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Entrevista. Pedro Mafama: “Sem a Ana [Moura] não havia em mim esta alegria”

Aos 32 anos, o músico que pôs o País a cantar ‘Olarilolé’, aborda o sucesso, lembra o bairro da Graça onde cresceu, recorda os tempos em que trabalhou como guia turístico e vendeu merchandising para os Buraka Som Sistema, fala dos assuntos do coração e da filha Emília e garante que o céu é o limite...

11 de maio de 2024 às 13:46

Nascido em Lisboa, a 17 de setembro de 1992 (31 anos), Pedro Simões, conhecido em todo o País pelo nome artístico de Pedro Mafama, começou por estudar Multimédia e depois Artes Plásticas na Escola Superior de Artes e Design, nas Caldas da Rainha. Iniciou-se na música aos 16 anos, então sob o nome de Pedro Simmons. Lançou o disco de estreia ‘Por Este Rio Abaixo’, em 2021 e dois anos depois editou ‘Estava No Abismo Mas Dei Um Passo Em Frente’. Em 2022 foi pai de uma menina, fruto da relação de dois anos com a fadista Ana Moura.

Tem um novo single, ‘Sem Ti’. Depois da canção ‘Preço Certo’ e de ter posto Portugal a cantar ‘Olarilolé’, não deve ser fácil fazer músicas novas! Sentiu essa pressão?

Não, porque não estou a tentar repetir nada. Acho que o sucesso do disco ‘Eu Estava no Abismo e Dei um Passo em Frente’ [que tinha a música ‘Preço Certo’] foi feito precisamente por eu não querer repetir o que já tinha feito no disco de estreia ‘Por este Rio Abaixo’. Este ‘Sem Ti’, não é sequer uma tentativa de fazer o próximo hit de verão. É só mais um capítulo da minha arte.

Mas no caso destes sucessos tão grandes, não há o perigo de a obra se virar contra o seu criador, no sentido de criar alguma ansiedade sobre o que virá depois?

Não. O que eu quis fazer com o ‘Preço Certo’ foi uma coisa que chegasse a toda a gente. Queria entrar na casa de todos os portugueses e dizer: "Eu estou aqui. Olhem para a nossa cultura". Mas também sei que se ficar na casa das pessoas durante muito tempo, vão cansar-se de mim. O que quero é fazer experiências novas.

Mas o sucesso do ‘Preço Certo’ surpreendeu-o?

É engraçado porque ao mesmo tempo que havia um lado performativo muito grande em ‘Preço Certo’, com uma manobra de marketing que me deu a conhecer de uma forma muito genuína, por outro lado também estava muito desprotegido. Para o videoclipe, por exemplo, foi tudo gravado de imediato. Por isso é que eu digo que entrei na casa dos portugueses da forma mais genuína possível, porque ali nem sequer houve pós-produção. Isso, sim surpreendeu-me, a forma como as pessoas conseguiram ver que eu estava ali com boas intenções, que só queria chegar a toda a gente e dar a mão a todo o País.

Que perceção tem sobre o perfil de pessoas que agarrou essa música?

Acho que essa música é um caso de transversalidade, embora acredite que não o seja para sempre. O mais especial desta música foi ter tocado para pessoas dos dois aos 92 anos. Por isso acho que é uma música única. Isto faz-me lembrar um pouco o sucesso dos Buraka Som Sistema, para quem eu trabalhei a vender merchandising. Lembro-me de ver isto nos concertos deles: netos, filhos, pais e avós.

Faz ideia de quantos concertos deu no ano passado?

Julgo que foram uns 62.

E deve ter passado por todas as festas e romarias!

Sim. E até os sítios por onde andámos refletem aquilo que dizia, sobre a diversidade do público.

Ficaram histórias por contar?

Sim, algumas (risos). Lembro-me de um concerto no interior, mas não me recordo do nome da terra, em que houve uma invasão de palco, porque os bombeiros que estavam a fazer a segurança tiveram que abandonar o recinto para responder a um incêndio. As pessoas perceberam que estavam por conta delas e invadiram o palco. Acho que, naquele momento, senti-me como o Ronaldo se deve sentir. 

Voltando a este novo ‘Sem Ti’, nele há um verso em que canta: "Já não esperava/encontrar alguém como tu/Mas encontrei". É fácil perceber que este verso tem uma destinatária: Ana Moura. Até que ponto a Ana mudou o Pedro e vice-versa?

