Ex-primeiro-ministro publica comunicado a justificar decisão nas redes sociais.
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José Sócrates decidiu abandonar o Partido Socialista e pediu a desfiliação do partido, na sequência das críticas de que foi alvo nos últimos dias. O próprio explica numa mensagem publicada na rede social Facebook o que o levou a sair do partido que liderou, e com o qual foi primeiro-ministro.
O antigo líder do PS considera que está a ser alvo de uma "condenação sem julgamento" e por isso decidiu "pôr fim a este embaraço mútuo". Na mensagem, Sócrates começa por falar de Manuel Pinho, dizendo que tem como sendo "uma pessoa honesta" e refutando que este tenha entrado no seu governo por indicação de Ricardo Salgado.
Depois, Sócrates mostra o seu desagrado pelo facto de o PS nunca ter denunciado o MP pelo que chama de "abusos" relacionados com a investigação de que é alvo.
A reação de Sócrates surge depois de dirigentes do PS, como Carlos César e João Galamba, terem referido nos últimos dias que o partido estava envergonhado com os casos de corrupção que envolvem Sócrates e Pinho, que estão a ser investigados pela justiça.
Esta quinta-feira foi a vez do primeiro-ministro, António Costa, referir que a "confirmarem-se" as suspeitas de corrupção nas políticas de energia por membros do Governo de José Sócrates, será "uma desonra para a democracia".
O primeiro-ministro assumiu esta posição na conferência de imprensa conjunta com o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, após ter sido confrontado com os casos judiciais que envolvem o antigo ministro Manuel Pinho e o antigo chefe de Governo socialista José Sócrates.
Numa carta enviada ao PS e que é publicada na edição de imprensa de sexta-feira, Sócrates refere que está a ser alvo de "uma espécie de condenação sem julgamento". E por isso considerou que "é chegado o momento de pôr fim a este embaraço mútuo".
A delaração de José Sócrates na íntegra:
"A CLARIFICAÇÃO DEVIDA
Começo pelo princípio: sou amigo de Manuel Pinho, pessoa que considero e estimo.
Segundo: tenho ouvido o que se diz sobre a sua relação com o Banco Espírito Santo durante o período em que foi ministro do meu governo e sobre isso tenho a dizer que a minha primeira exigência é que o Ministério Publico prove o que diz. Não, não pactuo com a operação em curso de inverter o ónus da prova como, de forma geral, os jornalistas e os ativistas disfarçados de comentadores têm feito: o primeiro dever de um Estado decente é provar as gravíssimas alegações que faz seja contra quem for, ainda que estas tenham sido, como habitualmente, feitas através da comunicação social.
Um terceiro ponto tem a ver com a afirmação de que há nesta questão uma dimensão política e uma dimensão jurídica. Aceitemos, por razão de simplicidade de raciocínio, a separação deste duplo juízo, o político e o judicial, que terão padrões e critérios diferentes. Todavia, embora separados por categorias diferentes, parece-me evidente que ambos se encontram num ponto: é preciso que as alegações feitas sejam verdadeiras. Não me parece então possível aceitar que os diversos personagens da vida pública passem por cima deste ponto, fazendo o que há de mais repugnante na vida social: acusar e julgar sem provas, sem ouvir os acusados e sem fazer o menor esforço para saber se é verdade o que é dito. E, mais, só para recordar o que devia ser óbvio: não é o próprio que tem de se defender ou de provar que é honesto ou inocente; é quem acusa que tem o dever de provar o que diz. Estranhos tempos estes em que lembrar o princípio estrutural do direito moderno, a presunção de inocência, se confunde com a defesa seja de quem for.
Em quarto lugar, desejo afirmar que tenho Manuel Pinho por um homem honesto e incapaz de uma coisa dessas, tal como é descrita – receber um vencimento privado enquanto exercia funções públicas. Por essa razão recuso-me sequer a discutir hipóteses que para mim são inadmissíveis, sem que o Estado, que o afirma, prove o que está a dizer.
