Um ex-seminarista dedicou grande parte da vida à procura de santinhos. Juntou mais de 25 mil imagens, todas diferentes, naquela que é a maior colecção do País
Não deve haver ninguém que nunca tenha recebido um santinho na vida. Na primeira comunhão, numa romaria ou ao visitar uma igreja ou uma capela. Mas há um homem, em Braga, que não tem aqueles dez ou vinte santinhos mais usuais, de Nossa Senhora de Fátima, do Coração de Jesus ou de Santo António. Avelino Costa, antigo administrador da Casa da Sorte, agora na reforma, tem a maior colecção de santinhos do País: para cima de 25 mil imagens diferentes.
“Sempre me fascinaram muito estas imagens de santos, de Cristo e muito particularmente as de Nossa Senhora. Por isso, ao longo da minha vida, nas inúmeras viagens que fiz pelo País e até pelo estrangeiro, juntei todas as que pude. Quando me reformei, comecei então a ordená-las e a catalogá-las, segundo diversas temáticas e por ordem alfabética”, disse à Domingo Magazine este ex-seminarista a quem pouco faltou para chegar a padre.
Só estampas de invocações a Nossa Senhora, este coleccionador tem mais de sete mil, todas diferentes, ordenadas em 19 álbuns.
“O tema da minha predilecção é a Virgem Maria. Percorri montes e vales, por este País fora, à procura das estampas das ‘senhoras’ veneradas nas mais diversas terras. Às vezes, chegava aos locais de devoção, santuários ou ermidas, e não havia estampas da padroeira. Na maioria desses casos, consegui convencer o pároco ou a comissão fabriqueira a fazer a impressão da imagem, em dois ou três tamanhos, lembrando-lhes que é sempre uma boa fonte de receita e ajuda ao alargamento do culto ao orago”, referiu.
Avelino Costa não se limita a juntar pagelas ou estampas de santos, Jesus Cristo, Nossa Senhora ou até das mais emblemáticas passagens bíblicas. Ele procura sempre saber a origem das devoções, o porquê dos nomes e até a razão de determinados cultos em diversos lugares.
AS MIL MÃES DE JESUS
A Nossa Senhora representada nas imagens é sempre a mesma. A Virgem Maria de Nazaré, filha de Santa Ana que, há 2004 anos, deu à Luz o Filho de Deus feito homem, numa gruta de Belém, na Galileia. Mas, com o passar dos anos e a generalização do culto, foi adoptando vários nomes. Em muitos casos foi baptizada em função das terras onde o culto se enraizava, como a Senhora de Fátima, a Senhora do Sameiro ou a Senhora da Abadia; noutros casos nomeava-se em função das graças que concedia a quem lhas solicitava, como Senhora do Amparo, Senhora do Leite, Senhora da Boa Viagem ou Senhora dos Remédios.
E nos muitos passos que deu para ‘construir’ esta colecção (que, como todas colecções, está inacabada), Avelino Costa encontrou coisas muito curiosas e interessantes do ponto de vista sociológico e da religiosidade dos povos.
“Eu andei quilómetros e quilómetros para encontrar o Mosteiro de Santa Maria de Cárquere, no concelho de Resende, porque um grande historiador, meu amigo, me contou que Egas Moniz tinha ali levado D. Afonso Henriques, ainda bebé, porque este nascera ‘entrevadinho’, para pedir a Nossa Senhora que o curasse. E, reza a história, que o nosso primeiro Rei saiu de lá curado. Ora eu não podia deixar de ter aquela imagem, que por sinal até é muito bonita”, referiu-nos, como exemplo, o coleccionador.
Mas há mais. Em algumas localidades da Beira Alta, como Mangualde ou Teixoso, é grande a devoção a Nossa Senhora dos Verdes – até a imagem tem tom esverdeado. É que, em meados do século XVII, houve uma invasão de gafanhotos que dizimou tudo o que era verde por aquelas terras. Ora as pessoas, como popularmente se diz, ‘apegaram-se’ com Nossa Senhora e a praga acabou. A partir daí aquelas gentes passaram a venerar Nossa Senhora dos Verdes.
E foram razões como esta que fizeram ‘nascer’ Nossa Senhora do Sorriso, Nossa Senhora do Leite, Nossa Senhora da Vista, Nossa Senhora das Febres, Nossa Senhora da Formigueira ou Nossa Senhora da Gaiola. E de todas elas Avelino Costa tem as estampas.
Mas nesta “importante e valiosa colecção”, parafraseando o Cabido da Sé de Braga, há pagelas de incalculável valor. Há por exemplo santinhos de Nossa Senhora de Fátima de 1920, verdadeiras relíquias, assim como santinhos do Coração de Jesus de meados do século XIX. Mas tem também registos do século XVI e um notável conjunto de imagens dos santos portugueses.
