Faria, psicólogo infantil, defende que “este tipo de concurso pode ser a oportunidade para as crianças seguirem um percurso que tem a ver com o seu talento”. E veja-se o caso de Miguel Guerreiro, o ‘rouxinol’ da TVI, vencedor da primeira edição de ‘Uma Canção Para Ti’. O menino lançou um disco, ‘Eu Quero Aquela Estrela’, que é já um sucesso e vai frequentar, no próximo ano lectivo, o Conservatório de Setúbal. Entretanto, o seu talento continua a ser ‘aproveitado’ pela TVI, que o quer ver a brilhar na temporada de Verão da série juvenil ‘Morangos com Açúcar’. “O Miguel era muito preguiçoso para ler, no entanto, desde que começou a ter de decorar os textos para os ‘Morangos’, passou a ter mais aproveitamento ao nível da leitura”, revela, entusiasmado, o pai de Miguel Guerreiro.
O psicólogo infantil João Faria explica: “Os concurso de talentos, ao desafiarem os recursos (estrutura) dos concorrentes, podem fragilizar quem tem maior dificuldade em lidar com a pressão das eliminatórias e a exposição mediática... A transição repentina de um dia-a-dia regular para uma rotina diferente pode conduzir ao desenvolvimento de algum tipo de patologia.” Neste contexto, os especialistas incluem também os concorrentes adultos. “Quando a expectativa sobre o desempenho é muito elevada há ruptura, como no caso de Susan Boyle [concorrente do programa de talentos britânico], que ao perceber que não ia ganhar entrou numa clínica com uma depressão”, refere Luís Coural. Susan Boyle, oriunda de uma aldeia da Escócia, viu a sua vida mudar bruscamente ao participar no ‘Britain’s Got Talent’. “Susan estava longe da família, entre estranhos, e isso começou a incomodá-la. Não soube gerir a pressão dos ‘media’ e o facto de ser conhecida em todo o Mundo. Ter perdido o concurso, para o qual tinha criado uma grande expectativa, deprimiu-a”, disse à imprensa britânica Steve, o irmão da escocesa. Apesar do desaire, em breve a amadora Susan Boyle cantará para o presidente norte-americano, Barack Obama, e acaba de assinar contrato com a agente dos U2, famoso grupo irlandês.
“A participação nestes concursos de talentos é um risco para adultos e crianças. Contudo, o adulto poderá ter mais estratégias [recursos] para lidar com estas situações”, diz João Faria. Já Luís Coural considera que “há miúdos que lidam melhor com a pressão – sendo treinados, obviamente – do que adultos sem preparação. E aqui recordo-me do ‘Zé Maria’, vencedor do primeiro ‘Big Brother’”. O alentejano não estava preparado para lidar com o mediatismo e adoeceu. Teve de ser internado e receber tratamento. Recentemente, teve nova recaída. Os especialistas consideram que estes programas deviam trabalhar com psicólogos. “Seria uma mais-valia se houvesse um técnico que avaliasse o impacto desta experiência nos concorrentes e interviesse no caso de identificar alguma fragilidade durante a situação de risco”, salienta João Faria. “Há uns anos, quando o ‘Big Brother’ começou em Espanha, estive num congresso e estava lá a equipa de psicólogos do programa, juntamente com a produção, a fazer uma comunicação sobre o acompanhamento que era feito aos participantes. Era uma equipa, para aí com dez psicólogos, que falou dos riscos inerentes de pôr as pessoas em situações para as quais não foram treinadas, tenham 20 ou dez anos”, recorda Luís Coural. O psicólogo chama ainda à atenção para os estudos que indicam que, “para ser-se bom numa área qualquer, o tempo médio de treino anda à volta das dez mil horas. As pessoas verdadeiramente qualificadas treinaram este tempo. Os Beatles só se tornaram uma banda importante porque treinaram muito. Mas não foi na garagem. Eles foram para Hamburgo, contratados para fazer espectáculos em bares, onde tocaram 12 a 14 horas durante dias a fio. Feitas as contas, vai dar às dez mil horas.”
Preparados ou não, os psicólogos consideram que há que estar atento aos sinais que podem indicar alguma patologia. “A perturbação mais típica nestas situações é a ansiedade. A exposição em público, a pressão da avaliação e dos atributos pessoais, produzem sintomas muito clássicos, como a dor de barriga, até a um conjunto de pensamentos negativos”, diz João Faria. O psicólogo explica ainda que uma outra forma de psicopatologia muito comum “é a depressão”, que pode ser desenvolvida por constrangimentos vários. “Os sinais são a fadiga e a falta de energia no caso dos adultos”, refere o psicólogo. Já nas crianças, “os sintomas depressivos são associados à agressividade”, explica. O tema dos efeitos nefastos do mediatismo nas crianças nos concursos de talentos – que cada vez mais proliferam nas televisões de todo o Mundo – levou os reguladores a reverem a legislação, por forma a proteger os interesses dos mais pequenos. No Reino Unido, a lei que regula a participação de crianças nestes formatos não era actualizada há 40 anos.
PERCURSOS: OS QUE TRIUNFARAM APÓS CONCURSO TELEVISIVO
Sara Tavares, Filipe Gonçalves, João Pedro Pais e Luciana Abreu singraram no mundo das canções após terem participado em concursos televisivos. ‘Chuva de Estrelas’, ‘Operação Triunfo’ e ‘Ídolos’ são formatos que deram uma oportunidade a muitos jovens. No entanto, nem todos conseguiram afirmar-se só através da música. É o caso de Filipe Gonçalves, que apesar dos concertos que vai realizando é também repórter na RTP 1, no programa ‘Isto Só Visto’. Também Luciana Abreu acabou por entregar-se às cantigas, à apresentação e representação. Sara Tavares faz carreira apenas a cantar.
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