Compreendo e partilho o desejo dos seus amigos e colegas de governo de que Manuel Pinho negue imediatamente as alegações. Não me parece que ele ignore as responsabilidades que também tem connosco. Todavia, não sobreponho o meu desejo de esclarecimento imediato ao seu direito de se defender de tão graves imputações quando achar que o deve fazer. Por mais que isto custe a quem é seu amigo e foi seu colega, é o que a decência impõe.
O último ponto é acerca da ignóbil intrujice que acompanha a notícia: a ideia de que o nome de Manuel Pinho para fazer parte do Governo me terá sido sugerido pelo Dr. Ricardo Salgado. Esta mentira tem sido há muito tempo disseminada pelo Ministério Público e convenientemente divulgada por jornalistas, que nenhum esforço fazem para verificar a sua veracidade.
Desde logo, posso afirmar que a primeira vez que me encontrei com o Dr. Ricardo Salgado desde que fui eleito líder do PS foi no dia 13 outubro de 2006, conforme registado na secretaria da Residência Oficial do Primeiro Ministro. Esse encontro, que ocorreu mais de dois anos depois de ser eleito no PS, deu-se a seu pedido e realizou-se no meu gabinete. Antes desse encontro tenho uma vaga memória de o ter recebido quando era Ministro do Ambiente, no já distante ano de 2001. Desde essa altura até ao dia que mencionei nunca me encontrei com ele, não conversei com ele, nem tenho sequer memória de me ter cruzado com ele. Nunca fiz parte do seu grupo de amigos ou dos seus círculos sociais.
Depois, há mais: a escolha que fiz de Manuel Pinho como porta-voz do PS para a área da economia, e mais tarde para o Governo, aconteceu naturalmente na decorrência da colaboração que este há muito prestava, na condição de independente, ao PS, como conselheiro económico do então líder Ferro Rodrigues. Foi aí, nessa condição de membro do chamado grupo económico da Lapa (por reunir regularmente no Hotel da Lapa) que o conheci e que desenvolvemos um trabalho comum que viria a culminar no convite que lhe fiz. Muitas pessoas dentro e fora do PS conhecem esta história, que desmente por completo a ficção da indicação por outros, com quem não tinha nenhum contacto.
Lamento, mas mais uma vez não acertaram: não foi Ricardo Salgado que me recomendou nenhum nome. Escolhi Manuel Pinho, pelas suas qualidades e competências, que, aliás, demonstrou enquanto foi ministro da economia, onde fez um excelente lugar. Referência, esta, que, embora não seja isso que agora está em causa, tenho gosto em fazer.
P.S.
Já depois de escrever este artigo, ouvi Carlos César. Durante quatro anos defendi-me das acusações falsas e absurdas que me foram feitas: a falsidade da propriedade do dinheiro da Suíça, a falsidade sobre a propriedade do apartamento em Paris, a falsidade sobre a PT, a falsidade sobre a Parque Escolar, a falsidade sobre o TGV, a falsidade sobre a relação de proximidade a Ricardo Salgado. Durante quatro anos suportei todos os abusos: a encenação televisiva da detenção para interrogatório; a prisão para investigar; os prazos de inquérito violados sucessivamente como se estes não representassem um direito subjetivo que não está à disposição do Estado; a campanha de difamação urdida pelas próprias autoridades com sistemáticas violações do segredo de justiça; o juiz expondo na televisão a sua parcialidade com alusões velhacas; a divulgação na televisão de interrogatórios judiciais com a cumplicidade dos responsáveis do inquérito.
Durante estes quatro anos não ouvi por parte da direção do PS uma palavra de condenação destes abusos. Mas sou agora forçado a ouvir o que não posso deixar de interpretar como uma condenação sem julgamento.
Desde sempre, encontrei nos militantes do PS um apoio e um companheirismo que não esquecerei. Mas a injustiça que agora a direção do PS comete comigo, juntando-se à direita política na tentativa de criminalizar uma governação, ultrapassa os limites do que é aceitável no convívio pessoal e político. Considero, por isso, ter chegado o momento de pôr fim a este embaraço mútuo. Enderecei hoje uma carta ao Partido Socialista pedindo a minha desfiliação do Partido. Pronto, a decisão está tomada. Bem vistas as coisas, este post scriptum é congruente com o que acima escrevi.
José Sócrates,
Lisboa, 3 de maio de 2018"
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