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Reitores e investigadores temem que extinção da FCT comprometa produção científica

Em causa está a reforma em curso no Ministério da Educação, Ciência e Inovação e a criação da Agência de Investigação e Inovação.

26 de setembro de 2025 às 08:26

Reitores e investigadores temem que a extinção da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) comprometa a produção científica e criticam a "falta de transparência" no processo em que lamentam não ter sido ouvidos.

A posição foi enviada à Presidência da República e subscrita pelos reitores das universidades de Coimbra e Minho, Amílcar Falcão e Rui Vieira de Castro, e do ISCTE, Maria de Lurdes Rodrigues, os vice-reitores para a investigação da Universidade de Lisboa e do ISCTE, Cecília Rodrigues e Jorge Costa.

Do lado dos investigadores, assinam também o presidente do Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto, Manuel Sobrinho Simões, e Mário Figueiredo, do Instituto de Telecomunicações.

Em causa está a reforma em curso no Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) e a criação da Agência de Investigação e Inovação (AI2), que vai integrar as competências até agora da FCT e da Agência Nacional de Inovação (ANI).

A extinção da FCT tem sido particularmente polémica e na posição enviada à Presidência da República, onde o decreto-lei do Governo aguarda promulgação, os reitores e investigadores deixam críticas ao que consideram ser uma "rutura radical" e à forma como o executivo conduziu o processo.

"Existe na comunidade científica um consenso sobre a necessidade de melhorar o funcionamento das agências financiadoras (FCT e ANI), bem como de melhorar os mecanismos de valorização do conhecimento junto das empresas e dos organismos públicos. Porém, os problemas reconhecidos não justificam a medida radical da extinção da FCT", argumentam, no texto a que a Lusa teve acesso.

Sublinhando que as duas entidades têm missões distintas, os subscritores afirmam que a sua integração numa agência única "não encontra respaldo nas recomendações ou nas práticas internacionais" e temem que comprometa a produção de conhecimento científico.

Apesar de o decreto-lei que cria a AI2 ter sido aprovado em Conselho de Ministros no início do mês de setembro, não são ainda conhecidos detalhes sobre como a nova agência irá funcionar e, por isso, reitores e investigadores falam num processo pouco transparente, em que a comunidade científica não foi ouvida e não se conhecem os pareceres e diagnósticos que a justificam.

Ainda assim, fazem referência a um parecer do Conselho Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI), publicado em agosto, que dizem conter as bases conceptuais da reforma, mas no qual identificam várias lacunas.

De acordo com os subscritores, o parecer em causa não fundamenta os problemas identificados, como a alegada fragmentação do sistema científico nacional, nem refere as características da economia portuguesa, tendências de transformação ou o subfinanciamento da Investigação e Desenvolvimento (I&D), abaixo da meta de 3% do PIB.

Por outro lado, acrescentam que o relatório do CNCTI faz menção à avaliação do European Innovation Scoreboard de 2025, que classifica Portugal como país "inovador moderado", sem referir as fragilidades apontadas, como o défice de investimento em I&D do setor público e das empresas ou, pelo contrário, o elevado apoio do Estado às empresas através de benefícios fiscais em I&D.

Os reitores e investigadores levantam igualmente dúvidas jurídico-administrativas quanto à transferência para uma entidade do setor empresarial das competências do Estado exercidas pela FCT, que é atualmente um instituto público.

Numa reunião recente entre a tutela e diretores de unidades de investigações, o MECI esclareceu que a nova agência seguirá o modelo de governança da ANI (uma sociedade anónima), com Assembleia Geral.

"Seria esta assembleia e não o Governo a decidir sobre o financiamento, funcionamento e desenvolvimento do sistema científico nacional", criticam, manifestando também preocupação quanto à tutela partilhada entre o MECI e o Ministério da Economia e Coesão Territorial.

"Decisões que têm por objetivo colocar a ciência exclusivamente ao serviço da economia a curto prazo comprometem, no longo prazo, a ciência e a produção de conhecimento em todas as áreas e não dão garantias do desenvolvimento económico sustentado que se pretende", argumentam.

Num outro parecer sobre a extinção da FCT, também o Centro de Estudos Matemáticos (CEMS) da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa alertou para o "esvaziamento das políticas de investigação de âmbito mais teórico, que não são guiadas exclusivamente por propósitos comerciais ou demoram a produzir impacto na sociedade".

Quando o Governo anunciou a reestruturação dos serviços do MECI, o Presidente da República chegou a avisar que se tivesse dúvidas "sobre um ponto" que fosse relativo à extinção da FCT iria pedir ao Governo para repensar o diploma e, caso o executivo insistisse, poderia vetar o diploma.

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