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CHOCA-ME VER AS IMITAÇÕES

A aquisição de um Tapete de Arraiolos, uma das expressões mais genuínas do artesanato regional e que tem conhecido uma crescente reputação, interesse e expansão, tanto no País como no estrangeiro, continua a ser alvo da ambição de muitos, mas é um privilégio de muito poucos.

12 de outubro de 2003 às 00:00

A sua forma, o seu desenho e a sua cor e, ainda, o trabalho que dá às tapeteiras – as mulheres que os produzem – fazem deste produto artesanal uma verdadeira peça de museu, cujos modelos genuínos, de tamanho generoso, chegam a custar fortunas.

Fátima Fortes, uma das últimas tapeteiras da vila alentejana, começou a fazer tapetes com 14 anos, já que, por necessidade, teve de ir para uma das fábricas de Arraiolos. Agora, olha para trás sem ressentimentos: “Acabei por aprender uma profissão da qual me orgulho muito. A única opção era o trabalho no campo.”

Estabelecida por conta própria numa loja que abriu para uma das filhas, esta tapeteira acabou por assumir a gestão do estabelecimento comercial, “Ela não quis seguir as pisadas da mãe.” Aliás, este acaba por ser um dos problemas que a arte de tapeteira atravessa: a falta de mão-de-obra juvenil que assegure a continuidade.

No entanto, por ausência de certificação nacional e internacional que garanta a qualidade e a origem do Tapete de Arraiolos, a sua produção alastrou também a outros países, em manifesta contrafacção, defraudando o consumidor quanto à origem e prejudicando os produtores.

Um típico Tapete de Arraiolos é formado por um centro ou ornato central, um campo dividido em quatro partes onde os ornatos são dispostos simetricamente em relação a um eixo longitudinal e outro transversal, e uma barra à volta.

À volta da barra é habitual colocar-se uma franja na cor do fundo do campo do tapete e separada deste por um cairel – uma espécie de ourela onde fica presa a franja e que se faz ao mesmo tempo que esta.

‘MADE IN CHINA’

“A mim o que mais me chocou foi ter visto cópias dos nossos tapetes numa loja dos 300, em Arraiolos, com a designação ‘Made in China’. É inadmissível que estas coisas aconteçam e os nossos governantes nada fazem para alterar a situação”, desabafa Fátima Fortes, 47 anos. “Só o preço de um desses pseudotapetes não chega para comprar as lãs dos nossos”, esclarece.

Em Arraiolos já são muito poucas a fazer tapetes. Trata-se de uma arte que dá trabalho e muito pouco dinheiro. “As pessoas queixam-se de que os tapetes estão muito caros, mas a verdade é que se quiséssemos pagar um valor justo às tapeteiras, então teríamos que aumentar ainda mais o preço dos tapetes. As pessoas quando compram esquecem-se que para se fazer um metro quadrado de tapete são precisos 12 a 15 dias para aplicar 40 mil pontos.”

Além de ser importante para o cliente saber que está a comprar um produto genuíno, que respeita a tradição, é a imagem da região que está em causa. “É importante continuar a produzir segundo as regras criadas pelos nossos antepassados e que fizeram dos Tapete de Arraiolos uma peça de decoração de excepção.”

Perante este cenário, Fátima Fortes optou por criar um sistema de acompanhamento da obra “por forma a que o cliente saiba o que está a comprar e que não será defraudado. Eles escolhem o desenho e as cores das lãs e depois passam por cá para ver como decorre a execução do tapete. É uma forma de transmitirmos confiança aos clientes”.

A CULPA FOI DOS MOUROS...

Do Tapete de Arraiolos, bordado a lã sobre tela, a fios contados, conhecem-se referências já desde os finais do século XVI, com origem na vila alentejana.

As investigações apontam que a verdadeira origem dos primeiros tapetes de Arraiolos montam aos princípios daquele século quando, com a expulsão de Lisboa de mouros e judeus por D. Manuel I, ao seguirem viagem, a caminho do Norte de África, várias famílias se terão fixado em Arraiolos por aí terem encontrado bom acolhimento, abundância de rebanhos de boa lã e diversidade de plantas indispensáveis ao tingimento e fabrico de telas, dedicando-se assim à manufactura de tapeçarias empregando a técnica do ponto cruzado oblíquo que passou a denominar-se de Arraiolos.

09H00: ABERTURA

Fátima Fortes abre a loja Tiraz, que é sua propriedade, iniciando mais um dia de negócio, pese embora as vendas de tapete de Arraiolos tenha caído muito. Agora trabalha-se mais por encomenda, com a procura a surgir do estrangeiro.

11H00: VENDA

Antes de começar a preparar um novo tapete ainda há tempo de mostrar e vender aqueles que já estão prontos. Paralelamente, é feita uma pequena explicação sobre a origem dos tapetes, principalmente a turistas.

12H00:DESENHO

A primeira tarefa da tapeteira, antes de começar a bordar, é efectuar o desenho do tapete. Trata--se de um apoio.

16H00: BORDAR

Chega então a hora de bordar. Num metro quadrado aplicam-se 40 mil pontos. Há que manusear muito bem a agulha.

18H00: FRANJA

A colocação da franja é uma das últimas tarefas antes de entregar o tapete ao cliente. O metro quadrado vale 200 euros.

Nos últimos anos assistiu-se a uma expansão acelerada da produção de tapetes com as técnicas do bordado de Arraiolos a chegarem a vários pontos do País por força da migração da mulher alentejana. Actualmente, existem cerca de 23 lojas que vendem os tapetes em Arraiolos.

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