Quando os chapéus de feltro desfilam, firmes, sobre as cabeças da alta costura mundial, uma centena e meia de pessoas, a milhas das passerelles de moda internacionais, regozija-se com os aplausos. Os trabalhadores da portuguesa Fepsa, em São João da Madeira, líder mundial no fabrico de chapéus, não escondem o orgulho ao contemplar o estrelato conquistado pelo feltro que laboram.
Não é caso singular este, o de verem o trabalho diário no passeio da fama. O administrador Ricardo Figueiredo, filho do fundador desta empresa com raízes no princípio do século – embora, com o nome e características pelas quais hoje é conhecida, date de 1969 – sublinha a importância dos funcionários conhecerem o êxito além-fronteiras que a marca tem atingido. E a motivação 'das pessoas que dão o seu melhor' é estratégia que passa por aí. Por afixar os orgulhos, embalados em páginas e páginas de revistas de moda e cinema, num placard em hora de expediente. 'Na alta costura não se vendem grandes quantidades, não é disso mas também é para isso que vivemos. Tentamos dar satisfação a todos os pedidos pois achamos que devemos manter o chapéu na passerelle.'
Como que para demonstrar o peso de clientes 'topo de gama', Ricardo chama à cena um exemplo recente. 'Um cliente francês tinha tanta urgência em ter um chapéu nosso num desfile que se meteu num avião para vir cá buscar uma amostra. Chegou à fábrica de táxi, pegou no feltro e embarcou outra vez. Na alta costura, as pessoas não olham a meios nem a custos para atingir os objectivos. Por isso acaba por ser uma obrigação que cumprimos com muito gosto.' A esse ‘dever’ apetitoso some-se a cabeça de figuras tão públicas como o ex-presidente americano George W. Bush, o seu ex-amigo Vladimir Putin – primeiro-ministro russo – os hollywoodescos actores Robert de Niro e Nicolas Cage, para se perceber o feltro de que se faz o sucesso que também já vestiu o grande ecrã. E que ecrã.
Em ‘Public Enemies’ (‘Inimigos Públicos’), filme protagonizado por Johnny Depp, que chega a Portugal a 6 de Agosto, o feltro dos oitenta chapéus veio da Fepsa, que tem conseguido contornar a crise sem grande embaraço, com dois mil chapéus a sair por dia para fora de portas lusas, com o feitio feito à medida do povo que os vai pôr na cabeça. 'Para a Andaluzia enviamos chapéus de toureiro, para os Andes chapéus tradicionais, para Israel só vendemos em preto e para os EUA aqueles de tipo cowboy e também os dos uniformes para as forças policiais', enumera o administrador, citando apenas alguns dos 40 países clientes. Em Portugal, os mais populares são 'os etnográficos, quer dos folclores quer das confrarias'. O chapéu não sai acabado da fábrica, porque o design final fica ao critério das marcas: 'Esta foi a nossa inovação de conceito, não fabricarmos o produto acabado para não concorrermos com os nossos clientes', alguns tão famosos como a italianíssima Prada e a francesa Hermès.
Chapéus há, de facto, muitos mas não é deste acessório que vive há 30 anos a família Cortinhas, de Famalicão, um clã que, à semelhança dos chapeleiros de São João da Madeira, conhece de cor os trilhos do sucesso na área de negócio a que se dedicam desde 1980, os têxteis de malha. As chaves do êxito, 'a forte estratégia de internacionalização – que começou em 1994 pela mão da empresa Copa Companhie Textile, em Paris, da qual a empresa portuguesa é detentora em 50% –, o sentido de responsabilidade e a união familiar', que vestem a Lima & Companhia têm aberto muitas portas. No início, quando nem todos os descendentes tinham ainda nascido, eram catorze os funcionários que teciam 'a confecção a feitio'. Hoje são 235 trabalhadores e o 'sistema produtivo tem capacidade para 5000 peças por dia'. Os números redondos não se assustaram com a crise – 'olhamos para ela como mais um desafio que vamos ter de enfrentar, convictos de que não vamos reduzir nenhum posto de trabalho. Se a conjuntura permitir poderemos até aumentá-los.'
A esperança foi transmitida pelos pais, José e Margarida, aos três filhos, Márcia, Pedro e Nuno, a par do legado dos têxteis. Isso e o júbilo por vestirem a farda a entidades de peso como 'a Agência Espacial Europeia [ESA, na sigla inglesa] e a polícia e a administração pública francesas'. Com a ESA trabalham desde 2004 e têm vindo a produzir 'diferentes modelos, como os pólos de manga curta e comprida, as t-shirts e os calções', explica Márcia, a filha mais nova dos Cortinhas. E se todos se orgulham do país que lhes deu berço, revelam sem pudor que exportam a totalidade do que produzem. 'O mercado português foi ingrato connosco', infrutífero 'pela dimensão e pela morosa política de cobranças'.
Enquanto uns se dedicam ao ‘Espaço’, outros descem ao fundo do mar neste caminho da internacionalização. No caso da Euronavy, a história começou a escrever--se apenas com a investigação de possíveis soluções e alternativas. Nos primórdios, início dos anos 80, era um laboratório, não uma fábrica, mas já se dedicava ao ramo das tintas marítimas e industriais, bem antes de começar a apanhar o barco do mercado, em 1989, com a ajuda do produto ES301 – uma tinta anticorrosão para ser usada debaixo de água. Nessa altura, a empresa, então chamada Estelim, funcionava com nove pessoas e nenhum produto, só oferecia tecnologia. Foi depois de um par de anos a trabalhar com importantes clientes, como a Shell ou a Petrogal, que conseguiram o que viria a ser um importante cartão de visita para os futuros negócios internacionais – a aprovação para fornecer tintas para a marinha de guerra americana, a US Navy. Ainda hoje são 'a única empresa aprovada para certos trabalhos'.
