Província do Cuando Cubango continua a ser uma das zonas mais contaminadas do país.
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Passados 23 anos do fim da guerra civil, Angola ainda não se libertou das minas terrestres. No Cuando Cubango, o medo continua a travar o desenvolvimento agrícola, as estradas e até o turismo, reconhecido como promissor, mas que, na prática, não existe.
A província do Cuando Cubango, recentemente dividida em duas novas circunscrições administrativas, o Cuando e o Cubango, continua a ser uma das zonas mais contaminadas do país.
Apesar dos avanços, a herança da guerra prolongada que opôs as forças governamentais do MPLA ao movimento guerrilheiro da UNITA permanece cravada no solo depois dos 27 anos de conflito, que espalharam as minas antipessoal e antitanque pelo território.
É nesta área que se encontra atualmente o coração da ação da Halo Trust, organização humanitária de desminagem que chegou a Angola em 1994.
A sua presença no país ficou ligada à icónica imagem da princesa Diana, que foi fotografada em 1997 a caminhar num campo minado no Huambo, fotografia recriada em 2019 pelo seu filho, príncipe Harry, no mesmo percurso histórico.
Em Mavinga, capital da província do Cuando e hoje o maior centro de operações da Halo Trust em Angola, trabalham cerca de 420 pessoas, num total de 1.200 trabalhadores mobilizados pela organização.
Jack Holmes, comandante da unidade de Mavinga da Halo Trust, recordou à Lusa que a organização começou a operar na região "desde os anos 2000" e regressou em força em 2021.
"Mavinga é muito distante, os caminhos e as estradas para aqui são um pouco difíceis de navegar", sublinhou o representante da Halo Trust, numa alusão à falta de acessos para chegar à cidade onde se chega apenas através de um trilho arenoso numa jornada que pode demorar mais de um dia a partir da capital do Cubango, Menongue.
Só em 2021, com apoio do executivo angolano, o principal financiador das atividades de desminagem, foi possível retomar o trabalho, explicou Holmes.
Os dispositivos continuam a representar uma ameaça constante devido ao risco invisível enterrado no solo numa região que, décadas depois do conflito, permanece isolada e despovoada.
Os trilhos que levam a Mavinga atravessam as planícies típicas do leste angolano, a que dão o nome de "chanas", e estão ladeados por marcas vermelhas e brancas, sinalização que alerta para áreas perigosas. Desde 2020, registaram-se no Cuando e no Cubango mais de 50 incidentes com minas provocando pelo menos 37 mortos.
Segundo a Agência Nacional de Ação Contra as Minas (ANAM), em julho de 2023 apenas 42% das áreas contaminadas no Cuando Cubango tinham sido desminadas, tornando a província do leste como a mais afetada do país. Atualmente, existem 975 áreas minadas identificadas, sobretudo no Bié, Cuando Cubango, Cuanza Sul e Moxico.
"Ainda estamos a encontrar campos minados aqui em Mavinga, também em Rivungo, em Luengue", confirmou Holmes, garantindo que a Halo vai continuar a trabalhar para limpar as minas.
"Temos muitos campos minados, vamos ficar aqui durante o tempo necessário para poder retirar todas as minas, para devolver os terrenos livres e seguros para toda a pessoa que vive aqui, ainda mais importante como nova capital da província do Cuando", acrescentou o responsável.
Jack Holmes explicou que "existem mais de 70 tipos de minas diferentes", entre engenhos antipessoal e antitanque, com potencial destrutivo não só para as comunidades locais, mas também para a fauna abundante da região.
"Efetivamente, nós temos uma mistura muito grande, [mas] ainda falta trabalho de pesquisa para encontrar novas áreas que sabemos que são suspeitas para confirmar exatamente onde está a ameaça e que tipo existe lá", acrescentou, realçando a incerteza que acompanha o trabalho diário das equipas de desminagem.
Desde 1975, mais de 80 mil angolanos terão ficado mutilados por minas, mas o número real de engenhos ainda ativos continua incerto num dos países mais contaminados do mundo, com 73 milhões de metros quadrados contaminados e cerca de 1.000 campos minados conhecidos ou suspeitos.
A Halo Trust assumiu como prioridade a limpeza de parques nacionais como Mavinga, Luiana e Licua, considerados também estratégicos para o futuro do ecoturismo.
"Desde o início da limpeza aqui, já limpámos e destruímos mais de 120.000 minas durante todo o tempo. Já mais de 1.000 campos minados foram completamente limpos. Destruímos 600.000 engenhos explosivos", assinalou Jack Holmes, sublinhando que, "devido ao tamanho do país, ainda fica muito trabalho para fazer".
Além da questão humanitária, está em causa o futuro económico e ambiental do Cuando e do Cubango.
Para o representante da organização, a desminagem é também um motor de desenvolvimento. Sem concluir este processo, os camponeses não regressam aos campos agrícolas, os animais selvagens não voltam, o turismo não se desenvolve.
"É por isso que queremos ficar aqui, para salvar as vidas e para proteger os modos de vida", garantiu.
Na região, onde vivem espécies emblemáticas como elefantes e palancas negras gigantes, a limpeza dos parques é vista como essencial para transformar a área num polo de ecoturismo.
"Estamos a trabalhar no Parque Nacional de Mavinga e também no Parque Nacional de Luengue-Luiana e no Licua, onde se podem encontrar elefantes e palancas negras, todos estes tipos de animais, para facilitar o regresso destes animais", adiantou.
Angola comprometeu-se, no quadro da Convenção de Otava sobre a Proibição de Minas Antipessoal, a eliminar todos os engenhos até 2025.
O prazo inicial era 2018, mas este ano Angola solicitou, pela terceira vez, uma extensão de cinco anos do prazo.
Com campos minados ainda a ser alvo de limpeza, outros por descobrir e dificuldades logísticas associadas aos acessos, a meta continua distante.
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