Apanhada pela senilidade da velhice, Amélia tem sorte. A filha, Adelaide, apoiada pelo marido, evita despachá-la para um lar de velhos, por decência, respeito filial e até para poupar uns cobres. Amélia, criada num monte do interior alentejano, resiste confinada ao quartito do andar com vista para um bairro-de-lata dos subúrbios de Lisboa. Por estes dias, Adelaide reparou que dormir na rua tem sido a decisão de muitos portugueses e imigrantes que vivem nos renascidos bairros de lata. É o calor! Mais de 40 graus de dia, quase 30 durante a noite. Ar condicionado é miragem, a ventoinha pouco ajuda os que ainda têm electricidade à mão. As chapas de zinco das barracas criam um forno. Com o calor, os mais desabonados sofrem mais do que os outros. Amélia, afogueada, não diz coisa com coisa. Até que grita. "Água! Dá-me água!" E a água que chega, morna, desenxabida. "Sabe mal!" Depois, adormece. Adelaide acorda de madrugada com os berros da mãe. "Bilha! Traz-me a bilha!" Adelaide leva tempo a entender. A mãe delira, volta à infância lá no monte. As casas de branco, a cal que ajuda ao isolamento térmico. O poial dos cântaros e das bilhas, com a "terceira" (15 litros), a "quarta" (10 litros) e a bilha (1 a 2 litros). Na bilha de barro, a água do poço sempre fresquinha. O barro é poroso, a água evapora lá dentro e a temperatura pode descer uns 5 graus. Gravados na bilha, a cruz e o "sino saimão", cinco talismãs em forma de estrela, protecção contra invejas, quebrantos e mau-olhado. E a sesta! Lembra-se Adelaide da mãe, risonha, a recitar o ditado da meninice. "A sesta do alentejano é entre as duas e as três, tu que dormes o ano inteiro só o alentejano é que vês!?" Corre a buscar água fresca ao frigorífico. Leva à boca de Amélia. "Mãe! É água da bilha!" Amélia bebe uns golinhos, sorri e adormece, refrescada e feliz.
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