Afinal não foi um urso que 'desfez' o corpo do ator. Foi um homem e está nomeado para o Óscar.
Leonardo DiCaprio está praticamente irreconhecível no último filme de Alejandro G. Iñarritu (‘Birdman’ e ‘Babel’), campeão das nomeações para os Óscares da Academia de Hollywood (12), vencedor do Globo de Ouro para categoria de Melhor Filme Dramático, e que nas salas portuguesas está a ter uma média de espetadores por sessão e por ecrã muito superior a todos os restantes filmes em exibição. Entre quinta-feira, 21, dia da estreia nacional, e domingo 24, ‘The Revenant: O Renascido’ foi o filme mais visto com um total de 73 418 espetadores e uma receita bruta de bilheteira de 404 885 euros.
Mas dizíamos que DiCaprio está irreconhecível. No filme de Iñarritu, o ator interpreta o papel do protagonista, Hugo Glass, o homem que integrou uma expedição de caça na década de 1820, no interior do território americano que ainda era habitado por tribos indígenas, e foi atacado por um urso que o deixou à beira da morte. Os companheiros de expedição abandonaram-no à morte mais provável, levando todos os seus pertences. Gravemente ferido, sem armas, equipamentos ou mantimentos, Glass não desistiu e iniciou uma luta desesperada pela sobrevivência, sustentada pela vontade de regressar a casa mas também pela sede de vingança. A história é inspirada em factos reais.
O ATAQUE
Voltemos ao selvagem ataque do urso. Foram necessárias cinco horas para o inglês Duncan Jarman deixar DiCaprio no estado em que o animal o deixa no filme – e que dura muito menos tempo.
O trabalho do artista de maquilhagem foi o de dar autenticidade às marcas das garras do urso no corpo do ator e para isso, Duncan chegou ao ponto do maníaco – procurou toda literatura disponível sobre o caso e sobre as feridas sofridas pelo verdadeiro Glass. Para que o efeito no grande ecrã fosse o mais próximo do que poderá ter realmente acontecido.
Hugo Glass (1783–1833), que nasceu na Pensilvânia, numa família de origem escocesa e irlandesa, tornou-se em adulto explorador e caçador nos territórios a montante do rio Missouri – aquilo que hoje em dia é o Montana e o Dakota e a área próxima do rio, no Nebrasca – e em 1823 juntou-se à expedição dos 100 homens do general Ashley para caçar animais por causa das suas peles. Acabou às garras de um Grizzly (urso pardo) que lhe esfacelou o corpo e é por isso que o filme exige que também o corpo de DiCaprio mostre a força brutal do ataque.
Duncan Jarman reproduziu o ataque no ator – um trabalho notável de paciência, antecedido por um dia de casting, em que a equipa tirou as medidas ao corpo do ator para poder fazer as próteses das marcas das garras, depois cobertas por maquilhagem, trabalho que valeu a nomeação para a Melhor Caracterização nos Óscares da Academia. O ataque do urso pardo ao caçador de peles – ironia selvagem – ficou no grande ecrã com uma notável verosimilhança. Se no dia 28 de fevereiro, DiCaprio vencer o Óscar de Melhor Ator será também – e se mais nada houver – um prémio para o trabalho de Duncan Jarman e da sua equipa.
Mas Jarman está nomeado e já o foi em várias outras ocasiões pela Academia de Hollywood pelo seu trabalho de caracterização. Trabalhos como ‘Harry Potter e os Talismãs da Morte: Parte 2’ (2011), ‘Grand Budapest Hotel’ (2014) e ‘O Último Samurai’ (2003) trouxeram o reconhecimento a um artista que geralmente fica anonimato e cujo trabalho passa desapercebido à maioria. Agora, com o filme do mexicano Alejandro G. Iñarritu está novamente para ser talvez chamado ao palco do Dolby Theatre na categoria de ‘Best Achievement in Make-up and Hairstyling’ (melhor trabalho de caracterização e cabelos) pelas melhores feridas que um urso fez a um homem no cinema. A imagem de Duncan a colocar em Leonardo DiCaprio, 41 anos, as próteses que simulam as feridas do ataque do Grizzly já foram vistas por mais de três milhões de pessoas no Imgur, um servidor de hospedagem de imagens.
TODOS COM GLASS
Depois da investigação a tudo o que foi escrito sobre a expedição dos ‘100 de Ashley’ – como ficou conhecida – e particularmente sobre o ataque do urso e a épica sobrevivência de Hugo Glass; trabalho que passou pela leitura de páginas de jornais e literatura popular impressas à época e tudo o que depois se produziu sobre o assunto, Duncan e a sua equipa acharam que precisavam de um dia de ‘live casting’ – como lhe chamaram – com DiCaprio para fazer os moldes das próteses. Através daquilo que foi escrito, tinham sabido que o verdadeiro Glass suportou as garras do urso pelo corpo todo e depois o perigo da gangrena de parte das feridas. O realismo era imprescindível ao sucesso do filme. A aplicação das próteses e finalização através de maquilhagem obrigou a que antes da gravação DiCaprio estivesse sentado na cadeira de Duncan James cinco horas.
A odisseia de Glass, que pode valer a DiCaprio um Óscar, inspirou muitos. Um monumento a Glass está hoje em dia no preciso local onde foi atacado pelo Grizzly, na Reserva de Shadehill, próximo do ‘Grand River’, grande rio como os americanos chamam ao Missouri, o maior dos EUA. Tem 3767 quilómetros. ‘The Song of Hugh Glass’ (1915) é a segunda parte dos poemas épicos de John G. Neihardt e o escritor Frederick Manfred narrou em ‘Lord Grizzly’ (1954) esta odisseia que lhe deu a nomeação para o National Book Award.
Em 1966, no episódio ‘Hugh Glass Meets the Bear’ (Hugo Glass encontra o urso) da série de TV ‘Death Valley Days’, o ator inglês John Alderson fazia do protagonista, bem como Richard Harris em ‘Man in the Wilderness’ (1971), claramente baseado na história.
Em 1975, Dewitt Lee fez de Glass numa adaptação mais ou menos livre no filme ‘Apache Blood’. Roger Zelazny e Gerald Hausman juntaram as vidas de John Colter (que fez parte de uma expedição em 1804–1806) e de Glass para escrever ‘Wilderness’, editado em 1994. E Michael Punke escreveu em 2002 ‘The Revenant’, uma interpretação do episódio. E em maio último, o documentário do Canal História ‘Tesla and the Unbreakable Glass’, narrava a construção do monumento a Glass, que atrás referimos.
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