E os números são impressionantes. Mais de mil imagens diferentes de Santo António, mais de duas mil de Nossa Senhora de Fátima, mais de três mil da Virgem e o Menino de todo o mundo. E milhares de santos e santas de dezenas de países. Dos mais venerados aos que nem se sonha que existem. Tudo isto para além de preciosidades como as 70 imagens do catecismo antigo e os originais da Ladainha de Nossa Senhora. Um notável acervo histórico-religioso que, por protocolo, será doado ao Museu da Sé de Braga.
O VERDADEIRO ST. ANTÓNIO
Uma das curiosidades da colecção de santinhos de Avelino Costa é “o verdadeiro retrato de Santo António de Lisboa, tal como é venerado na sua real casa”: uma imagem a lápis, que contraria a tese dos franciscanos, segundo a qual na primeira imagem o santo não tinha menino.
“O menino, assim como o saco do pão, integra os atributos do santo, ou seja, elementos através dos quais a sua mensagem e a sua vida ficou conhecida”, disse-nos Avelino Costa, admitindo, no entanto, que em tempos mais antigos tenham sido feitas imagens de Santo António sem o menino.
No entanto, o santo português mais popular no mundo, ficou conhecido por pregar aos peixes, por fazer o burro de um ateu ajoelhar-se para o converter e por dar pão às crianças famintas de Itália, país onde pregou e morreu.
De resto, os italianos chamam-lhe Santo António de Pádua porque, segundo as tradições da Igreja, os santos são das terras onde morrem.
DESTINO: SÉ DE BRAGA
Apesar de respirar saúde, Avelino Costa já legou os seus santinhos, num protocolo assinado, ao Tesouro Museu da Sé Catedral de Braga. “O que pretendo é que as imagens possam ser usufruídas pelo maior número possível de pessoas”, disse Avelino Costa, sem especificar a forma como gostaria que o fizessem.
“Há várias maneiras, e eu sei que os responsáveis do museu o saberão fazer muito melhor do que eu. No entanto, parece-me que, pelo menos ao nível das imagens de Nossa Senhora, têm material para uma exposição permanente. Quanto aos outros temas, pode fazer-se exposições segundo as efemérides”, referiu o coleccionador.
De resto, Avelino Costa, não pediu nada em troca ao Cabido da Sé de Braga, a não ser que, quando deixar este mundo, os cónegos lhe rezem pela alma. E isto está escrito no protocolo assinado há quatro anos pelo então Deão do Cabido.
Tem sugestões ou notícias para partilhar com o CM?
Envie para geral@cmjornal.pt
o que achou desta notícia?
concordam consigo
A redação do CM irá fazer uma avaliação e remover o comentário caso não respeite as Regras desta Comunidade.
O seu comentário contem palavras ou expressões que não cumprem as regras definidas para este espaço. Por favor reescreva o seu comentário.
O CM relembra a proibição de comentários de cariz obsceno, ofensivo, difamatório gerador de responsabilidade civil ou de comentários com conteúdo comercial.
O Correio da Manhã incentiva todos os Leitores a interagirem através de comentários às notícias publicadas no seu site, de uma maneira respeitadora com o cumprimento dos princípios legais e constitucionais. Assim são totalmente ilegítimos comentários de cariz ofensivo e indevidos/inadequados. Promovemos o pluralismo, a ética, a independência, a liberdade, a democracia, a coragem, a inquietude e a proximidade.
Ao comentar, o Leitor está a declarar que é o único e exclusivo titular dos direitos associados a esse conteúdo, e como tal é o único e exclusivo responsável por esses mesmos conteúdos, e que autoriza expressamente o Correio da Manhã a difundir o referido conteúdo, para todos e em quaisquer suportes ou formatos actualmente existentes ou que venham a existir.
O propósito da Política de Comentários do Correio da Manhã é apoiar o leitor, oferecendo uma plataforma de debate, seguindo as seguintes regras:
Recomendações:
- Os comentários não são uma carta. Não devem ser utilizadas cortesias nem agradecimentos;
Sanções:
- Se algum leitor não respeitar as regras referidas anteriormente (pontos 1 a 11), está automaticamente sujeito às seguintes sanções:
- O Correio da Manhã tem o direito de bloquear ou remover a conta de qualquer utilizador, ou qualquer comentário, a seu exclusivo critério, sempre que este viole, de algum modo, as regras previstas na presente Política de Comentários do Correio da Manhã, a Lei, a Constituição da República Portuguesa, ou que destabilize a comunidade;
- A existência de uma assinatura não justifica nem serve de fundamento para a quebra de alguma regra prevista na presente Política de Comentários do Correio da Manhã, da Lei ou da Constituição da República Portuguesa, seguindo a sanção referida no ponto anterior;
- O Correio da Manhã reserva-se na disponibilidade de monitorizar ou pré-visualizar os comentários antes de serem publicados.