'Um dos segredos foi conseguirmos (ante)ver como poderia ser o mercado no futuro, principalmente o pensar produtos que permitissem tratamentos de superfície não agressivos para o meio ambiente', recorda o fundador Mário Paiva, o ‘pai’ da Euronavy. 'Quantas pessoas tinha a empresa no início? Bem, no início no início só tinha uma: eu.' Uma vontade de ferro que o fez abdicar de um cargo numa multinacional para 'seguir com a vida'. Encostou a comodidade e arriscou a carteira, mas em pouco tempo aquilo que pareceria uma loucura começou a dar frutos. O segredo parece simples de assimilar: 'Não tentamos vender o que produzimos aos clientes, procuramos saber o que eles precisam e produzimos à medida das suas necessidades. Actuamos em nichos de mercado'. O mais recente projecto da empresa de tintas, os Estaleiros Atlântico Sul, no Recife, tem sotaque brasileiro e conta com uma ajuda muito especial: o 'filho da Euronavy, Euronavy Engineering', nascido em 2005 para dar suporte à fábrica. Já se viu que a crise não mora nas plataformas petrolíferas. 'Fundimos em 2008 com a Sherwin-Williams americana, mas aqui em Portugal só temos 37 funcionários. Se não contarmos com a fusão, continuamos a ser uma PME'. Uma pequena-média empresa que continua tão nacional como nos idos anos 80 em que nasceu. 'Continua a ser uma empresa portuguesa, só consigo vê-la desta forma.'
ABOTOAR A FAMA
É também à conta da (boa) imagem – e da 'qualidade, inovação permanente, preço competitivo e apoio técnico aos grandes criadores de moda internacional' – conquistada ao longo dos anos que a Louropel se firmou na produção (e exportação) de botões. 'Somos a maior produtora de botões do Mundo e líder incontestado de mercado', assume Avelino Rego, gerente-geral e filho do fundador da empresa de Famalicão, sem falsa gabarolice. E as razões sobram, de facto, para o poder fazer. 'Os 10 a 12 milhões de unidades por dia' que saem da fábrica criada em 1966 não deixam mentir o responsável. Isso e a exportação para mais de uma dezena de países de todos os continentes funcionam como atestado do sucesso. A preocupação com o ambiente – 'os botões são produzidos através de reciclagem e recuperação dos resíduos sólidos gerados pelo processo de fabrico para posterior reutilização com produtos naturais (farinha de sêmola, algodão, leite em pó...)' – valeu aos botões portugueses um coro de louvores e diplomas, mas a vontade de evolução não abdica de ser constante. E embora a gestão de topo continue a ser 'a de uma empresa familiar', emprega actualmente 200 pessoas. Duzentos portugueses que muitas vezes não saem do mapa mas produzem dos seus postos de trabalho para o Mundo. Um mundo à parte do submundo da crise que mostra e demonstra que o sucesso também pode falar português. Sem quaisquer problemas de expressão.
PAPO D'ANJO JÁ VESTIU SURI, APPLE E MOSES
Suri Cruise já vestiu... Papo d’Anjo. E Suri não é ‘apenas’ a filha de Tom Cruise e Katie Holmes. Aos 3 anos é considerada a criança mais influente do Mundo, eleita pela revista ‘Forbes’, ultrapassando os filhos do casal Jolie-Pitt e os pequenos Beckam. Consta que nunca repete um modelito e que as roupas que usa ditam a moda infantil no Mundo. Os filhos da actriz Gwyneth Paltrow, Apple e Moses, também já usaram roupa desta empresa portuguesa que começou por vender vestuário para criança nos EUA, em 1995, ao estilo Tupperware e este ano conquistou um espaço no Harrod’s de Londres. A fundadora, Catherine Monteiro de Barros, é americana mas vivia em Lisboa, onde se instalou em 1991 com o marido português, quando teve a ideia de criar uma colecção de roupas de luxo para um público infantil. Actualmente a empresa, que conseguiu em 2008 receitas de sete milhões de euros, emprega 62 pessoas e dará trabalho a cerca de 100 costureiras em Lisboa. Tem lojas próprias em Lisboa e Madrid, além da venda por catálogo e internet – um importante veículo de negócio.
NA CABEÇA DOS 'INIMIGOS PÚBLICOS'
Com Johnny Depp e Christian Bale, ‘Public Enemies’ (‘Inimigos Públicos’) tem 80 chapéus com cunho português: o feltro da Fepsa. A concepção dos modelos, em feltro 50X Black Rubby num vermelho muito escuro, quase preto, aplicado em chapéus Fedora, coube à Optimo Hats, de Chicago, que solicitou o apoio da firma lusa, sua cliente.
OS BOTÕES MAIS QUE FAMOSOS
A Louropel foi, em 1966, fundada por Carlos Rego, que 'adquiriu na Europa uma tecnologia de produção a partir de resina de poliéster, inovadora na época, que implementou em Portugal no início da Louropel'. E que rapidamente começou a exportar para o Mundo inteiro – internacionalização que começou com França. Além dos botões, produzem e comercializam fivelas.
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