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"Ninguém percebeu que o avião ia cair"

Técnico de avião da Chapecoense diz que fez plano de voo com paragem para reabastecer.

05 de dezembro de 2016 às 13:36

Sobrevivente de voo da Chapecoense conta momentos dramáticos

Um dos seis sobreviventes do fatídico voo da LaMia que matou 71 pessoas e dizimou a equipa de futebol da Chapecoense, conta, numa entrevista à Globo realizada no hospital da Bolívia onde recupera, que nenhum dos passageiros ou tripulantes de cabine se apercebeu de que o avião ia despenhar-se.

"Estava a falar com o treinador [Caio Junior] que estava a ensinar-me a falar português, quando ouvimos a ordem ‘apertem os cintos porque vamos aterrar'. Toda a gente voltou aos seus lugares e apertou os cintos. O avião começou a vibrar e eu pensei que essa vibração fosse de uma aterragem normal. Mas não foi. Apenas ouvi uns ruídos e não me lembro de mais nada. Só me lembro de me levantar do chão" conta o técnico de aviação, de 25 anos.

O boliviano conta ainda que só se apercebeu que o avião ia fazer o voo direto de Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia, para Medellin, na Colômbia quando já estava a bordo, pouco antes de descolar. O trajeto contrariava o plano de voo que ele próprio tinha elaborado. "Nós como técnicos fazemos o pré-voo e temos uma lista de check up de tudo o que é preciso fazer no avião. Preocupamo-nos com isso. A LaMia tem os seus gerentes, o seu pessoal, mas eu faço tudo o que me ensinaram e fiz o relatório que previa que íamos até Cobija [aeroporto junto à fronteira entre o Brasil e a Colômbia, que fica a cerca de um terço do percurso previsto] . No momento da descolagem voltei a perguntar se íamos parar em Cobija e disseram-me que íamos diretos a Medellin. Os depósitos estavam atestados ao máximo, mas o plano era ir até Cobija"

Tumiri diz que confiou que tudo estava devidamente previsto: "Em relação à autonomia e à parte da carga, quem faz isso é o despachante de voo, a responsabilidade é da LaMia. Eles sabiam qual era o peso, qual o combustível correspondente. Eles dizem-me qual o combustível necessário e eu faço esse abastecimento. Supus que eles sabiam o que estavam a fazer"

Momentos dramáticos após a queda

Na entrevista, o boliviano conta que acordou no meio dos destroço e o seu primeiro instinto foi procurar Ximena Suárez, outra das sobreviventes. "Era como um pesadelo. Não acreditava, acordei a pensar, ‘o que é que aconteceu?’. O que fiz foi ligar a minha lanterna e gritar socorro.

A Ximena estava a poucos metros de mim. Corri em direção a ela e soltei-a, porque ela estava presa. Ela estava a gritar e quando eu cheguei ao pé dela ela acalmou-se. Disse-lhe, ‘vamos embora’. Era mato, estava muito escuro. [Antes de cairmos] vi onde era o aeroporto, vi um avião a descolar e sabia para que lado era. Fomos andando nessa direção"

O tripulante conta que viu muitos corpos. Ouviu um dos sobreviventes, mas não teve força para chegar ao pé dele. "No momento de levar a Ximena vi muitos corpos espalhados. Mas não podia fazer nada, não via sinais de vida. Estava preocupado que o avião fosse explodir ou desmanchar-se, por isso fui-me afastando com a Ximena"

Quando cheguei a cima de um morro, ouvi alguém a falar com sotaque brasileiro. Perguntava se estava ali alguém e eu respondi perguntando de volta  ‘onde é que você está?’. Quis ir na direção da voz mas o corpo não respondia. Continuei a gritar para ele. Queria que ele não se calasse, que ele fosse falando, era a minha maneira de o ajudar"

Pouco depois do acidente, correu mundo a notícia de que Erwin contara que se tinha salvo por adotar os procedimentos de segurança, colocando-se em posição fetal. Mas o boliviano nega essa versão dos acontecimentos. "Eu não disse nada disso. É a primeira vez que estou a falar para a imprensa. Não percebi que o avião ia cair, ninguém percebeu. Estavam todos prontos para uma aterragem normal".

Erwin diz que sente que tem uma dívida de gratidão com a Chapecoense e quer ir à cidade do clube: "Quero ir a Chapecó e conhecer a cidade. Às vezes sinto como se tivesse sido salvo por eles, como se eles tivessem dado as suas vidas pela minha".

O técnico de aviação está a tirar um curso de pilotagem e mantém o seu sonho. Apesar do acidente, quer ser piloto de aviões comerciais.

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