O músico tem novo disco 'Menino Prodígio' nome que lhe chamavam em criança. O pretexto para uma viagem à infância.
Afinal quem é que lhe chamava 'Menino Prodígio'?
Eram uns amigos dos meus pais quando eu era criança. No sótão lá de casa, havia um piano velho, e eu ia para lá e começava a tocar e a cantar. Eram musiquitas que eu ouvia as minhas irmãs mais velhas ou a empregada dos meus pais cantarem. Toda a gente ficava muito espantada como é que um miúdo de quatro ou cinco anos cantava aquelas coisas todas. Mas hoje há muitos meninos-prodígio. Hoje os miúdos têm acesso a tudo muito mais depressa. Nos anos 40, não era assim.
E de onde é que vinha esse talento para a música?
Não sei. As pessoas estavam sempre a perguntar isso e os meus pais respondiam sempre o mesmo, que eu aprendia sozinho. Por isso, passaram a chamar-me de 'menino-prodígio'. Um dia, muitos anos mais tarde, resolvi gerir a ideia e transformá-la numa música. O resultado está agora aí, neste disco.
Mas alguma vez se sentiu mesmo um prodígio?
Teve uma infância feliz?
Sim, muito feliz. Os meus pais também tinham um jardim simpático e eu brincava lá muito. Recordo-me de que o meu pai tinha uma bicicleta de criança muito antiga e que me levava nela até à fábrica de tomate que dirigia. Aqueles dois quilómetros até à fábrica eram uma aventura enorme para mim.
Mas alguma vez se sentiu uma criança especial e diferente das outras por ter essa apetência para tocar e cantar?
Eu era uma criança muito distraída e não me apercebi disso. Tive uma precetora francesa chamada Monique que sim, percebeu que eu não era como as outras crianças, que era muito sonhador e distraído e que só aprendia aquilo de que eu gostava. Lembro-me de que um dia me ofereceu um livro de Aquilino Ribeiro chamado 'História de Portugal para Meninos Preguiçosos', e foi assim que eu aprendi História.
E na escola como é que era?
Era sempre o melhor nas redações e no desenho.
O facto de ter batizado este disco com o nome de 'Menino Prodígio' significa que é o seu trabalho mais pessoal?
Não. O tema 'Menino Prodígio' até é um oásis no meio do meu disco, que vai por áreas muito diferentes. É verdade que recuperei algumas canções escritas há muitos anos, mas dei-lhes um som mais atual. Fui buscar um poema do José Régio que musiquei à minha maneira, fiz uma versão do 'I don't Wanna Miss a Thing', dos Aerosmith, e um tema que está a ser um sucesso que se chama 'De Mentirosos está o Cemitério Cheio'. Já tenho 15 mil ou 20 mil pessoas nos concertos a cantar isto [risos].
Não podia ser mais atual...
Sim [risos]. As pessoas estão fartas de ser enganadas e viram nessa canção quase um ato de rebeldia.
Mas essa canção tem um destinatário em particular?
Destina-se aos mentirosos... e não só [risos]. Mas esta não é uma canção de contestação, é mais uma canção de constatação. Esse até é um tema de algum sonho, que nada tem a ver com agressividade. E é por aí que passa muito este disco, que é muito poético, sendo ao mesmo tempo roqueiro.
'Roqueiro' e 'poético' parece uma coisa muito em desuso nos dias que correm...
Não. O que acabou foi o rock romântico e lamechas. A função do rock nunca foi 'lamechar', para isso existemas canções românticas. A função do rock sempre foi alertar e despertar as pessoas, ter texto, contexto e objeção deconsciência. E é um bocadinho por aí que eu vou.
É um defensor do rock, portanto!
Eu gosto, acima de tudo, do rock bem tocado. O guitarrista que toca comigo, por exemplo, é
formado com 20 valores na Barcklays School americana. É um guitarrista de top mundial. E depois tenho na bateria o Luís Varatojo, que toca numa atitude muito sóbria e sólida.
E comoé queé fazer rock aos 73 anos?
É muito natural. Para mim, fazer rock aos 73 anos é como ir beber água, passear o cão ouir ver o mar. A minha música passa por muitas áreas. Mas eu sou na música como o Fernando Perssoa foi na literatura, tenho vários heterónimos musicais. Não tenho fronteiras, faço fado, jazz, ba- ladas, música popular ou rock sinfónico. A minha música é como um oceano, não tenho fronteiras.
E sente-se em forma?
Vocalmente sim. Fisicamente estou melhor agora, depois de ter passado por um período menos bom. Há dois ou três meses, estava diabético. Felizmente, agora já sou só pré-diabético [risos].
Como é que chegou aí?
A comer muitos doces. Antes, entre um bom bife grelhado ou um pudim abade de Priscos, nem hesitava [risos]. Quando andava em viagem, fazia por sair da autoestrada em Santarém para ir buscar uma dúzia de celestes [doces de amêndoa] e quando passava na portagem já tinha comido tudo. E depois sou muito invejoso nesse aspeto. Tenho muita inveja de quem come doces e não engorda. Depois há outros que até a beber água ganham peso, que é o meu caso.
Vinha de um período de rock sinfónico. É fácil para si mudar a agulha entre os seus 'heterónimos'?
Sim. Neste disco já se encontram coisasmuito diferentes, inclusive influências de rock sinfónico ou de 'power ballads'.Este disco tem uma sonoridade muito simples e verdadeira.
Voltando aos mentirosos e aos cemitérios. Como é que vê o período da vida social e política que vivemos?
Eu vejo as coisas à minha maneira. Gostava de ver um país mais social, em que as pessoas que trabalham uma vida inteira saibam que vão ter apoio na sua velhice. Por isso é que eu gostaria que a nossa política se- guisse um bocadinho as monarquias do Norte da Europa, que são, apesar de tudo, os países menos corruptos do Mundo eculturalmente mais evoluídos. É verdade que se pagam impostos brutais, mas depois têm tudo ao dispor praticamente grátis para todaa família.
E temos solução para cá?
Se não há solução cá, que contratem no estrangeiro. Há países que fazem isso, vão contratar políticos fora. Acho que podia ser uma boa solução.
Não vê competência na nossa classe política, é isso?
O que eu vejo é um povo triste e frustrado que já pensa no futuro dos netos. Portugal deveria ir à Dinamarca ou à Noruega copiar modelos que estão corretos, modelos bons.
Quando escreve, sente que é influenciado por estes contextos sociais e políticos?
Não, eu não faço plágios [risos]. Quando eu estou a compor e a escrever, sou o mais José Cid possível. Vou aos meus arquivos, que são muitos, buscar as minhas reservas musicais e ligá-las poeticamente. Esse é o maior esforço.
Porquê?
Porque eu não estou tão poético como era. Não estou propriamente desinspirado, mas agora só escrevo de vez em quando. Houve um período, quando eu era mais jovem, em que escrevia poemas quase todos os dias. Agora é mais raro, mas mesmo assim já estou a trabalhar no meu próximo disco.
Que disco é esse?
Chama-se 'Clube dos Corações Solitários do Capitão Cid', que vai ter um grafismo muito próximo do 'Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band', dos Beatles. Vai ter algumas versões e não posso dizer muito mais. Vou fazendo estas coisas enquanto a minha voz o permitir. É que os cantores aos 73 anos em Inglaterra, por exemplo, estão todos 'arrumadinhos' por causa de álcool, fumo e drogas.
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