Acho que os dois nos mudámos um ao outro, de formas muito diversas. Sem esta pessoa, e sem tudo o que me aconteceu nestes últimos anos, não havia esta alegria em mim do ‘Preço Certo’. A minha vida agora é uma celebração e antes não era. As pessoas que se recordam do meu primeiro disco sabem que eu era muito diferente. A Ana trouxe-me e traz-me muitas coisas boas todos os dias, como acontece com qualquer pessoa que amamos. Ela ensina-me muito e espero que eu o consiga fazer também.   

O Pedro chegou a dizer, quando lançou o disco de estreia ‘Por este Rio Abaixo’, que ele tinha sido feito numa fase não muito boa da sua vida.

Que fase foi essa?

Foi uma fase muito melancólica e de maus hábitos no coração. Gostava sempre de quem me fazia mal. Talvez o meu lado fadista dos bairros típicos da Graça me tenha levado muito por esse caminho. Também falo muito disso nas minhas canções, porque nós estamos sempre em luta com os nossos demónios. Eu sei que um sorriso nunca é um sorriso completo.

A sua filha já tem dois anos. Como é a relação dela com a música do pai?

É engraçado porque quando terminei esta nova canção, ‘Sem Ti’, pu-la a tocar  no carro e a Emília começou logo a bater palmas e a dançar. Quando terminou disse-me: "Outra!" (risos). 

Falava do bairro da Graça (Lisboa). Até que ponto foi determinante para aquilo que é hoje?

Foi muito importante assim como todos os outros ambientes que me compõem. Sou da Graça, mas também venho de uma família de artistas.

A sua família estava ligada à música?

Não... mais às artes plásticas.

E onde acha que foi buscar esta veia para a música?

Acho que não há ninguém na minha família que seja minimamente musical. Claro que havia muita música em casa mas, acima de tudo, o que sinto é que havia uma veia artística muito grande. Quando o Fernando Mendes me perguntou, no ‘Preço Certo’, o que é que eu fazia e respondi-lhe que era "artista", ele insistiu: "É artista de quê?". E eu disse-lhe: "Sou artista musical". E é isso que acho que sou, um artista, só depois vem a música.

Mas apesar do sucesso, há muita  gente que o acusa de não saber cantar. Como é que lida com isso?

Sei que há muitos comentários a dizer que não canto nada e que não tenho talento para estar na música. Tenho consciência disso. Por isso digo que não sou um cantor, sou um artista. Se agora perdesse a minha voz sei que continuava a conseguir expressar-me. Arranjava outra forma, porque a música possibilita-me expressar de várias maneiras. Sempre que vejo comentários contra mim, não me toca nada. Confio na minha visão artística. 

Mas consegue precisar quando despertou para as artes?

Acho que o meu primeiro gesto artístico foi quando, na escola, me pediram para desenhar a minha mãe. E eu desenhei-a nua. Não era, obviamente, um retrato renascentista, mas era um boneco. Foi o meu primeiro gesto artístico, porque foi feito sem filtro. 

Até que ponto o Pedro Mafama, até pela forma como se apresenta em palco e em público, é um boneco construído por si?

Claro que existe um lado de construção. Estou sempre a desenhar-me e à procura de explorar alguma coisa que gostava de ver questionada no mundo. Mas não tenho propriamente uma capa para ir para o palco e no meu dia a dia visto-me muito como apareço em palco. Sou uma pessoa fascinada com o universo da música de baile e quando comecei a pensar nisto a forma de me expressar era usar as calças largas e rasgadas, uma t-shirt sempre com uma das marcas que a região mediterrânea adora, que são, por exemplo, a Calvin Klein, a Armani, a Diesel ou a Pepe Jeans, que é quase uma coisa identitária. Mas já estou a operar uma evolução com uma roupa mais vanguardista.

Diz que chegou a vender merchandising para os Buraka. Como foi esse período?

Foi de aprendizagem. Eles eram os meus ídolos. De repente estava no ‘backstage’ e na mesa de almoço com as pessoas que mais admirava. As minhas pernas tremiam quando estava com eles. Tínhamos conversas interessantíssimas e aprendi muito. Tal como eu, eles pensavam muito nesta questão de criar uma relação entre a cultura local e global. 

Mas também trabalhou num hostel e como guia turístico!

Sim, isso foi logo a seguir à faculdade. É engraçado porque como guia turístico já me desviava muito daquilo que era a tour habitual. Uma das coisas que eu fazia era levar os turistas a ver a Lisboa multicultural, começando por sítios que denunciavam desde a presença árabe até à presença africana. Falava-lhes de fado também. E, lá está, desviar-me da rota e do caminho sempre é uma coisa que vai fazer parte de mim. 

O que se segue?

Novas metas. Estou aqui numa corrida a novos patamares. Tenho objetivos ambiciosos que não interessa estar a revelar agora, mas posso dizer que estarei sempre a sonhar com o Céu.

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