Camiões carregados e escavadoras para achatar os cadáveres: como se escondia a "máquina da morte" na Síria?
Acredita-se que haja mais de 100 mil vítimas nas valas comuns. Organizações pedem que envolvidos nos crimes sejam punidos.
Durante os 13 anos de governo de Bashar al-Assad, o segredo da "máquina da morte" do regime sírio foi escondido em valas comuns espalhadas pelo país. Acredita-se que haja mais de 100 mil corpos de vítimas da ditadura de Assad escondidos. Os pormenores de como os cadáveres foram acondicionados estão a chocar a comunidade internacional, que pede que os envolvidos sejam responsabilizados por crimes de guerra.
Uma das maiores valas comuns já identificadas situa-se em Qutayfah, a cerca de 40 quilómetros de Damasco, capital da Síria. Esta conta com trincheiras de seis a sete metros de profundidade, três a quatro metros de largura e entre 50 a 150 metros de comprimento.
De acordo com relatos de testemunhas, a que a CNN teve acesso, quatro vezes por semana chegavam a Qatayfah camiões carregados com centenas de corpos.
"Os cadáveres só podiam ser identificados pelos números gravados no peito ou na testa e apresentavam sinais graves de tortura e mutilação”, apontou Mouaz Moustafa, diretor executivo da Força de Intervenção de Emergência na Síria (SETF), com sede nos EUA.
Segundo este responsável, o condutor de uma escavadora revelou que os agentes dos serviços secretos obrigavam os funcionários a utilizar a escavadora para achatar e comprimir os corpos.
Mais de 150 mil prisioneiros sírios continuam desaparecidos e tudo sugere que a maioria esteja em valas comuns espalhados pelo país, informa a Associated Press.
Alguns grupos de defesa dos direitos humanos denunciaram que uma série de prisões geridas por militares, serviços secretos e agências de segurança na Síria ficaram famosas pela tortura sistemática, execuções em massa e condições brutais, acabando os reclusos por morrer com doenças ou de fome. A mais conhecida é a prisão de Sednaya, que ficou conhecida como "matadouro humano".
Os Capacetes Brancos, organização não governamental de defesa civil, receberam relatos de pelo menos 13 valas comuns em todo o país, oito das quais perto de Damasco.
“Ainda não podemos abrir estas valas comuns. É uma tarefa enorme documentar, recolher amostras e atribuir códigos aos cadáveres antes de podermos identificar estas pessoas”, disse Stephen Rapp, procurador internacional de crimes de guerra.
Há vários anos que são recolhidos depoimentos de testemunhas e imagens de satélite para localizar e estimar a dimensão das valas comuns, que se multiplicaram ao longo dos anos.
Stephen Rapp planeia reunir-se com as autoridades do novo governo de transição, instalado desde a ofensiva relâmpago sobre Damasco a 8 de dezembro, que forçou Bashar al- Assad a fugir do país. Pretende discutir formas de proteger e eventualmente escavar estes locais, recolher amostras dos restos mortais para identificação e preservar milhares de documentos descobertos em muitas agências de segurança e prisões.
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