Juan Krohn, o espanhol que em 1982 atacou João Paulo II em Fátima, diz que nunca o quis matar.
Entrevista originalmente publicada na Revista Domingo, do CM, em Maio de 2011.
Em 1982, João Paulo II estava em Fátima a agradecer ter escapado ao atentado do ano anterior, em Roma. A 13 de Maio, o padre espanhol Juan Krohn atacou-o em pleno Santuário, com um sabre de espingarda. Foi manietado e não chegou a atingir o Papa. Condenado a sete anos de prisão, cumpriu três anos e meio da pena em Portugal. Vive na Bélgica há cerca de 20 anos e diz-se um homem perseguido.
Em 1982 atacou o papa por considerar que este colaborava com os comunistas. Ainda mantém as críticas?
No fundo sim. Eu evoluí e o mundo também. Já passaram quase 30 anos e vivi muitas coisas, mas continuo a pensar da mesma forma. João Paulo II foi um actor político, era um cripto comunista como os que existiam nos anos 30, antes da II Guerra Mundial, e depois do conflito, na Polónia. Escrevi um artigo a que chamei ‘Karol Wojtyla, criatura de Wladislaw Gomulka', que foi uma figura muito popular na Polónia depois da Guerra. Descobri informações recentes que confirmam aquilo que eu já sabia: Karol Wojtyla é fruto de um acordo firmado nos anos de 1950 entre a igreja e o estado polaco, quando Gomulka era secretário-geral do partido comunista da Polónia. Ele acompanhou de perto a carreira eclesiástica de Karol, sobretudo nos anos em que ele foi cardeal em Cracóvia.
Arrepende-se do gesto que teve em 1982?
No fundo não me arrependo de nada porque eu não o queira matar. Fui condenado por um tribunal político, escandalizado por eu ter dito que queria matar João Paulo II. Um dos juízes que me condenou disse-o claramente - fui condenado por causa das minhas declarações. Mas eu não era um assassino e não o fui nunca. A justiça portuguesa tratou-me como o pior dos assassinos. Sempre fui uma pessoa normal, com posições e ideias próprias.
Qual era o seu objectivo ao atacar o papa com um sabre?
João Paulo II era um homem carismático e depois do atentado de 1981 transformou-se numa espécie de mártir em vida. O meu acto teve um impacto mundial e levou-me a ser conhecido em todo o mundo. Sofria com o ostracismo e o silêncio que nos era imposto. Mas fui mal interpretado e trataram-me como se eu fosse uma espécie de exibicionista.
O que fez quando terminou a sua pena de prisão?
Estive em França e Espanha e vim definitivamente para a Bélgica em Março de 1987.
Abandonou o sacerdócio na prisão. Continua a ser um homem de fé?
Ainda me considero católico, mas sou um católico sem igreja. O catolicismo, Espanha e Portugal são conceitos inseparáveis, nesse ponto não mudei. Nunca fui excomungado e o cardeal português Dom António Ribeiro até me propôs uma reconciliação eclesiática, mas não aceitei. Desde então que estou à margem de qualquer igreja. Mesmo em relação à minha família, estive numa situação de ruptura durante muitos anos.
O seu pai nunca lhe perdoou pelo ataque a João Paulo II...
Efectivamente, não nos reconciliámos. Vivemos uma situação de ruptura. Depois de ele morrer, fiz as pazes com o resto da minha família. Chorei muito, mas nunca consegui fazer o mesmo com o meu pai. Ele era um católico devoto do Papa e não foi possível. Para mim isso foi o aspecto mais dramático de tudo isto, mais até do que ter sido preso.
Casou-se entretanto e tem um filho. Ainda vive com a sua família?
Estou divorciado. Casei-me pelo civil com uma mulher flamenga e divorciei-me há muito tempo. Tenho um filho de 20 anos
O que faz neste momento?
Estou a preparar desde o ano passado uma tese de doutoramento, que me foi suspensa. Mas tenho tido problemas com professores da Universidade Livre de Bruxelas, por causa do meu passado. Faço a minha vida na biblioteca real, investigo e escrevo no meu blog. A minha tese de doutoramento é sobre literatura espanhola, estou a fazer um trabalho sobre o escritor Francisco Umbral e a guerra civil de Espanha
O seu objectivo é chegar a professor?
Espero lá chegar, apesar de já ter 61 anos. Gostaria de ter uma via profissional que me foi negada nestes mais de 25 anos desde que saí de Portugal. Sinto-me como um pária internacional
Ninguém esquece o que aconteceu em 1982?
Fui condenado a uma pena de sete anos de prisão [da qual cumpriu cerca de metade] mas na prática estou a cumprir uma pena de infâmia ‘sine die' por culpa do Papa Wojtyla. Porque eu atentei contra o homem mais santo do mundo e essa mancha persegue-me até hoje. Nos estado democráticos, as penas por infâmia não existem, mas foi o que me aconteceu. Há quem me veja como o demónio, como se eu fosse o maior assassino de todos os século, e isso pesa-me muito.
Alguma vez regressou a Portugal?
Estive em Portugal em 1993, para fazer uma entrevista para um canal de televisão espanhol. Estive em Lisboa e em Fátima, mas depois a reportagem não foi divulgada. Nunca mais voltei, mas gostaria de ver Lisboa, cidade de que gosto muito e que conheci em 1972.
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