Se surgir alguma dúvida não hesite a contactar-nos internetgeral@medialivre.pt ou para 210 494 000
O Correio da Manhã oferece nos seus artigos um espaço de comentário, que considera essencial para reflexão, debate e livre veiculação de opiniões e ideias e apela aos Leitores que sigam as regras básicas de uma convivência sã e de respeito pelos outros, promovendo um ambiente de respeito e fair-play.
Só após a atenta leitura das regras abaixo e posterior aceitação expressa será possível efectuar comentários às notícias publicados no Correio da Manhã.
A possibilidade de efetuar comentários neste espaço está limitada a Leitores registados e Leitores assinantes do Correio da Manhã Premium (“Leitor”).
Ao comentar, o Leitor está a declarar que é o único e exclusivo titular dos direitos associados a esse conteúdo, e como tal é o único e exclusivo responsável por esses mesmos conteúdos, e que autoriza o Correio da Manhã a difundir o referido conteúdo, para todos e em quaisquer suportes disponíveis.
O Leitor permanecerá o proprietário dos conteúdos que submeta ao Correio da Manhã e ao enviar tais conteúdos concede ao Correio da Manhã uma licença, gratuita, irrevogável, transmissível, exclusiva e perpétua para a utilização dos referidos conteúdos, em qualquer suporte ou formato atualmente existente no mercado ou que venha a surgir.
O Leitor obriga-se a garantir que os conteúdos que submete nos espaços de comentários do Correio da Manhã não são obscenos, ofensivos ou geradores de responsabilidade civil ou criminal e não violam o direito de propriedade intelectual de terceiros. O Leitor compromete-se, nomeadamente, a não utilizar os espaços de comentários do Correio da Manhã para: (i) fins comerciais, nomeadamente, difundindo mensagens publicitárias nos comentários ou em outros espaços, fora daqueles especificamente destinados à publicidade contratada nos termos adequados; (ii) difundir conteúdos de ódio, racismo, xenofobia ou discriminação ou que, de um modo geral, incentivem a violência ou a prática de atos ilícitos; (iii) difundir conteúdos que, de forma direta ou indireta, explícita ou implícita, tenham como objetivo, finalidade, resultado, consequência ou intenção, humilhar, denegrir ou atingir o bom-nome e reputação de terceiros.
O Leitor reconhece expressamente que é exclusivamente responsável pelo pagamento de quaisquer coimas, custas, encargos, multas, penalizações, indemnizações ou outros montantes que advenham da publicação dos seus comentários nos espaços de comentários do Correio da Manhã.
O Leitor reconhece que o Correio da Manhã não está obrigado a monitorizar, editar ou pré-visualizar os conteúdos ou comentários que são partilhados pelos Leitores nos seus espaços de comentário. No entanto, a redação do Correio da Manhã, reserva-se o direito de fazer uma pré-avaliação e não publicar comentários que não respeitem as presentes Regras.
Todos os comentários ou conteúdos que venham a ser partilhados pelo Leitor nos espaços de comentários do Correio da Manhã constituem a opinião exclusiva e única do seu autor, que só a este vincula e não refletem a opinião ou posição do Correio da Manhã ou de terceiros. O facto de um conteúdo ter sido difundido por um Leitor nos espaços de comentários do Correio da Manhã não pressupõe, de forma direta ou indireta, explícita ou implícita, que o Correio da Manhã teve qualquer conhecimento prévio do mesmo e muito menos que concorde, valide ou suporte o seu conteúdo.
ComportamentoO Correio da Manhã pode, em caso de violação das presentes Regras, suspender por tempo determinado, indeterminado ou mesmo proibir permanentemente a possibilidade de comentar, independentemente de ser assinante do Correio da Manhã Premium ou da sua classificação.
O Correio da Manhã reserva-se ao direito de apagar de imediato e sem qualquer aviso ou notificação prévia os comentários dos Leitores que não cumpram estas regras.
O Correio da Manhã ocultará de forma automática todos os comentários uma semana após a publicação dos mesmos.
Para usar esta funcionalidade deverá efetuar login.
Caso não esteja registado no site do Correio da Manhã, efetue o seu registo gratuito.
Escrever um comentário no CM é um convite ao respeito mútuo e à civilidade. Nunca censuramos posições políticas, mas somos inflexiveis com quaisquer agressões. Conheça as
Inicie sessão ou registe-se para comentar.