Manifestantes cercaram o hospital desde domingo, chegaram a tentar invadir o edifício e pressionaram a menor para que não abortasse.
A menina brasileira de apenas 10 anos que estava grávida do tio, que a violava sexualmente desde os seis anos e está fugitivo, interrompeu esta segunda-feira a gravidez, que não desejava, num hospital da cidade de Recife, capital do estado de Pernambuco. Manifestantes ligados a movimentos evangélicos e ao presidente Jair Bolsonaro, contrários à interrupção da gravidez apesar desta ter sido consequência de uma violência contra a criança, cercaram o hospital desde este domingo, chegaram a tentar invadir o edifício e pressionaram a menor para que não abortasse.
Mas, com autorização do juiz António Moreira Fernandes, da Vara da Infância e Juventude da cidade de São Mateus, no estado de Espírito Santo, onde a menina vivia e foi violada durante anos pelo familiar, médicos procederam esta manhã à interrupção da gravidez no CISAM, Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros, em Recife. De acordo com Benita Spinelli, coordenadora de enfermagem do CISAM, que é um hospital de referência para casos como este, a menor encontrava-se bem na tarde desta segunda-feira.
Segundo Benita, os médicos começaram o processo de interrupção da gravidez ainda no domingo, pouco depois de a menor ter dado entrada naquele hospital após ter tido o aborto recusado em hospitais do Espírito Santo devido às fortes pressões dos grupos de extrema-direita liderados por Sara Winter, líder do grupo radical de apoio a Jair Bolsonaro conhecido como "300 do Brasil". A menor recebeu medicação para dilatar o corpo e esta manhã, pouco antes das 11h00, horário local, 15h00 em Lisboa, expulsou espontaneamente o feto. Ainda de acordo com Benita, os médicos vão avaliar nas próximas horas se será necessário ou não fazer uma curetagem, para, se for o caso, retirar o que pode ter restado do feto.
Tratado como criminosa
Na tarde e noite de domingo e até ser conhecida a confirmação da interrupção da gravidez, os grupos extremistas cercaram o CISAM, tentaram impedir a entrada de médicos e outros profissionais e, não o tendo conseguido, tentaram invadir o hospital para impedir o aborto. A Polícia Militar teve de fazer um cerco à unidade de saúde para garantir o trabalho dos médicos, tanto no caso da menor violada quanto no atendimento aos outros pacientes internados.
De longe, em Brasília, onde está em prisão domiciliar por ter atacado o edifício do Supremo Tribunal Federal e ter feito ameaças a juízes, Sara Winter, que, na verdade, se chama Sara Fernanda Giromini, comandou e incendiou ainda mais os ânimos dos radicais concentrados em redor do CISAM e divulgou dados sobre a menor, a família e até o hospital e os médicos que atenderam a menina, o que é crime. Esta segunda-feira, a justiça deu ordem ao Facebook, ao Twitter e ao Google para apagarem em 24 horas todas as mensagens de Sara Winter que contenham dados identificativos da menina e de todas as pessoas envolvidas no caso.
A coordenadora de enfermagem, Benita, contou que os gritos de "assassina" e "assassinos" vociferados ora contra a menor ora contra os médicos pelos radicais no lado de fora do hospital indignaram os profissionais de saúde e chocaram a menina. Benita contou que a equipa de saúde montou um esquema para impedir que o som dos manifestantes contrários à interrupção da gravidez chegassem até aos ouvidos da menina, que, frisou, não tem culpa de nada e não pode ser tratada como uma criminosa.
A menina, que é criada pela avó, que viajou com ela do Espírito Santo para Pernambuco acompanhadas de uma assistente social, deu entrada dia 8 num hospital da cidade onde vive, São Mateus, queixando-se de dores abdominais e desconforto geral. Ao verem a dilatação do abdómen da criança os profissionais de saúde do Hospital Regional de São Mateus decidiram fazer vários exames e descobriram a gravidez, já superior a três meses.
Confrontada com a confirmação da gestação, a menor contou que era violada repetidamente desde os seis anos por um tio, que quando o caso foi tornado público fugiu para outro estado e ainda não foi localizado. A menor contou que nunca tinha dito nada a ninguém sobre a violência que sofria porque o tio, de 33 anos, a ameaçava e ameaçava vingar-se na família dela se fosse descoberto.
A partir daí iniciou-se um tumultuado processo, que ganhou uma repercussão muito grande nas redes sociais, onde grupos evangélicos e radicais de direita exigiam que a menina mantivesse a gravidez. A família dela começou a ser fortemente pressionada e até ameaçada por esses grupos radicais para que não permitissem o aborto, mas o juiz responsável pelo caso autorizou a interrupção da gravidez a pedido do Ministério Público, para o qual o respeito a noções religiosas e morais não pode sobrepor-se ao respeito pela saúde e pela vida de uma criança vítima de um crime brutal.
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